As melhores soluções para as pessoas ganharem resiliência e impulso nesta era de acelerações, não são receitas que possam ser baixadas pela internet, mas sim carregadas à moda antiga - de ser humano para outro, um de cada vez."Obrigado pelo atraso" livro de Thomas Friedman (1) faz reflexões sobre as mudanças que o mundo está passando nestes dez últimos anos e pouca gente está percebendo. O fio condutor de suas considerações é voltado para a velocidade e a exponencialidade das várias tecnologias que estão ocorrendo neste início de século. Friedman diz que em 2007 surgiram o iPhone, o Kindle, o Airbnb, o Android, o Watson da IBM e o Hadoop, o mais poderoso dos softwares do chamado Big Data. Foi também naquele ano que Facebook, Twitter e o serviço de nuvem da Amazon explodiram. O jornalista é categórico ao argumentar que nada disso foi coincidência, mas a síntese de uma proeza tecnológica que deu à luz uma era inédita de “acelerações”, força fascinante e desestabilizadora que se manifesta pelo tripé tecnologia, globalização e mudança climática. Ele gosta de fazer analogias para explicar a leigos, de maneira mais fácil, a vertiginosa rapidez que está ocorrendo na tecnologia. Contei em meu último artigo que um rei quis contemplar o inventor do jogo de xadrez com uma fortuna incontável. E este como prêmio quis um grão de arroz duplicado a cada quadrado do tabuleiro. O rei aceitou e começou colocando os grãos de acordo com o combinado: 1 no primeiro quadrado, 2 no segundo, 4 no terceiro, 8 no quarto, 16 no quinto e assim por diante. O rei logo percebeu não seria capaz de cumprir a promessa porque no quadro sessenta e quatro teria de colocar mais de 18 quintilhões de grãos ou cerca de 210 bilhões de toneladas e ficou devendo. (Há outra versão que recebi desta lenda que é a do Paal Paysan – o bolinho de arroz hindu que é interessante conhecer (2). A vida diária nos mostra também que estamos num tabuleiro de xadrez global, onde todos têm um movimento para jogar, seja individualmente – como cidadãos – ou coletivamente – como nações, empresas e organizações. Cada um de nós, como um pequeno grão de arroz, vivendo num mundo de mudança exponencial, tem de estar conectado com todas as transformações que acontecem ao seu redor. Para compreender melhor o poder do crescimento exponencial e quão grandes os números podem se tornar, vejam a equivalência com os “fuscas”. Brian Krzaniche, CEO da Intel, diz que se considerarmos o microchip da primeira geração da Intel, lançado em 1971, em relação ao de 2016, veremos que o último oferece uma performance 3.500 vezes melhor; é 90 mil vezes mais eficiente quanto à energia e é cerca de 60 mil vezes mais barato. Comparado a um fusquinha da Volkswagen que fosse aperfeiçoado na mesma medida dos microchips, o “fusca" seria capaz de andar a 480 mil quilômetros por hora. Rodaria mais de três milhões de quilômetros com quatro litros de gasolina e custaria quatro centavos de dólar. Incomparável. Hoje, chegam-nos dez vezes mais informações, dez vezes mais rápido, por um décimo do custo, com dez vezes maior impacto, significando que cada um de nós terá dez vezes mais oportunidades de fazer acontecer no universo, mas também vai enfrentar dez vezes mais perigos, dez vezes mais distrações e desafios pessoais e principalmente de tomada de decisões. Como certo e claro, o futuro não vai ficar parado e esperando. As próximas duas décadas serão diferentes de qualquer outra que vivemos nos últimos cem anos. O mundo não está apenas mudando rapidamente, mas está sendo drasticamente reconfigurado numa velocidade superior à capacidade de reestruturação de nós mesmos e de nossas instituições. O aumento da velocidade das mudanças desafia a capacidade do ser humano de se adaptar. Daí a necessidade de romper com fórmulas surradas e com dogmatismos, pois, à medida que o mundo se torna mais complexo e interdependente, é cada vez mais vital a necessidade de ampliar nosso raio de visão e de sintetizar mais pontos de vista, pois é ilusório encarar esse novo mundo a partir da visão de uma única disciplina. É preciso trazer para a análise o maior número de pessoas, processos, disciplinas, organizações e tecnologias. Nesse universo em constante e rápida mudança, com ciclos cada vez mais curtos de inovação e com cada vez menos tempo para aprendermos a nos adaptar, ficou para trás a época da estabilidade. Friedman diz que precisamos inventar outras maneiras de ser e de estar, como quando andamos de bicicleta e não podemos ficar parados. Em movimento tudo fica mais fácil. Até meados do século passado o ritmo era mais lento, e o que tivéssemos aprendido na escola ou na universidade continuava a ser útil e importante por mais tempo. Se os baby boomers tinham de encontrar um emprego, os millennials têm de inventar o deles. Para isso, o aprendizado contínuo é uma necessidade. É preciso continuar pedalando o tempo todo, ou seja, atualizar-se com maior frequência, saber mais e fazer coisas mais criativas. O problema é que nossas crianças não são treinadas para essa estabilidade dinâmica, tão essencial nos novos tempos. Se na economia agrária o ativo era a terra, na economia industrial, o capital físico; na economia de serviços, os ativos intangíveis – como métodos, projetos, softwares e patentes. E na atual economia do conhecimento, será o capital humano – talento, habilidades, know how, empatia, tolerância e criatividade – o diferencial de sucesso. É preciso, pois, focar num modelo de aprendizado e crescimento baseado em capital humano, o que, certamente, pode vir a produzir uma economia mais dinâmica e uma sociedade mais inclusiva, já que talento e capital humano são distribuídos de forma bem mais igualitária do que oportunidades em capital financeiro. O principal desafio da escola é focar em competências e habilidades, porque, sem dúvida, a tecnologia vai aumentar drasticamente a demanda por habilidades e dotes necessários a novas funções, que exigirão mais em termos de criatividade, colaboração e comunicação do que em conhecimentos convencionais. Otimista inveterado, Friedman arrisca alguns cenários como quando diz que, embora os pessimistas geralmente estejam certos, e os otimistas errados, todas as grandes mudanças da História foram obra de otimistas. Líderes exponenciais não tentam mudar o mundo. Eles tentam mudar a si mesmos considerando que a criatividade, empatia e coragem são as habilidades do futuro. Ser exponencial é atualizar e se atualizar de tudo constantemente, mas isso não é para todos e quaisquer, porque imprimir velocidade é uma exigência que a tecnologia cobra como pedágio. Uma estrutura hierarquizada e rígida não sobreviverá ao dinamismo da digitalização. As mudanças demandam velocidades que os atuais modelos organizacionais não conseguem atender porque a realidade já é exponencial. Transformar-se em empresa ExO (exponencial) é uma necessidade de sobrevivência para as atuais. Um olhar neutro sobre o contexto de negócios mostra nitidamente que as mudanças já estão acontecendo. A rápida e exponencial (r)evolução tecnológica está transformando indústrias e criando concorrências inesperadas. Por outro lado, à medida em que a internet e a tecnologia se disseminam pela sociedade, mudam dramaticamente o contexto estratégico. Alteram a estrutura da competição, a maneira de fazer negócios e eliminam fronteiras entre setores da indústria antes distintos. Desagregam cadeias de valor estabelecidas e criam outras, movidas por novos entrantes que jogam outro jogo. Estas, escalam mais rapidamente e a menor custo que as empresas existentes, criando um cenário competitivo inteiramente desconhecido. Já começamos a ver sinais de mudanças radicais no conceito de emprego e provavelmente a criação de inúmeras novas profissões. Esta reinvenção passa pela mudança na maneira de pensar. Não mais linear, mas de forma exponencial. Consequentemente, ficar parado é matar a empresa. No fundo, as ideias de Friedman são otimistas. Nunca como hoje a humanidade conta com um número expressivo de pessoas com a iniciativa de criar, inventar, competir e colaborar, com estratégias mais baratas e poderosas, para otimizar interações sociais, comerciais e governamentais, para solucionar os problemas de desigualdade existentes no mundo. Proativamente, ao longo do processo, os seres humanos podem se tornar mais resilientes e prósperos e passarem a contar, inclusive, com o apoio das máquinas inteligentes para salvar o planeta. (1) Em Obrigado pelo atraso, Thomas L. Friedman discute os grandes movimentos que estão redefinindo o mundo. Segundo o autor, para entender o século XXI é preciso entender que as três maiores forças do planeta — a tecnologia, a globalização e as alterações climáticas — mudam numa velocidade muito alta e de forma simultânea. Com otimismo, Friedman mostra que podemos superar os múltiplos estresses dessa nova era se diminuirmos a marcha, se ousarmos nos atrasar e usarmos esse tempo para reimaginar a sociedade. (2) Se você já foi a um templo Hindu você provavelmente não poderia deixar de notar a Paal Paysam – pudim de arroz. Diz a lenda que a tradição de servir Paal Paysam aos peregrinos que os visitam começou depois de um jogo de xadrez entre um rei indiano e o próprio Senhor Krishna. Você vê, o rei era um grande entusiasta de xadrez e tinha o hábito de desafiar os visitantes sábios para um jogo de xadrez. Um dia, um sábio viajante foi desafiado pelo rei. Para motivar o seu adversário, o rei ofereceu qualquer recompensa que o sábio pudesse nomear. O sábio, modestamente, perguntou apenas por alguns grãos de arroz da seguinte forma. O rei iria colocar um único grão de arroz no primeiro quadrado do tabuleiro e dobrá-lo em cada um dos próximos quadrados. Tendo perdido o jogo e, sendo um homem de palavra, o rei ordenou um saco de arroz para ser trazido para o tabuleiro de xadrez. Em seguida, ele começou a colocar os grãos de arroz de acordo com a disposição: um grão no primeiro quadrado, dois no segundo, quatro no terceiro, oito sobre o quarto, dezesseis no quinto e, em seguida, 32, 64, 128, 256, 512, 1024 e assim por diante. Após o crescimento exponencial do pagamento em arroz, o rei rapidamente percebeu que ele era incapaz de cumprir sua promessa, pois no vigésimo quadrado ele teria que colocar um milhão de grãos no tabuleiro. E, finalmente, no quadrado sessenta, o rei teria de colocar mais de 18.000.000.000.000.000.000 grãos de arroz, que equivale a cerca de 210 bilhões de toneladas e, é supostamente, suficiente para cobrir todo o território da Índia com uma camada de metros de espessura de arroz. Aos dez grãos de arroz por polegada quadrada, a quantidade acima exige campos de arroz que abranjam duas vezes a área de superfície da Terra, incluindo os oceanos. Foi neste momento que o Senhor Krishna revelou sua verdadeira identidade e disse ao rei que ele não teria que pagar sua dívida imediatamente, mas poderia fazê-lo ao longo do tempo. É por isso que até hoje peregrinos ainda são recebidos com Paal Paysam: a dívida do rei ao Senhor Krishna ainda está sendo paga.Thomás Friedman