“Não existe bala de prata em matéria de Educação. É preciso um plano estratégico, suprapartidário, com objetivos de curto, médio e longo prazos bem definidos e perseguidos com políticas públicas consistentes e constantes”. [Ministro Luiz Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal][1]“Brasil ainda é o país do Futuro” é o título de uma entrevista feita com Domenico De Masi para o Valor Econômico pelo jornalista Lucas Ferraz no último 13 de março. Belo texto em que é contada a admiração de De Masi pelo Brasil. Na conclusão ele diz que o nosso maior triunfo é a diversidade, com vários mundos dentro de um só e múltiplas riquezas. “O país tem uma bomba atômica que é a [floresta] amazônica, da qual o planeta depende. Por isso o mundo tem interesse que o país seja bem administrado.” Para ser bem administrado, precisa ter planejamento, planos, metas, recursos, administração pública coesa e nação unida para alcançar os objetivos, e isso só se consegue se tivermos gente talentosa que só uma boa educação pode dar. É por isso que não podemos deixar de valorizar uma recente manifestação do ministro do STF, Luiz Roberto Barroso, que fez importante abordagem do assunto com a verdadeira agenda patriótica que o país deveria priorizar: a educação básica. Em texto publicado na revista acadêmica Direitos Fundamentais e Justiça, bem como no site Conjur.com.br, o lúcido ministro apresenta o sistema de educação básica, com todos os seus desafios. Seu objeto do trabalho foi baseado em alguns dos principais documentos internacionais (UNESCO, Banco Mundial, OCDE) e nacionais (INEP, SAEB, BNCC), bem como em vasta e valiosa produção de instituições como Fundação Lemann, Todos pela Educação e Instituto Ayrton Senna. Elegante, ele atribui créditos pela generosa interlocução das professoras Maria Helena Guimarães de Castro e Cláudia Costin, assim como do jornalista Antônio Gois. A reflexão do ministro vale por um plano de governo realmente focado em vencer o desafio de oferecer ensino básico que o país precisa para alavancar o setor educacional e criar talentos para o desenvolvimento, razão de transcrever os principais pontos do seu trabalho. “Com exceção da permanência mais prolongada de Paulo Renato e Fernando Haddad — períodos em que houve efetivo avanço —, ministros têm se sucedido segundo a lógica do varejo político. Nos últimos sete anos, foram nove ministros. Não há política pública que resista a esse tipo de descontinuidade. O país precisa de um plano estratégico, suprapartidário, de curto, médio e longo prazos, que não esteja à mercê dos prazos e das circunstâncias eleitorais.” Importante considerar que o sistema educacional brasileiro é organizado em educação superior e educação básica. A educação básica conta com 57 milhões de estudantes (INEP 2018) e é dividida em três níveis: Educação infantil. Creche de zero a 3 anos e Pré-escola de 4 a 5. São 8,7 milhões de matrículas; Ensino fundamental. Estende-se dos 6 aos 14 anos, dividido em duas fases: 1º ao 5º ano (antigo Primário) e 6º ao 9º ano (antigo Ginásio). São 27,2 milhões de matrículas; e Ensino médio. Deve atender jovens de 15 a 17 anos, sendo ministrado em três anos. São 7,7 milhões de matrículas.” Os desafios são dramáticos: a escolaridade média é de 7,8 anos, inferior à média do Mercosul (8,6 anos) e dos BRICS (8,8 anos). Cerca de 11 milhões de jovens entre 19 e 25 anos não estudam nem trabalham, apelidados de “nem nem”. Em resumo são:
- (a) Não alfabetização da criança na idade certa. De acordo com a Base Nacional Comum Curricular, a alfabetização deve se dar, a partir desse ano de 2020, no 2º ano do Ensino Fundamental. Em larga proporção, isso não ocorre. Problemas associados à não alfabetização são os altos índices de reprovação e a defasagem idade/série;
- (b) Evasão escolar no Ensino Médio. Existem 10 milhões de jovens entre 15 e 17 anos. Cerca de 3 milhões deles estão fora da escola, entre os que não se matriculam, os que abandonam o estudo e os que são reprovados por falta. Isso impacta a renda, a produtividade e as opções de emprego dessas pessoas, além de aumentar o risco de violência e cooptação pela criminalidade. A necessidade de trabalhar e a falta de atratividade de currículos defasados são apontadas como principais causas; e
- (c) Déficit de aprendizado. Problema gravíssimo é detectado pelos sistemas de avaliação nacionais e estrangeiros: o jovem conclui o Ensino Fundamental e o Ensino Médio sem ter aprendido fundamentos básicos de Linguagem, Ciência e Matemática. Estamos no fim da fila no PISA, prova organizada pela OCDE para aferir o nível de aprendizado de jovens de 15 anos.
- (a) Atração e capacitação de professores Este é um dos pontos nevrálgicos da Educação Básica no Brasil: a pouca atratividade da carreira do magistério. Há problemas de valorização institucional e, consequentemente, dificuldade de atrair valores para os seus quadros. Sem desmerecer a dedicação e o talento de muitos professores vocacionados e abnegados, os dados demonstram que, nos últimos tempos, os cursos de Pedagogia são escolhidos pelos que têm rendimento abaixo da média no ENEM. Há problemas de formação de professores, de condições de trabalho, de infraestrutura das escolas e limitações quanto à remuneração. É preciso tratar o magistério como uma das profissões mais importantes do país, elevar a capacitação dos professores e aumentar a atratividade da carreira, com incentivos de naturezas diversas.
- (b) Escola em tempo integral A ampliação do tempo de permanência na escola de cinco para oito horas é providência reconhecida como decisiva para o avanço da Educação Básica. Naturalmente, é necessário atentar para a qualidade desse tempo extra, com medidas curriculares e extracurriculares. Os Estados da Federação que adotaram programas de escolas em tempo integral, como Espírito Santo e Pernambuco, destacaram-se nos resultados do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). De acordo com dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), menos de 10% dos alunos do sistema de Educação Básica estudam em tempo integral.
- (c) Ênfase na educação infantil Documentos do Banco Mundial e pesquisadores reconhecidos internacionalmente atestam que o principal investimento a ser feito em Educação Básica é a partir das primeiras semanas de vida da criança. Nessa fase, o cérebro é uma esponja que absorve todas as informações que lhe são transmitidas. Esse é o momento de se assegurar que a criança receba nutrição adequada, afeto, respeito, valores e conhecimentos básicos. Embora o papel da família seja determinante, o fato é que, em um país como o Brasil, com tantos lares desfeitos, a escola precisa, em um percentual bastante relevante, suprir demandas que muitas vezes a criança não terá atendidas em casa. Mas as creches têm que ser de qualidade, quer nos seus professores, quer nas condições mínimas de infraestrutura. Pesquisas demonstram que boas creches contribuem de maneira significativa para o desenvolvimento do potencial das crianças, enquanto creches de má qualidade possuem, inclusive, efeitos contraproducentes. “Uma observação final: também existe consenso entre os especialistas – e comprovações empíricas mundo afora – de que a mera injeção de recursos, sem aprimoramento da gestão, sem projetos concretos e consistentes, não é capaz de trazer resultados significativos.”