Luiz Filipe Trivellato *Consultor da Hoper, atua nas áreas de Avaliação Mercadológica, Planejamento Estratégico, Fusões & Aquisições***Desafios para os Gestores da Educação Privada no Brasil
Recentemente, visitando uma grande Instituição de Ensino Superior ouvi o seguinte comentário feito por um executivo: “apenas nesse ano, já troquei mais de cinco funcionários desse setor, inclusive o gerente, mas por melhor que sejam os currículos e os salários, essas pessoas não conseguem resolver os problemas que temos aqui”. Essa não foi a primeira vez que ouvi tal colocação, mas o rosto preocupado daquele gestor diante da sua incapacidade de resolver aquele contratempo me levou a tentar entender a origem desse problema, e como poderíamos, no mínimo, reduzir os efeitos dessa realidade para os gestores e para as Instituições. Para entendermos melhor essa situação, precisamos voltar um pouco no tempo e relembrar a segunda metade da década de noventa.
Um grande divisor de águas para educação superior no Brasil foi a possibilidade de abertura de instituições com fins lucrativos nesta época. Naquele momento, tornou-se evidente que o setor necessitaria de uma revisão das suas práticas de gestão, até então fundamentadas em normas e regras, acadêmicas e operacionais, herdadas das grandes Instituições Federais. Anos após essa abertura, já em um contexto de alta competitividade, várias Instituições foram colocadas em xeque diante da intensificada concorrência e da crescente redução dos valores médios de mensalidades. Em decorrência dos fatos, o processo de busca por produtividade foi intensificado e levado a sério. A partir desse momento, várias iniciativas sinalizavam uma mudança, que abrangeu desde a implementação de programas de padronização de processos até ‘6-sigma’, passando por diversas ferramentas oriundas da indústria. Desde então, essas iniciativas tornaram-se correntes na carteira de ferramentas das Instituições. Foram várias as mudanças na Educação Privada nacional que, de fato, aumentou a sua produtividade e a competitividade, no entanto, é na organização do trabalho, no desenho acadêmico dos seus cursos “produtos” e no próprio trabalhador que residem os principais desafios provocados por esses novos conceitos. Para esse breve artigo, atentarei apenas para o último desses pontos, os funcionários e gestores.
Dentro das Faculdades e Universidades, a contratação e formação de novos gestores implicou em um novo modelo de trabalho, agora “profissionalmente gerenciado”, capaz de encarregar-se, de criar diferenciais competitivos e qualitativos para as organizações. Esse novo modelo alterou significativamente a forma de organizar o trabalho, apresentar resultados e, inclusive, a remuneração dos profissionais do setor.
Se, antes, no modelo que podemos chamar de “monopolista”, o tempo que gestores e funcionários podiam dedicar para compreender o setor e o mercado era bastante flexível, nesse novo cenário isso já não acontecia. Tanto o número de variáveis quanto a sua complexidade já não eram assimiladas com a mesma facilidade. Enquanto no modelo tradicional o aprendizado acontecia pela simples imersão, convivência e observação sucessiva das decisões, quase sempre, bem sucedidas, hoje esse tempo de aprendizado tem se tornado desafiador para os novos gestores e para as Instituições, que já não podem mais esperar que esse processo ocorra naturalmente. Dessa forma, a solução adotada pela maioria das Instituições de Ensino foi a combinação entre a intensificação dos programas formais de treinamento, o aumento das exigências para contratação dos novos funcionários e uma elevação dos patamares de remuneração, esperando assim reduzir o tempo de “aprendizado” e, então, contar com gestores preparados para os desafios que a expansão do mercado e da concorrência criaram.
Mas qual o problema nisso tudo?
Desconsiderando o fato que algumas Instituições ainda conseguem sobreviver apesar das práticas não usuais de gestão, tudo parece fazer muito sentido se, ainda hoje, não acompanhássemos um quadro onde tanto os investimentos em treinamentos, as exigências por qualificação e o patamar de remuneração aumentam ano a ano, porém sem uma percepção, na alta administração, de um gestor pronto para lidar com os pontos principais do setor.
O grande desafio que essa nova realidade impõe é enorme. Como combinar na figura dos gestores conhecimentos sobre: legislação e regulamentação educacional, aspectos acadêmicos-pedagógicos, questões relacionadas à operação das Instituições e, por fim, um mercado ainda em maturação; por isso altamente dinâmico?
A dificuldade está no fato de estarmos diante de um grande desafio, que tem de um lado as Instituições precisando rapidamente que novos funcionários busquem ações para melhoria da qualidade e competividade, porém sem o devido tempo para o aprendizado sobre o mercado e suas rotinas e, do outro lado, os gestores que buscam a todo custo aprender as suas novas funções para poder executá-las dentro das expectativas das empresas, vivendo assim um dilema entre a ausência de tempo para aprender as novas funções e a obrigatoriedade em desempenhá-las no tempo esperado.
O principal é que esse dilema parece não ter um ponto final nos próximos anos, uma vez que é cada vez maior o hiato entre compreender educação nos seus aspectos normativos, acadêmicos e pedagógicos e ser efetivo na concepção implementação adequada de elementos de gestão nas Instituições.
Por fim, acredito que o momento deveria ser inspirador para uma reflexão. Será que treinamentos, exigências curriculares cada vez maiores e um crescente nível de remuneração dos executivos serão suficientes? Acredito que a resposta é que não, apesar de perceber claros avanços nos últimos anos, em especial nas companhias de capital aberto, que cada vez mais investem em inteligência para compreender cada uma das variáveis do mercado educacional e transferi-las para todos os níveis das suas organizações.
* É graduado em Engenharia Mecânica e Mestre em Engenharia de Produção pela UFMG. Doutorando em Engenharia pelo ITA (Instituto de Tecnologia Aeronáutica). Foi Gerente de Novos Negócios na Kroton Educacional. Tem trabalhos acadêmicos publicados em periódicos do Brasil e no exterior. luizfilipe@hoper.com.br




