A ideia deste artigo nasceu depois que li o livro As Leis Fundamentais da Estupidez Humana, de Carlo Cipolla. Fiquei impressionado com a forma simples e, ao mesmo tempo, profunda com que o autor explica como nossas ações podem gerar ganhos ou perdas não apenas para nós mesmos, mas também para os outros. Essa leitura me levou a pensar imediatamente na educação: como gestores, professores e estudantes tomam decisões todos os dias que afetam tanto sua vida pessoal quanto a vida da comunidade acadêmica e da sociedade.
Ao refletir sobre isso, percebi que a matriz proposta por Cipolla, que cruza ganhos e perdas individuais com ganhos e perdas coletivos, poderia nos ajudar a olhar para a educação de forma mais estratégica. Meu objetivo aqui é, portanto, compartilhar essa reflexão: mostrar como quatro tipos de comportamentos — os ingênuos, os inteligentes, os vigaristas e os estúpidos — aparecem no universo educacional e como podemos aprender com eles a construir instituições mais sustentáveis, inovadoras e humanas.
Ao trazer essa matriz para a educação, percebi que ela nos ajuda a enxergar com mais clareza atitudes e decisões que muitas vezes passam despercebidas no dia a dia acadêmico. É como se esses quatro quadrantes funcionassem como um espelho: revelam perfis de comportamento que convivem dentro das instituições e que impactam diretamente estudantes, professores, gestores e a própria sociedade. A partir dessa lente, consigo refletir sobre como cada um desses arquétipos se manifesta no ambiente educacional e quais lições podemos extrair deles.
Os Ingênuos (ou santos)
Penso em professores e gestores que se dedicam ao extremo, sacrificando tempo, energia e até bem-estar pessoal para que outros possam ganhar. São pessoas admiráveis, mas que muitas vezes acabam esgotadas, pois a instituição não oferece o suporte e o reconhecimento necessários. Vejo isso, por exemplo, em docentes que, por paixão, assumem mais turmas ou atividades do que deveriam, ou em coordenadores que acumulam funções administrativas e pedagógicas sem receber apoio suficiente. A generosidade deles mantém viva a missão educacional, mas também pode perpetuar estruturas injustas.
Os Inteligentes
Esse é o quadrante que mais me inspira. Aqui estão os estudantes que crescem academicamente e devolvem esse crescimento para a sociedade; os professores que avançam em suas carreiras e, ao mesmo tempo, elevam a qualidade da aprendizagem; os gestores que garantem a sustentabilidade financeira sem perder de vista o compromisso social. Lembro-me de projetos em que a pesquisa científica resulta em inovação aplicada em comunidades locais, beneficiando tanto os envolvidos diretamente quanto a instituição que se fortalece. Esse é o caminho do ganha-ganha, que devemos perseguir.
Os Vigaristas
Infelizmente, também encontro esse perfil no ambiente educacional. São aqueles que buscam benefícios imediatos, mas acabam prejudicando a coletividade e fragilizando a credibilidade da educação.
Vejo isso quando instituições investem mais em marketing do que em qualidade, quando projetos pedagógicos são feitos apenas para cumprir formalidades ou quando lideranças usam seus cargos para autopromoção. Os ganhos são de curto prazo, mas os prejuízos recaem sobre estudantes, professores e a própria instituição. Sem confiança, não há educação que se sustente.
Os Estúpidos
Talvez sejam os mais perigosos. São aqueles que, ao resistirem de forma cega à mudança, acabam causando prejuízos tanto para si quanto para os outros. Já presenciei instituições que se recusam a adotar metodologias ativas ou a integrar tecnologias digitais porque “sempre fizeram de outro jeito”. Essa postura, em vez de preservar tradições, sufoca possibilidades de crescimento. Outro exemplo está em políticas internas que, por excesso de burocracia, impedem inovações pedagógicas simples, como flexibilizar currículos ou experimentar novos formatos de avaliação. No fim, todos perdem: professores, estudantes e a própria instituição.
Analisando esses quatro perfis, tiro algumas lições que considero fundamentais para quem atua na gestão educacional:
- Cultivar a inteligência coletiva: acredito que devemos criar ecossistemas em que o crescimento de um represente também o crescimento de todos. Isso acontece quando conectamos universidade e comunidade, quando desenvolvemos projetos de extensão alinhados aos ODS ou quando aplicamos metodologias inovadoras que unem tecnologia, ética e compromisso social.
- Proteger a educação de práticas nocivas: vejo como essencial estruturar políticas de integridade, transparência e ética acadêmica. Precisamos de mecanismos claros para coibir fraudes e oportunismos, fortalecendo a confiança no ambiente educacional.
- Valorizar quem se dedica: não podemos permitir que professores e gestores que se entregam de forma generosa se tornem vítimas do próprio esforço. Reconhecer, apoiar e valorizar essas pessoas é uma forma de manter viva a missão da educação.
- Romper a inércia: sei que mudar nem sempre é fácil, mas acredito que a formação continuada, os espaços de experimentação pedagógica e a promoção da inovação são caminhos para que as instituições deixem de lado a resistência improdutiva.
Por fim, ao adaptar a matriz de Cipolla para a educação, compreendi que estamos sempre diante de escolhas que nos aproximam de diferentes quadrantes: podemos cair na ingenuidade, no oportunismo ou na inércia. Mas acredito firmemente que o futuro da educação só será sustentável se caminharmos para o quadrante da inteligência, onde todos ganham.
É nesse espaço que desejo ver nossas instituições situadas: um espaço em que professores crescem, estudantes se realizam, gestores fortalecem a sustentabilidade, e a sociedade se beneficia. Quando conseguimos alinhar ganhos individuais e coletivos, a educação cumpre seu papel mais profundo: transformar vidas e construir um futuro mais justo e inovador.
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