O inconveniente das pessoas e dos países é a esperança de encontrar saídas e soluções fáceis. Sem crise não há desafios, sem desafios a vida é uma rotina, uma lenta agonia. Sem crise não há mérito. É na crise que se aflora o melhor de cada um. Falar de crise é promovê-la, e calar-se sobre ela é exaltar o conformismo. Em vez disso, trabalhemos duro. Acabemos de uma vez com a única crise ameaçadora, que é a tragédia de não querer lutar para superá-la. (Albert Einstein)A necessidade de criar nem sempre coincide com as possibilidades de criação e disso surge o penoso sentimento de que a ideia não foi para a ação. A criatividade assenta numa “fusão da intuição e da razão”, considerada uma capacidade humana de grande valor universal. A criatividade torna-se a habilidade mais importante do século 21, uma vez que está ligada à capacidade de impulsionar um país para inovar e gerar progresso. Mas é também uma forma de motivar as pessoas a “tomar” o seu lugar na sociedade, acreditando no seu potencial, aplicando os seus conhecimentos e construindo valor para a sua existência. A capacidade criativa sempre foi a chave da evolução da humanidade. Jucélia Alves Boneta, merendeira do Centro de Educação Infantil Municipal Restinga, em Mafra (SC), enfrentava um sério problema: a garotada estava enfastiada com um purê de abóbora da merenda escolar. Com 13 anos de trabalho, Jucélia não se conformava com a “inapetência” dos alunos e criou o nhoque de abóbora: o sucesso foi tal que a meninada hoje só quer o prato inventado pela “tia Ju”. Disputando com outras duas mil candidatas no concurso Melhores Receitas da Alimentação Escolar, promovido pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Jucélia ficou entre as 15 finalistas da competição nacional. Ao criar uma alternativa alimentar, a merendeira venceu o desafio. Se crise é a palavra do dia, enfrentamento é a palavra de ordem, principalmente na busca de soluções inovadoras na administração pública, das quais são exemplos inúmeros os casos mundo afora. Veja-se o caso da subprefeitura do distrito de Croydon (173 mil habitantes), em Londres, que acabou com sua frota de carros oficiais dando lugar a um contrato com locadora que disponibiliza os carros com aluguel por hora. Ou então o exemplo do estado americano de Utah, que, vendo sua arrecadação cair, adotou uma jornada alternativa de trabalho. Assim, as repartições passaram a atender de segunda a quinta-feira, das 7 às 18 horas (com uma hora de almoço), sem redução salarial, motivando que outras centenas de cidades também adotassem tal expediente. Outros áreas americanas também tomaram iniciativas criativas e inovadoras, como Washington que, depois de legalizar, taxou o consumo da maconha recreativa, e na Califórnia, onde se empregam presidiários para pintar estradas. É a criatividade para solucionar questões da administração pública. Nos Estados Unidos também se aproveitou da crise para uma solução que parece óbvia, mas que no Brasil é “imexível”: vários estados americanos passaram a cobrar mensalidades em universidades públicas (dos alunos ricos e só deles). Em nosso país, no entanto, municípios, estados e governo federal, ao contrário de restringir, ampliam gastos, inclusive ao arrepio da lei de responsabilidade fiscal. Tudo como se estivéssemos nadando em dinheiro (do contribuinte) sem preocupação alguma em encontrar soluções criativas para diminuir despesas. Empresas demitindo, investimentos sendo abortados, PIB negativo, índice de desemprego subindo, aumento de impostos, alta da inflação e aumento do dólar, queda de confiança dos investidores, situações que exigem uma resposta rápida e criativa, mas governos e agentes públicos mexem-se mastodonticamente, como paquidermes velhos e doentes, sem preocupação alguma com seus gastos, como se a crise não existisse: não se veem medidas inovadoras e criativas para reduzir gastos e despesas públicas. Pedro Burgos, na revista Superinteressante de 22/01/16 (As crises são o motor da criatividade. Mas não no Brasil), tem uma visão que é uma alfinetada: “Se crises servem de alimento para soluções criativas, o Brasil tem um banquete à sua disposição. Entre 2008 e 2014, os estados brasileiros fizeram R$ 180 bilhões em novas dívidas. Com a recessão, que se encaminha para uma depressão, governos estaduais e municipais passaram a arrecadar menos em coisas como IPVA, IPTU e ICMS, que dependem bastante do consumo, em queda. Em algumas partes do país não há dinheiro nem para despesas básicas. A gravidade ficou clara no final de 2015, seja no caos da saúde no Rio de Janeiro, ou nos Estados e prefeituras que tiveram de parcelar o décimo terceiro dos funcionários”. A crise[1] não bate na porta apenas do setor privado e das famílias. As organizações públicas também sentem seu reflexo imediato. Por consequência natural, aqueles que vivem dos impostos recolhem menos e o orçamento se reduz. Ao contrário de uma empresa, que pode demitir funcionários, reduzir despesas e tomar medidas mais drásticas, as organizações públicas podem mexer em poucas variáveis. Se um município que arrecadou menos decide gastar menos, não poderá exonerar seus funcionários efetivos; não poderá reduzir professores e médicos; não poderá reduzir a merenda; não poderá parar suas obras; não poderá reduzir sua coleta de lixo; enfim, uma série de serviços públicos deve ser mantida e não pode, de forma alguma, ser alterada. A única solução é a criatividade, com soluções com as que famílias e empresas lançam mão diariamente para vencer a crise. Um estado provedor de educação pública, de saúde pública, de cultura pública, de seguridade social, de incentivos à ciência e à tecnologia, de investimentos em infraestrutura, de proteção do meio ambiente... tem exigido cada vez mais – e deverá inexoravelmente utilizar – uma nova forma de administração pública, que:
- seja orientada para o cidadão e para a obtenção de resultados;
- pressuponha que os políticos e os funcionários públicos são merecedores de grau limitado de confiança;
- como estratégia, sirva-se da descentralização e do incentivo à criatividade e à inovação.
- canais de comunicação eficientes em todos os níveis da organização;
- tarefas desafiantes ao potencial criador;
- normas mais flexíveis;
- descentralização do poder;
- valorização da iniciativa e da participação na tomada de decisão;
- política de benefícios e sistema de recompensa voltada às ideias inovadoras;
- estímulo da chefia para novas ideias; respeito às opiniões divergentes;
- capacitação dos agentes públicos para o desenvolvimento de seu potencial criador, dentre outras.