O berço da desigualdade está na desigualdade do berço. Ao nascer, cada criança começa seu longo caminho à desigualdade. Quando nascem, alguns começam a comer, outros não; a seguir, alguns vão cedo para a escola, outros não; depois, alguns frequentam-na irregularmente, ou a abandonam antes de concluir o ensino médio, ou o concluem com péssima qualidade; enquanto isso, outros ficam na escola por 20 anos, do pré-primário até o final da universidade. (Prof. Cristovam Buarque, do livro “Sou insensato”)Num país com enormes questões para serem resolvidas e com planos e soluções que dormem há decênios nas gavetas governamentais, tudo demanda ações urgentes. As desigualdades de classes sociais foi o mais visível problema brasileiro evidenciado pela pandemia. São mais de 63 milhões de brasileiros que precisam urgentemente d ajuda para sobreviver e isso e um catástrofe. Saúde, saneamento, moradia, urbanização, trabalho e educação não podem permanecer como estão, precisam de ações emergências urgentes e fortes para que não se perca uma geração inteira. É dramática a situação e apenas as forças políticas, ideológicas e interesseiras não percebem a gravidade da situação para o Brasil de hoje, mas especialmente para o futuro. Tudo é importante, mas os desafios que estão ligados a propiciar trabalho e ocupação aos sem recursos sobreviverem são imediatos. E isso inclui principalmente, o dever de oferecer uma escola pública com qualidade, coisa que hoje não temos. Trabalho e renda dão sobrevivência agora, mas só a boa educação oferece sobrevivência a longo prazo. O propósito do Movimento de Conscientização da Sociedade Brasileira pela Educação é criar uma agenda para colaborar com o estado, com as empresas, com a sociedade organizada, com as famílias, para que a educação seja de fato um bem para beneficiar a todos brasileiros, para propiciar condições de viver com dignidade através de emprego e trabalho. Citando a publicação “Os obstáculos à qualidade e à equidade da educação no Brasil”, do Prof. Cristovam Buarque, ratifiquei sua análise das razões culturais, sociais, econômicas e geográficas que mostram que a grande parte da sociedade não tem consciência do valor da educação como fator de desenvolvimento. Diferentemente de outros povos, não podemos dizer que temos obsessão pela educação como estratégia de desenvolvimento pessoal e coletivo. Referente ao meu artigo da semana passada, recebi e-mail bem crítico, cuja síntese é a seguinte:
“acho muito ‘feio’ ou politicamente incorreto falar que a culpa é do povo brasileiro ou de falta de vontade ou preguiça. Acho que essa é uma visão antiga. Não sei em que ano o Cristovam Buarque escreveu o artigo, mas dizer que os alunos abandonam a escola porque querem é muito injusto. E se abandonam a escola é por que tiveram algum motivo e não cabe a nós julgá-los e dizer que foi por preguiça. Acho que teu texto está batendo na mesma tecla, ou seja, que somos inferiores, que somos preguiçosos, etc. É uma fala muito retrógrada e antiga, me desculpe.”Esclarecendo o leitor: Não estou culpando o povo brasileiro e sim as lideranças que comandam a nação – políticos, governantes, gestores, empresários, líderes de entidades, estudiosos e outros que deveriam ter em mente que existem compromissos constitucionais e legais para oferecer boa educação e isso não acontece. O artigo do Buarque é mais uma provocação para que se reaja e lamentavelmente isso não acontece, por vários motivos, a começar porque a escola pública não tem qualidade, não tem estrutura de suporte, tem poucos professores qualificados para oferecer um mínimo de conhecimento, o que mostra os resultados do PISA. A OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) salienta que um brasileiro de família sem recursos leva 9 gerações para atingir a classe média. A falta de internet é um fato. Daqui pra frente o sistema educacional dependerá da tela, como maior apoiador para seus programas. É necessário ter um meio para oferecer condições tecnológicas não só aos alunos, mas às suas famílias. Não adianta sermos o terceiro pais em número de celulares, porém sem acesso amplo aos aplicativos que permitem conexões seguras. Há um programa governamental, o “Internet Para Todos”, com adesão de 70% das prefeituras, mas apenas 354 prefeitos solicitaram a antena com a sua única obrigação de arrumar o terreno, manter o equipamento e distribuir o sinal para as escolas. Até hoje foi gasto apenas 16% da verba destinada ao programa. Claro que a culpa não é dos brasileiros, mas falta gente comprometida com o processo. Perdemos nosso crédito temporal e agora estamos perdendo uma geração com os jovens “nem-nem”. É fruto da desilusão de um sistema perverso que os expulsou da escola, que os exclui dos bens e serviços fundamentais, que não têm casa própria, não têm nem comida. Isso não é ser retrógrado, isso é a realidade brasileira de hoje, que nos apresenta um corte de R$ 241 bilhões para o orçamento da educação e da saúde do ano que vem, o que significa que elas não são importantes. O leitor conhece quem é o estudante da escola pública? Em que cenário e em que amplitude? Conhece os professores de escolas públicas do ensino fundamental e médio e o que pensam? Sabe o que dizem as pesquisas sobre eles? Temos sim muita gente comprometida com educação que fazem um trabalho fantástico. Ninguém quer criticar ninguém, mas precisamos cair na real antes que seja tarde. Não podemos ficar pensando somente em programas sociais de renda mínima, sem uma contrapartida de profissionalização, de educação para essas famílias carentes para não se tornarem simplesmente clientes a vida inteira. Com respeito aos que fazem parte da ABMES e de outras associações, há muita gente com experiência de sala de aula que pode dar sua contribuição, colaborar para um bom ensino básico estatal e, sem dúvida, poderá ter melhores estudantes procurando suas instituições. E, para concluir, nada melhor do que contar o que aconteceu numa reunião em que estavam presentes Donaldo Trump (presidente dos EUA), Vladimir Putin (presidente da Rússia) e Xi-Jinping (secretário-geral do Partido Comunista da China). Eles discutiam sobre qual a nação que lideraria o mundo. Como não chegavam a um acordo, chamaram Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia, e lhe fizeram a mesma pergunta. Ele respondeu:
Pelo que sei, o CEO da Google é um indiano. O CEO da Microsoft é um indiano. São também indianos ou de origem indiana os CEOs de grandes outras grandes empresas mundiais como Citigroup Vision Fund, SoftBank, Adobe, NetApp, PepsiCo, Nokia, MasterCard, DBS, Cognizant, Novartis, Conduent, Diageo, SanDisk, Motorola, Harman, Micron, Palo Alto Networks, Reckitt Benckiser, IBM. O ministro de Finanças do Reino Unido é indiano, a ministra do Interior do Reino Unido, o primeiro ministro irlandês, são todos indianos.Então Modi disse que são eles que lideram o mundo e explicou que este era o resultado da política de estado da Índia que há cinquenta anos é orientada para a educação. E o desafio que fica para nós será estipular quantos anos vamos levar para trocar toda esta gente por brasileiros.