A especialização é uma realidade cada vez mais presente nas nossas vidas e organizações. Profissões, serviços e sistemas, por exemplo, estão segmentados a níveis nunca vistos antes. Apesar de estarmos adaptados a essa realidade, a criação de universidades especializadas segue sendo um “quase tabu” no Brasil, especialmente no que se refere ao processo regulatório da educação superior.
Na essência da nossa legislação, universidades consistem em instituições pluridisciplinares caracterizadas pela indissociabilidade das atividades de ensino, pesquisa e extensão. Contudo, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), no seu artigo 52, parágrafo único, prevê a possibilidade de criação de universidades especializadas por campo do saber.
Universidades especializadas são realidade em algumas das nações mais desenvolvidas do globo e, muitas vezes, têm desempenho acima da média, inclusive ocupando as primeiras colocações em rankings internacionais de qualidade. Esse resultado não surpreende já que elas estão focadas naquilo que é a razão de existir, ou seja, nasceram para serem referência em uma área específica do conhecimento.
A Universidade Tecnológica de Nanyang, por exemplo, é a maior instituição de pesquisa em Singapura e seu foco é voltado para a área da Engenharia. A NTU tem como missão fomentar líderes e a criatividade empresarial. Como resultado, desde 1985 vem conquistando uma série de prêmios, sendo reconhecida como "uma das melhores instituições de engenharia do mundo" pelo Concílio de Engenharia de Commonwealth.
Outra instituição que se destaca nessa seara, e é bastante conhecida pelos brasileiros, consiste no Instituto de Tecnologia de Massachussetts (MIT), localizado nos Estados Unidos. Como o próprio nome sugere, a universidade tem foco na área de Tecnologia. Segundo o ranking de 2022 da QS (Quacquarelli Symonds), um dos mais conceituados do mundo, há dez anos o MIT é a melhor universidade do mundo.
Já temos no Brasil um conjunto de IES que se encaixam no perfil de universidade especializada, mas não podem ser assim reconhecidas em função de essa tipologia ainda não estar regulamentada, e o credenciamento como universidade seguir atrelado à exigência da oferta mínima de 4 mestrados e 2 doutorados, condição que faz com que a instituição perca a característica de especialização.
De forma prática, posso citar instituições como o IME e o ITA, no campo militar; a FGV e o Insper, no campo de gestão; e a São Camilo e a Unichristus, na área da saúde, que seguem enquadradas como centros universitários ou faculdades, arcando com os ônus inerentes às restrições na autonomia impostas às instituições não-universitárias.
A boa notícia é que, em janeiro deste ano, o Conselho Nacional de Educação (CNE) criou uma comissão especial para discutir a regulamentação do artigo 52 da LDB. O grupo será presidido pelo conselheiro Paulo Fossati e contará com a relatoria do conselheiro Henrique Sartori. Além disso, tive a oportunidade de debater sobre essa questão com a Seres/MEC, que se mostrou aberta ao debate.
A especialização já se mostrou eficiente nas nossas vidas e também vai trazer ganhos significativos para a educação superior brasileira. Precisamos valorizar instituições que desejem focar na oferta de cursos de qualidade em um campo específico do conhecimento, assim como queremos ter o direito de ir a um neurocirurgião e não a um cirurgião geral para uma intervenção no cérebro ou na coluna.
A criação de uma nova organização acadêmica que contemple esse cenário está na agenda prioritária da ABMES para este ano de 2024. Vamos trabalhar incansavelmente para garantir mais esse avanço. Sigamos rumo à conexão da educação superior brasileira com as melhores práticas globais.
29