Com frequência, representantes do setor produtivo me procuram para saber como podem contribuir com a educação brasileira, com a qualificação da mão de obra dos profissionais e como investir no âmbito social do país. Ações como construir escolas, oferecer formação dentro de suas corporações para funcionários, apoiar organizações da sociedade civil, são medidas válidas, mas que não darão conta da amplitude e complexidade dos desafios que temos no país.
Somente a partir de políticas públicas, com amplo alcance, conseguiremos as transformações e melhorias que queremos e que são necessárias para o desenvolvimento do país e de sua sociedade. Por isso, convido o setor produtivo a entender a corresponsabilidade que todos e todas temos com a educação e o futuro das nossas juventudes.
Um dos exemplos dessa corresponsabilidade vem do Piauí. O Estado está iniciando uma jornada que pode ser referência para outros territórios do país e, também, para a esfera privada. O Piauí aprovou uma lei, a primeira no Brasil com esse enfoque, que cria a Política Estadual de Educação Profissional e Tecnológica (PEEPT) e que prevê a interlocução com o setor produtivo como instrumento fundamental para contribuir com o fortalecimento da educação técnica para as juventudes piauienses.
Por meio de lei, que foi aprovada no final do ano passado e que terá continuidade na nova gestão, o setor produtivo foi chamado a participar e a cumprir seu papel nessa trajetória. Cabe ressaltar que a lei foi aprovada em 2022 e está sendo implementada em 2023 por uma nova gestão à frente do Estado, o que mostra um compromisso importante para com suas juventudes e sua sociedade.
A nova lei coloca os sistemas público e privado trabalhando juntos para pensar o bem comum das juventudes, em um caminho seguro. É uma lógica que faz sentido já que, no Brasil, o poder público arca com 88,8% das matrículas do ensino médio, atendendo a maioria dos jovens. Ou seja: é fundamental que a oferta de formação profissional nas escolas, hoje predominantemente na rede pública, tenha a contribuição efetiva do setor produtivo. É um caminho saudável, possível e necessário, além de ser uma obrigação prevista na Constituição Federal, de oferecermos educação e trabalho para os jovens.
Temos, ainda, a chance de gestar o Brasil do futuro por meio de oportunidades de trabalho digno e desenvolvimento profissional para as juventudes hoje. Não há chance de construir estas possibilidades e um caminho socialmente saudável para o país sem considerar o ecossistema produtivo e a organização do mundo do trabalho que, hoje, têm no setor privado mais de 80% dos vínculos formais de emprego, segundo a RAIS (Relação Anual de Informações Sociais).
O envolvimento do setor produtivo nesse processo será fundamental para alinhar a formação profissional dos jovens ao século XXI e às novas economias, atendendo às transformações do mundo e aos anseios desses cidadãos. O setor público, que tem a visão ampliada sobre as desigualdades, dará o equilíbrio entre as particularidades de cada setor e o desafio de garantir equidade. A ação conjunta pode se dar de múltiplas formas, como articular os cursos e itinerários formativos ao futuro do mundo do trabalho e à identidade territorial, a partir do fortalecimento de programas e parcerias de aprendizagem e inserção profissional digna, com disponibilização de espaços laborais e constante atualização da formação profissional dos diferentes setores. Benefício para todos!
Este exemplo do Piauí vem em boa hora para mostrar que é possível trabalhar de maneira coletiva e intersetorial nos territórios. Vamos lembrar que a meta do Plano Nacional de Educação (PNE) é triplicar a oferta de Educação Profissional e Tecnológica (EPT) de nível médio até 2024, mas esse é um objetivo que não se alcança sozinho.
Para além da lei, que implementou uma Política Estadual de Educação Profissional, é preciso pré-disposição de ambas as partes para estabelecer esse canal de construção coletiva. Há muito a ser feito. Um importante instrumento para que a experiência intersetorial do Piauí seja replicada e ganhe escala no país é desenvolvermos uma Política Nacional de EPT, que dê as diretrizes para as demais unidades federativas e traga o setor produtivo para perto desse compromisso.
Tenho reforçado nesta coluna mensal a importância de um pacto amplo pelas juventudes do Brasil, por entender que este é “o” momento de criarmos as condições favoráveis para que esses cidadãos tenham seu lugar no desenvolvimento social e econômico do país, perspectivas reais de renda digna, desenvolvimento profissional, projetos de vida e contribuam com o avanço do país. Se quisermos efetivamente ter um país próspero, teremos que considerar os jovens, que hoje somam 25% da população brasileira. Se assim não for, comprometeremos o futuro do Brasil e toda a possibilidade de pleno desenvolvimento.
Celebrei aqui recentemente o momento valioso que o país está vivendo, com as juventudes no centro das falas das equipes do novo governo. Agora, amplio essa reflexão para o setor produtivo. Os jovens têm sido também a prioridade de quem produz e de quem é o motor da economia?
Pensar a juventude é também pensar o país no longo prazo. Não podemos mais nos eximir das possibilidades de atuação pelo bem comum das juventudes e do país.
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Por Ana Inoue, superintendente do Itaú Educação e Trabalho, frente da Fundação Itaú com foco em educação profissional, juventudes e sua inclusão no mundo do trabalho para o Valor Econômico
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