Paulo Cardim
Reitor da Belas Artes e Diretor-Presidente da Febasp
Membro do Conselho da Presidência da ABMES
Blog da Reitoria, publicado em 25 de novembro de 2013
***O Ministro da Educação, Aloizio Mercadante, em pronunciamento na última semana, informou que vai suspender o processo seletivo ou vestibulares de mais de duzentos cursos de graduação. A causa dessa medida extrema, segundo o ministro, é a obtenção, por esses cursos, de índice insuficiente no Conceito Preliminar de Curso (CPC), a ser divulgado no próximo dia 28. Esse procedimento do MEC deve congelar, por tempo indeterminado, mais de 40 mil vagas.
O Conceito Preliminar de Curso – o CPC – é um indicador obtido a partir dos resultados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), incluindo o questionário que busca identificar o perfil do participante, e mais os insumos pinçados burocraticamente no Censo da Educação Superior. O CPC foi criado, nunca é demais repetir, à margem da Lei nº 10.861, de 2004, que institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, o Sinaes. Não é, portanto, conceito de avaliação de qualidade submisso ao art. 209 da Constituição. Trata-se, somente, de um ato administrativo, sem atributo de lei.
O CPC tem uma escala de cinco “notas”: 1 e 2 são considerados insuficientes para o atendimento mínimo de qualidade, nos padrões fixados pela Portaria Normativa nº 40/2007, republicada em dezembro de 2010; os padrões de qualidade estabelecidos pela referida portaria são atendidos com as notas 3, 4 ou 5.
A suspensão de vestibulares com base, exclusivamente, no CPC é uma medida arbitrária do ministro da Educação. Como já demonstrei em sucessivos artigos e como comprovam manifestações de especialistas em avaliação de qualidade educacional, o Enade e, por consequência, o CPC não avaliam nada. Cursos com “notas” 1 e 2 não são piores ou melhores do que os com “notas” 3 ou mais. O tratamento estatístico dado a esses resultados desfiguram totalmente o real desempenho do estudante no Enade.
Por outro lado, como determina a Lei nº 10.861, de 2004, o Enade não avalia cursos de graduação. O instrumento legal para esse processo é a avaliação in loco desses cursos, que resulta na atribuição do Conceito de Curso (CC), nos termos definidos no Sinaes. O Enade “é um dos” componentes de avaliação da qualidade de cursos e instituições de educação superior. Não o único, como pensa o ministro da Educação. Além disso, é um exame com o qual o estudante que o realiza não tem o menor compromisso e em nada pode ser prejudicado caso não queira fazê-lo. Basta assinar uma folha de papel e entregá-la em branco. Essa folha em branco avalia, segundo o senhor Ministro, a qualidade de ensino da Instituição onde esse estudante realiza seu curso.
Estou de acordo com o ministro Mercadante quando ele afirma que "é preciso ter rigor na oferta de um ensino superior de qualidade”. Porém, o rigor na oferta de um ensino superior de qualidade, deve fundamentar-se no cumprimento da Lei instituída. Ao desrespeitar e descumprir a Lei 10.861 de 2004, que instituiu o Sinaes – Sistema de Avaliação da Educação Superior, o próprio MEC deixa o rigor de lado, desestabilizando todas as referências de rigorosidade a serem obedecidas pelas IES, referência essas que migram automaticamente para o plano do desconhecido ou do inimaginável. A iniciativa do MEC, nesse caso, resume-se em uma medida arbitrária com o objetivo simples de punir injustificadamente e injustamente e não de buscar a melhoria contínua da qualidade do ensino superior ministrado no Brasil.
A suspensão arbitrária de vestibulares, sem amparo legal, acarreta uma insegurança de consequências imprevisíveis, tantos para as IES quanto para os alunos. Dificilmente os cursos atingidos com essas medidas subsistirão no sistema.
A medida administrativa submissa à Constituição e à Lei é a avaliação in loco, como consequência do CPC insatisfatório (1 ou 2). Após a obtenção de conceito resultante dessa avaliação presencial, o Conceito de Curso (CC), é que poderiam ser aplicadas penalidades com essa gravidade. Assim, estaria atendido o “rigor na oferta de um ensino superior de qualidade". O CPC é um indicador que não confere legalidade e nem “rigor” ao processo avaliativo da educação superior.
Medidas como essas, sem qualquer amparo em Lei, que suspendem o acesso de estudantes a mais de 40 mil vagas nos cursos superiores, não vão de encontro, ou melhor, vão contra as metas estabelecidas pelo próprio Ministério da Educação, no sentido de matricular, nesta década, 33% de estudantes nos cursos superiores, na faixa etária de 18 a 24 anos de idade, conforme determina o Plano Nacional de Educação. Hoje, esse percentual está em torno de 14%.
Essas ações do MEC são conflitantes e não contribuem para a melhoria da qualidade da educação superior. Apenas servem para levar insegurança jurídica a todo o sistema.




