“O maior inimigo do conhecimento não é a ignorância. É a ilusão do conhecimento. ”Essa frase já foi atribuída a Stephen Hawking, embora a maioria das referências de pesquisa determine Daniel Boorstin como seu legítimo autor. De qualquer modo, ela nunca foi tão apropriada. O ritmo de produção de conteúdo digital é assustador. Ele tem acompanhado a curva exponencial que determina ou aumenta do poder de processamento dos computadores, enunciada por Gordon Moore em 1965 e válida até hoje. Ou seja, a cada 18 meses, dobra o conteúdo disponível. Em paralelo, a velocidade de produção de conhecimento tem só aumentado. O conceito de “curva de dobra do conhecimento”, de Buckminster Fuller, foi criado na década de 80. Algumas previsões afirmam que, em 2020, o conhecimento humano dobrará a cada 73 dias. Contribuem para a aceleração desse processo o advento da aprendizagem de máquina e o avanço da inteligência artificial. Voltando à frase de Boorstin: com o aumento vertiginoso da quantidade de conteúdo e da velocidade de produção de conhecimento, o risco de acreditar e confiar em conhecimentos obsoletos (ilusões) aumenta também. Em outras palavras: muitas coisas que todos nós aprendemos há décadas, anos, ou meses, ficaram obsoletas e estão sendo rapidamente substituídas por novos conhecimentos, num processo de Darwinismo Digital Exponencial. Esse desafio é exposto no Horizon Report Higher Education Edition 2017, um relatório consorciado que investiga tendências em tecnologia aplicada à educação, como sendo da mais alta complexidade. Quais são os impactos para a Educação? Como resultado, a área educacional, nas esferas pública e privada, vai precisar passar por uma revolução nos próximos anos, das mais diferentes perspectivas. Novas respostas precisam surgir às perguntas: o que deve ser ensinado? Como deve ser ensinado? Quais serão os novos modelos de negócio ou financiamento das instituições de ensino? As palavras que se seguem não têm a mínima pretensão de apresentar respostas mágicas; pelo contrário, buscam propor alternativas de solução, sujeitas a um choque de realidade futura pouco previsível. O que ensinar? D relatórios sobre o mundo do trabalho têm apontado que a automação, apoiada pela inteligência artificial, vão substituir e eliminar centenas de milhares, ou milhões, de postos de trabalho. Do ponto de vista do sistema educacional como formador de cidadãos aptos à geração de renda, precisamos considerar a afirmação do historiador Yuval Noal Harari, acerca do surgimento da classe dos inúteis. Ou seja, pessoas que não terão emprego e sequer serão empregáveis, pois não será possível formá-las para exercer um trabalho. O que as escolas, faculdades, universidades e outros provedores deveriam ensinar, então? Sou entusiasta da abordagem que pretende desenvolver competências essenciais - aquelas que um sistema computacional ainda não seja capaz de emular ou substituir. No topo da lista dessas competências está a criatividade, base da inovação. Entendida como a “capacidade de conceber ideias novas e únicas, com potencial de aplicação prática”, a criatividade ainda é uma das competências que aparentemente só os seres humanos conseguem manifestar. O sistema de ensino tradicional foi um grande obstáculo ao seu desenvolvimento, mas atualmente quase todos os projetos acadêmicos enfatizam a sua importância e propõe formas de estimulá-la. Ser criativo ainda é algo que não pode ser mais bem feito por um robô - isso tem um valor inestimável. A classe criativa é o oposto da classe dos inúteis. Obviamente, também apoio o esforço para desenvolver competências socioemocionais. E admiro o exemplo da Minerva School, onde o currículo de graduação oferece, logo no início, cursos fundamentais para desenvolver: pensamento crítico, pensamento criativo, comunicação efetiva e interação efetiva. Por último, ouso afirmar que todo estudante precisa aprender algo sobre meta-cognição, para saber gerenciar o próprio processo de pensamento e aprendizagem. Todos precisarão se reinventar algumas vezes daqui em diante, de forma autônoma. Como ensinar? O mesmo Horizon Report afirma, em seu sumário executivo, que “o aprendizado online, móvel e híbrido” é uma conclusão obrigatória. Os projetos didático pedagógicos que não incorporarem o uso intensivo de recursos tecnológicos falharão em atender: às preferências de aquisição de informações e interação das novas gerações; às imposições de negócio para instituições que queiram ser sustentáveis financeiramente. E aqueles projetos que pretenderem inovar minimamente deverão considerar as novas tendências, como: sala de aula invertida, aprendizagem baseada em problemas e desafios, aprendizagem totalmente customizada e laboratórios maker, para citar apenas algumas. Além desses fatos consumados, precisamos aceitar que estamos diante de um novo “ecossistema de fornecedores” de serviços educacionais. Se, há alguns anos, a educação só poderia ser obtida a partir de instituições formais de ensino públicas ou privadas, hoje qualquer aluno pode “contratar a aprendizagem” de um espectro bem mais amplo. O termo ecossistema se justifica pois cada participante nele influencia os outros de forma direta ou indireta. Podemos citar, como componentes deste ecossistema:
- Repositórios de informação (ex. Wikipédia);
- Redes Sociais (ex. Linkedin);
- Entidades de Classe (ex. ABMES);
- Comunidades de Prática (ex. IEEE);
- Plataformas gratuitas de aprendizagem (ex. MIT OpenCourseware, Khan Academy);
- Plataformas pagas de aprendizagem (ex. Uol Cursos);
- Escolas Independentes (ex. HSM Educação Executiva);
- Universidades Corporativas (ex. Universidade do Hamburguer McDonald’s);
- Produtores independentes de conteúdo (ex. Whindersson Nunes);
- Escolas formais Públicas e Privadas.
- Os grandes grupos educacionais, detentores de capacidade de investimento e enormes quantidades de alunos (em geral centenas de milhares) vão continuar investindo na escalabilidade exponencial de sua oferta, com ensino cada vez mais virtualizado, controle austero de custos e competição por preços menores. Neste caso, pode-se afirmar jocosamente que os alunos estarão mais preocupados em obter o diploma por um preço acessível. A diminuição das verbas do FIES tem papel relevante nesse cenário.
- As instituições “menores”, mais segmentadas, cuja tradição se construiu apoiada na qualidade de ensino, vão ter que reinventar sua proposta de valor. Precisarão investir, por exemplo, no design de experiências de aprendizagem, na inovação curricular e de gestão, na produção de projetos e de conhecimentos aplicáveis, nas parceiras internacionais e na própria articulação do ecossistema, se quiserem conquistar um aluno cada vez mais exigente e capaz de fazer comparações imediatas entre marcas, opiniões de ex-alunos e do mercado.