Estamos na era da criatividade porque houve uma mudança de regime de mercado. Agora, o cliente é o chefe – escolhendo, exigindo e tão leal quanto lhe convém. O novo chefe faz apenas uma pergunta: o que você pretende fazer por mim amanhã? Somente a criatividade é capaz de responder. (John Kao)[1]Há duas semanas, publiquei no blog ABMESeduca o artigo “Atributos profissionais que fazem a diferença”, em que relato estudo feito pelo Graduate Management Admission Council (GMAC) sobre as forma de valorização das competências socioemocionais por parte das empresas. As críticas feitas por amigos e o comentário da leitora Isabella Soares ao mencionado texto – no qual a criatividade consta como a última colocada na relação dos dezenove atributos requeridos pelas empresas – levam-me a retomar a questão para prestar-lhes os esclarecimentos devidos. Há vários aspectos envolvidos. É preciso, em primeiro lugar, conhecer como foi idealizada a pesquisa do GMAC; em segundo, identificar os tipos de empresas que foram consultadas – o que pode ensejar a uma análise diferente, e, por último e mais importante, saber como as empresas em geral se posicionam em relação ao atributo criatividade tanto para elas quanto para seus funcionários. Em resumo, tudo depende dos objetivos da pesquisa, de “como” as questões foram formuladas e de “quem” as aplicou. Fato notório e regra geral é que as empresas continuam a fazer o que sempre fizeram e pouco ligam – e mesmo se comportam como se cegas fossem – sobre as mudanças que ocorrem no ambiente. Algumas, ainda menos sensíveis à criatividade e ofuscadas pelo sucesso momentâneo em que vivem, não têm a argúcia de perceber as transformações características de mercado que subvertem a realidade dos negócios a cada instante. O que mais se ouve é que “em time que está ganhando não se mexe” e as empresas avessas aos riscos inerentes da criatividade são superadas com o tempo pelos concorrentes, pela oferta de produtos e serviços melhores e pelos novos processos que ocorrem em sua área de atuação. No mundo competitivo em que vivemos, numa nova economia, a empresa vencedora será aquela capaz de ter os melhores talentos e a criatividade como o seu maior ativo. Assim, conceituamos criatividade como processo por meio do qual as ideias são geradas e desenvolvidas e transformadas em valores. Num futuro que já bate à nossa porta, os desafios irão convocar a nossa capacidade coletiva de lidar com eles. Para tanto, a criatividade fará toda a diferença. Será preciso então resgatar e promover a capacidade criativa e inovadora das empresas e das pessoas nelas envolvidas em todos os níveis, por meio da valorização do livre fluxo de informações, do compartilhamento do aprendizado e do desenvolvimento de novas habilidades que lhes permitam lidar com os desafios próprios desse novo contexto. O processo criativo não é uma ação corriqueira e não ocorre como se fosse "o estalo de Vieira", como um passe de mágica. Exige, ao contrário, suor, trabalho, conhecimento, audácia, coragem e disciplina e que envolvem o “ser integral”, isto é, o racional/consciente e o abstrato/inconsciente, como partes do todo[2]. O avanço da criatividade aplicada em empresas para dar oportunidade de desenvolver negócios originou-se nos Estados Unidos que, antes e depois da II Guerra Mundial, importou cérebros europeus perseguidos nos seus países que aceitaram trocar talento e genialidade pela oportunidade de trabalho no novo país. Os resultados desta iniciativa foram notáveis no campo das ciências e da geração de conhecimentos. Pode-se afirmar também que dessa conjugação de esforços nasceram diversas metodologias direcionadas a dar base à criatividade nas escolas e nas universidades americanas. Ao analisar o caso brasileiro, comprovamos, com raríssimas exceções, a inexistência da criatividade como estratégia de ensino e como propulsora de atividades diferenciadas e inovadoras que são essenciais para vencer os desafios atuais. Quatro elementos são, a nosso ver, fundamentais ao desenvolvimento do espírito criativo: abertura às novas ideias, tolerância ao risco, entusiasmo e curiosidade que dependem de ambiente/clima/cultura, características nem sempre presentes no ensino tradicional. Consideramos ainda que é importante nesse contexto o papel reservado ao ensino do empreendedorismo que incentiva e desenvolve nos alunos comportamentos e atitudes condizentes com a inovação, com a capacidade de transformação do mundo e com a geração de riqueza. Capacitar o aluno para comunicar-se, interagir e interrelacionar-se nas diversas áreas, usar as redes tecnológicas e ser inovador é uma forma de capacitá-lo para a vida. O futuro do aluno (e por que não dizer da própria IES) é como um barco: pode ser aquele vistoso, bonito, de velas infladas que joga suas portentosas âncoras numa baía do Caribe ou aquele naufragado barco num mar revolto chamado mercado, que acaba se transformando em “casa de siri”. Em todo ambiente hostil, em que só sobrevivem os mais preparados, a criatividade é, sem dúvida, o diferencial necessário para superar as ondas de instabilidade. O talento da equipe, com a soma dos talentos individuais, infla as velas e a embarcação prossegue a sua viagem. Portanto não são apenas as grandes empresas de tecnologia ou de informática que precisam investir em talentos criativos, mas também todas as instituições que tenham em mente se perpetuar no sistema universitário brasileiro. As que desejarem permanecer vão ter que inovar e dar uma resposta aos seus estudantes sobre o que estão pensando em fazer pelo sucesso deles. Finalizando e corroborando o pensamento de John Kao, a criatividade é condição essencial para se estabelecer uma estratégia entendida como conhecimento para se chegar a novas fontes de crescimento. Para ele, todas as pessoas são criativas por natureza, e em qualquer fase da vida. Mas há três formas básicas de alguém fazer aflorar sua criatividade: encontrar novos interesses, fazer de seu local de trabalho um ambiente propício e acolhedor e ter as expectativas certas. [1] Foi professor da Harvard Business School e é um dos maiores especialistas em criatividade nas empresas. É autor do livro “Jamming – Arte e disciplina da criatividade empresarial”. http://www.ngd.ufsc.br/files/2012/04/4_Criatividade_arte-e-disciplina.pdf [2] Interessante conhecer a abordagem de Juvenal Valentim sobre o relacionamento interpessoal. http://juvenalvalentim.com.br/389