Este artigo trata de uma conversa que tive com Ivan Pereira, um jovem que muito admiro, que terminou virando um podcast sobre políticas públicas de educação (youtu.be/-y5rWgpQzvs). Ele começou me perguntando: "Qual o maior desafio da educação em nosso país?". Eu lhe disse, sem hesitar: "Colocar numa mesma equação quantidade e qualidade". De imediato, ele me questionou: "Como assim, pode me explicar melhor?" Eu lhe respondi que vencemos praticamente a questão do acesso à escola dos 4 aos 17 anos, portanto, estamos falando de quantidade; mas precisamos avançar — e muito — no campo da aprendizagem escolar e na redução das desigualdades. Disse-lhe ainda que essa desigualdade tem determinantes conhecidos — como o fator socioeconômico —, mas, além disso, há variáveis intraescolares decisivas, como a qualidade do professor e a liderança do diretor.
Em certo momento, Ivan me perguntou: "Como você enxerga a participação do estudante nesse processo?" Fui buscar a resposta lá atrás, quando ainda exercia a docência — algo que fiz por mais de 35 anos na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Lembrei-me de uma certa aula de termodinâmica em que não soube responder a algo que um estudante havia me perguntado. Quem me socorreu foi outro estudante, usando seu celular, que, em segundos, transmitiu corretamente a resposta da qual eu precisava. Eu também tinha celular, mas... Em vez de proibir o celular, transformei-o em ferramenta de cocriação: a cada nova aula, dois estudantes monitoravam as novidades por meio dele e traziam contribuições. O que vi, então, foi o protagonismo estudantil gerando engajamento e contribuindo para o processo do ensino e da aprendizagem. Os jovens não querem um "mundo dado"; querem ser coautores do seu aprendizado — e esse protagonismo, bem mediado, melhora os resultados. Professor e alunos aprendem juntos.
Ivan então me disse que tudo isso nos leva a um tema incontornável: a formação docente — com o que concordei de imediato. Disse-lhe que a formação no Brasil é ainda muito conteudista — o que não se coaduna com o mundo disruptivo em que estamos vivendo. As mudanças não são mais lineares e, sim, exponenciais. Como disse Richard Hamming — matemático americano já falecido —, "o professor deve preparar o aluno para o futuro do aluno, e não para o passado do professor".
A observação seguinte foi inevitável. "Isso significa", disse Ivan, "que precisamos oferecer uma educação plena aos nossos estudantes, uma educação que vá além das competências cognitivas" — com o que concordei de imediato. É preciso inserir nos currículos escolares o desenvolvimento de competências sociais, emocionais e físicas aos nossos estudantes. Mas reforcei que é preciso dar intencionalidade curricular em consonância com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) — que não é um currículo, mas uma bússola que nos leva a uma formação integral, conforme reza o Artigo 2º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Caso contrário, corremos o risco de premiar práticas que não correspondem ao nosso tempo.
Ivan, então, lembrou que estamos vivendo um ano importante para nossa educação, com a aprovação pelo Congresso Nacional do Sistema Nacional de Educação (SNE) e com a tramitação do Plano Nacional de Educação (PNE). De fato, ele trouxe à tona dois instrumentos decisivos para o aperfeiçoamento das políticas públicas de educação em nosso país. Para lhes dar escala e continuidade, é indispensável fortalecer a governança do sistema. O SNE, por exemplo, oferece uma oportunidade rara: integrar dados, garantir o monitoramento e apoiar a gestão por evidências. Mas, sozinhos, os dados não mudam a sala de aula; é preciso conferir apoio técnico às redes, à formação de professores e gestores, ao regime de colaboração e à participação social.
Para concluir, Ivan me pergunta: "O que recomendaria aos parlamentares e gestores da educação?" "Muitas coisas", disse eu, mas apontaria que, neste momento, devem colocar a educação integral explicitamente no centro do PNE que se discute no Congresso, com diretrizes e instrumentos que deem lastro à dimensão socioemocional; articulem o financiamento a resultados com foco em equidade; fortaleçam as carreiras docentes e aproximem universidades e escolas; alinhem avaliação, currículo e formação a uma mesma visão de qualidade; e cuidem da continuidade — pois a descontinuidade tem sido um inimigo silencioso da educação brasileira.
No fundo, trata-se de reconhecer que educar é uma maratona, não uma corrida de 100 metros: a beleza está em aprender a cada passo, construindo sentido e legado. O que diferenciará as pessoas, no futuro, não será terem mais ou menos tecnologia à disposição, mas suas qualidades humanas — e a escola é o lugar por excelência para cultivá-las, com ciência, intenção e cuidado.
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*Artigo publicado originalmente no jornal Correio Braziliense, no dia 06/11/2025 - clique aqui e acesse




