O dogma diz: “Acredite nos dados que se ajustam ao seu modelo de mundo e ignore tudo o resto”. O mundo diz: “Ignore o dogma e amplie seu modelo para acomodar o mundo” (Amit Goswami)Na medida em que damos mais importância e vamos promovendo o interesse pelo universo da criatividade no meio acadêmico, aumenta a procura do conhecimento sobre o tema. Hoje em dia, o capital criativo é considerado como processo diferenciador que permite às pessoas enfrentarem tanto os desafios de sua vida diária, como encontrar na empresa ideias alternativas para a solução de problemas e até mesmo estratégias desenvolvimentistas para novos empreendimentos da nação. Embora no mundo a preocupação com a inclusão da Criatividade e da Inovação nos sistemas educacionais seja crescente, no Brasil são poucas as pesquisas, as experiências, as publicações e ações desenvolvidas para que a criatividade saia do domínio dos sonhos e entre na efetiva realidade do dia a dia das escolas. Pouca gente se dá conta de que sem criatividade não existe inovação e sem esta não há desenvolvimento e nem progresso. Precisamos falar e escrever mais sobre o quanto, como e desde quando, no Brasil, a ausência dessa preocupação sistematizada vem prejudicando as diversas gerações, que nunca foram sensibilizadas para pensar diferente e ficarem cientes de que na vida as soluções pouco se repetem. No dizer de Einstein, “não podemos nos comportar como os trilhos de uma estrada de ferro, que sempre vão para um mesmo lugar”. Especialmente em nosso país, os sistemas de ensino não se preocupam nem valorizam a formação de estudantes criativos, embora haja uma corrente de educadores que defendam que a criatividade deveria estar amparada no processo educacional de maneira a possibilitar aos estudantes dar asas à imaginação na busca de novos caminhos e soluções. Além disso, é ponto pacífico que as próprias instituições educacionais não estão preparadas para implantar metodologias para o pensamento criativo, porque seu exercício envolve erradicar posturas educacionais superadas, que não aceitam divergências e têm resistência ao risco do novo. Esse novo caminho exige audácia e não se pode ter medo de errar. O ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro no início de sua administração atribuiu à socióloga Helena Singer a missão de ser a ponte entre o MEC e o universo das experiências inovadoras em educação. Seu papel seria buscar iniciativas de referência, mapear o que seria preciso para multiplicar a experiência e fortalecer mutuamente os projetos por meio do contato entre eles. Na época, em uma entrevista concedida a um canal de tecnologia de ensino (Assessora de ministro quer divulgar inovação radical), Helena salientou: “A inovação parcial, incremental, vem ganhando força, mas quero falar de experiências que radicalizem a forma de organizar o tempo, que trabalhem o espaço de modo totalmente diferente – como a de escolas que não estruturam mais o currículo em cima de aulas convencionais de 50 minutos nem usam carteiras enfileiradas de frente para a lousa”, disse a socióloga. “A estrutura fechada de tempo-espaço ainda é o padrão usado pela maioria das escolas, públicas e privadas. As pessoas sabem que isso não funciona, mas não conhecem outras formas de fazer.” Janine Ribeiro teve uma passagem meteórica pelo MEC e não deu para liderar a inclusão da criatividade como uma nova estratégia de apoio educativo. Mas, de acordo com notícia veiculada pela página “inovação e criatividade na educação básica”, iniciativa do Ministério da Educação, existiam 178 instituições educacionais brasileiras, entre organizações não governamentais, escolas públicas e particulares, com exemplos de inovação e criatividade na educação básica. O ministro quis conhecer melhor essas iniciativas e lançou chamada pública para saber em que medida os projetos poderiam contribuir para a melhoria da qualidade da educação brasileira. O Ministério da Educação recebeu retorno de 682 entidades, que, após uma criteriosa avaliação, compuseram uma lista de 138 instituições que já trilham um longo caminho na prática da inovação e 40 organizações que estão caminhando na direção da inovação com vistas a garantir qualidade à educação oferecida. A proposta do MEC era acompanhar o desenvolvimento dos projetos. A partir das propostas, foi traçado o perfil da inovação na educação do país. As organizações estão presentes nas cinco regiões do país e a distribuição corresponde à da população: mais da metade (50,8%) estão na Região Sudeste, seguida da Região Nordeste (21,9%), Sul (13,7%), Centro-Oeste (8,7%) e Norte (7,6%). Do total das instituições selecionadas, 74,3% foram escolas e 25,7% eram organizações educativas que atuam na formação de crianças, adolescentes e jovens, algumas com foco específico em cultura, comunicação, tecnologias digitais ou educação ambiental. Entre elas, 52,5% são públicas e 47,5% são particulares. Um bom material para o MEC trabalhar ao longo dos anos seguintes. Não sem razão, é conhecida a dificuldade de adotar soluções inovadoras em massa num país com 49,8 milhões de matriculados da creche ao ensino médio, dos quais mais de 40 milhões estudam na rede pública (dados do Censo Escolar de 2014). É tarefa das mais hercúleas, que sem viabilidade de custos não saem do papel e vão com o vento numa primeira lufada. Um grande otimismo, do tipo “agora a coisa vai”, tomou conta dos operadores da educação quando Janine Ribeiro baixou a Portaria nº 751, de 21 de julho de 2015, instituindo Grupo de Trabalho responsável pela orientação e pelo acompanhamento da iniciativa para Inovação e Criatividade na Educação Básica do MEC, tendo à frente Helena Singer. Porém, como é comum na administração pública com a mudança de cadeiras, alguns meses mais tarde, Aloizio Mercadante reassume o MEC e, dessa vez, baixa a Portaria nº 1.154, de 23 de dezembro de 2015, que instituiu a Comissão de Orientação e Acompanhamento da Iniciativa para Inovação e Criatividade na Educação Básica do MEC. Tudo igual, mas não semelhante. Hoje, não há dúvidas de que puxaram o breque de mão e o entusiasmo esmoreceu. Agora a bola da vez é a Base Nacional Comum Curricular, quando já se passaram quase dois anos da publicação da lei do Plano Nacional de Educação (PNE). Alguns otimistas acham que dá pra finalizar a questão do currículo até dezembro. Só não disseram dezembro de que ano. De prático e de práticas, que é o combustível da criatividade, até agora nada de firme, de bom e de valioso para nossa meninada. O mais importante de toda esta análise é que, daqui pra frente, as escolas de ensino médio não podem ficar só preocupadas em preparar seus estudantes para passarem no vestibular e as faculdades precisam ir muito além de só traçarem estratégias para seus universitários terem boas notas no Enade. O mundo lá fora não está muito preocupado com estas questões. Ele quer gente que acima de tudo tenha a capacidade de questionar; de fazer conexões, de resolver problemas; profissionais que saibam comunicar e colaborar, que tenham curiosidade e que saibam refletir criticamente. Em que direção iremos seguir? Vamos adotar e incentivar soluções inovadoras, mesmo que isso signifique ampliar nossos modelos para nos adaptarmos ao mundo, ou seguiremos acreditando nos dados que se ajustam aos nossos modelos, ignorando todo o resto?