A pandemia, o isolamento social e o fechamento de escolas aceleraram a transformação digital nas instituições de ensino, que seguem num mesmo padrão de aprendizagem desde a revolução industrial, quando se estruturou o formato de grade curricular, disciplinas e padronização do conteúdo, cujo maior êxito dos estudantes era mensurado através de provas e notas. Modelo que atendia à necessidade da época de formar as pessoas que até então trabalhavam no campo e precisavam se familiarizar com a realidade da indústria.
Agora, estamos em vias de viver a maior revolução educacional, pautada pela realidade atual em que a escola precisa ter um significado e a aprendizagem reflita a curiosidade e anseios dos jovens. O Banco Mundial estima que 70% das crianças do ensino fundamental no Brasil possuem dificuldades severas para ler e compreender um texto simples e no último PISA nosso país pontuou abaixo da média mundial. Os números de evasão escolar e baixo nível de aprendizagem ano após ano nas métricas mundiais deixam evidente a urgência de colocar o estudante como protagonista do processo de aprendizagem e o professor como grande mentor, para que a escola seja ativa, mão na massa, que gere projetos e forme pessoas para o futuro. Provas deixam de ser uma régua que destaca os bons estudantes e passam a ser avaliações contínuas, que mostram aquilo que todos os estudantes ainda precisam desenvolver, inclusive aqueles que possuem alta performance em um ou outro critério. A proposta da avaliação deve olhar o estudante e não o conteúdo, para definir em conjunto um percurso formativo.
Temos grandes desafios para as escolas do futuro. Apesar de aparentar ser um paradoxo, a tecnologia devolverá a humanidade ao ser humano. Isso acontecerá, pois toda a tomada de decisão que possuir uma resposta clara e objetiva será facilmente absorvida e substituída pela inteligência artificial. Portanto, as escolas precisam preparar os estudantes para lidar com as funções essencialmente humanas, como a criatividade, resolução de problemas, trabalho em equipe e outras tantas competências e habilidades que vão além do conteúdo e das questões de múltipla escolha.
O ambiente escolar precisa estimular a curiosidade, manter aceso o desejo de aprender e criar conexões além da sala de aula. Imagine se o trabalho em equipe fosse feito com estudantes de diferentes estados brasileiros e não necessariamente com aqueles que estão na mesma sala. Somente uma educação que considere o indivíduo em suas particularidades pode buscar dar conta de um país de dimensão continental. A tecnologia reduziu as barreiras físicas, mas o Brasil enfrenta a quebra do paradigma cultural, uma verdadeira revolução para a construção coletiva da próxima grande transformação que deve acontecer na educação nos próximos anos.
Esta mudança é iminente! O próprio mercado de trabalho já demanda um novo perfil de profissional. As pessoas estão atuando em squads, times multidisciplinares estruturados para o desenvolvimento de projetos, com perfis diversos não apenas em faixa etária, mas em termos de especialização. O engenheiro trabalha junto com o marketing, TI e tantas outras carreiras, todos pelo mesmo objetivo. Isto demanda uma nova formação, que precisa ser construída desde a primeira infância.
O aumento da expectativa de vida também amplia a necessidade de formação contínua. As pessoas precisam ser ensinadas a estudar de uma forma diferente e autônoma. O grande desafio da educação é efetivamente reinventar as relações humanas. O mundo precisa de mais cuidado, colaboração, olhar para o outro, empatia e isso só é possível com a ajuda de famílias e escolas, que são grandes agentes de transformação da sociedade.
Já existem iniciativas isoladas em algumas escolas para promover a aprendizagem ativa baseada em projetos e de forma multicultural. Mas a obsolescência escolar requer um esforço coletivo e estrutural para reinventar a educação.
Artigo publicado originalmente no Estadão.
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