Gabriel Mario Rodrigues
Presidente do Conselho de Administração da ABMES
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“O magistério é uma carreira pouco atrativa (...). O primeiro ponto é que é uma carreira mal paga, estressante e de baixo prestígio social. Aqui começa o desafio. O segundo ponto diz respeito ao domínio técnico da área. (...) A última questão é como reestruturar a concepção da escola para um mundo novo, líquido, com jovens que não podem mais ser inseridos em uma estrutura antiga de transmissão de conhecimento. O drama? Nós, professores, eu inclusive, não sabemos como reagir diante do desafio atual.” (Leandro Karnal)
Terça feira passada (8/10) estava eu voltando de Brasília e sentou-se ao meu lado um casal com um menino de não mais de um ano de idade, ele se revezava na viagem abraçado aos pais. Ao ameaçar chorar, o pai retirava-o da mãe e com o filho no colo, compartilhava desenhos de seu iphone e brincavam alegremente. O que nos fez pensar, com todos os avanços da tecnologia e inteligência artificial, como se desenvolverá a universidade nos próximos vinte anos.
Coincidentemente, dois dias após o ocorrido o jornal Valor Econômico publicou excelente reportagem da jornalista Stela Campos sobre a Conferência EnlightED. Organizado pela Universidade IE e pelas Fundações Telefônica e Santillhana, que teve como tema “Reinventando a educação em um mundo digital”.
Stela relata o que foi demonstrado pela sala virtual “Wow”, que funciona na universidade IE de Madrid. “A partir do ano que vem, o holograma de um professor pode estar ensinando estudantes de diferentes países, em uma sala virtual, onde eles ficam posicionados em 48 telas, que juntas formam um grande painel, como no cinema”. A jornalista destaca também outra experiência onde um aluno com óculos especiais faz uma apresentação a um auditório virtual de 10 mil pessoas. O evento tratou do imenso desafio não só do sistema universitário, mas também do mundo do trabalho e de toda a sociedade para, apoiando-se na tecnologia, oferecer oportunidades de aprendizado para quem desejar.
Dentro do mesmo propósito de mostrar a realidade do setor de educação, destaco a apresentação do presidente e CEO da Telefônica, Jose Maria Alvares Pallete, em reportagem de Júnia de Oliveira publicada no O Estado de Minas no fim do ano passado.
“Nenhuma outra geração viveu um acúmulo de tecnologia e mudanças como estamos vivendo agora. São mudanças exponenciais, e não estamos programados para pensar exponencialmente. Dentro da forma com a qual nos relacionamos e atuamos, é importante estarmos conscientes deste momento e do que ele significa. (...) Quem pensa que os smartphones fizeram uma revolução, precisa entender que temos uma revolução muito mais acelerada que ocorrerá nos próximos anos: a inteligência artificial, que prefiro chamar de inteligência cognitiva”, e disse mais. “A ordem agora não é aprender só em escolas, universidades ou por meio de formação continuada, mas aprender permanentemente, em um contexto em que o conhecimento não dá trégua”. A síntese do evento enfim e que a instituição escola precisa ser reinventada se quiser sobreviver”.
A sala de aula mudou. A lousa é a tela de um computador, de um Ipad, de um smartphone ou de um assistente virtual proposto pela internet das coisas. A sala de aula como a conhecíamos está em contínuo e acelerado processo de extinção. A universidade como único "ambiente do saber", já não existe mais. Hoje deve-se aprender para a vida inteira.
Os professores atualmente têm que lidar não só com alguns saberes e a tecnologia, mas também com uma complexidade social crescente: todos vão para a escola, de todos os grupos sociais, dos mais pobres aos mais ricos, de todas as raças e todas as etnias. A própria sociedade tem, por vezes, dificuldade em saber o que ela quer da escola ou mesmo para que ela quer a escola. Há um excesso de missões dos professores, pede-se demais aos professores, pede-se demais às escolas. Afinal, como imaginar escolas extraordinárias, espetaculares, criativas, onde tudo funcione bem numa sociedade em que nada funciona?
Os recentes avanços tecnológicos mudaram muitas áreas de nossas vidas: a maneira como nos comunicamos, colaboramos, aprendemos e, claro, como ensinamos. Esse cenário exige também uma expansão na atuação do professor. Nunca antes o aprendizado aconteceu do jeito que é hoje, ou seja, em todos os lugares, o tempo todo, sobre qualquer tema, técnica ou conteúdo, apoiando qualquer estilo ou preferência de aprendizagem.
Mas o que realmente significa ser um professor do século 21?
O professor precisa ser ousado, persistente, resiliente e esperançoso para descobrir potencialidades e desenvolver as habilidades de cada aluno com quem compartilha seus ensinamentos motivando, orientando e influenciando na descoberta do mundo e na formação de valores, estes, indispensáveis num momento global em que a tecnologia parece substituir o homem.
Sabe-se que a educação desempenha papel fundamental no crescimento econômico, mas para isso há necessidade de bons professores. Cabe, porém, ao Estado, criar um planejamento consistente e de longo prazo, desenvolver políticas capazes de fazer do ensino uma escolha profissional atraente e propiciar desenvolvimento de uma formação continuada dos docentes.
As mudanças do mundo do trabalho e o surgimento da chamada sociedade do conhecimento têm colocado essa formação no centro de intensos debates.
Solução? É preciso criar aulas mais dinâmicas, promover ações que integrem os conhecimentos trabalhados em sala de aula com aqueles do mundo exterior, criar pontes que aproximem a escola das empresas, das instituições de cultura, utilizar de forma mais consistente as novas tecnologias, que viabilizam mudanças educacionais na forma de lidar com o ensino/aprendizagem e, principalmente, ressignificam o papel do professor.
De detentor e transmissor do conhecimento, sem levar em consideração a subjetividade de cada aluno, o professor passa a atuar como mediador de um processo contínuo que precisa ser compartilhado e vivenciado, levando em consideração a prontidão e a receptividade de cada um. Ele também passa a ser orientador na aprendizagem mediada pelas novas tecnologias, acompanhando seus alunos, monitorando e viabilizando a discussão, a troca de ideias e experiências para aquisição do conhecimento.
Nesse contexto, o papel do professor não é ensinar determinado conteúdo (como insisto em repetir, disponível a um toque na tela), mas criar uma cultura de desenvolvimento contínuo. Fazer o aluno aprender a estudar e a correr atrás de conhecimentos e habilidades, torná-lo perseverante e resiliente, sem medo de errar, pois o erro pode transformar-se em algo que deve ser revisto e reformulado para produzir novos saberes.
O professor tem de apresentar desafios que exijam esforço e desenvolvam a capacidade crítica, criativa e colaborativa de todos os seus alunos. Neste particular, o domínio das tecnologias é de grande valia, pois permitem uma educação customizada, que respeita e estimula o desenvolvimento individual, promovendo uma educação inclusiva.
Por todas essas competências é que acredito que o professor precisará se adaptar à realidade dos novos tempos. Antigamente a turma de estudantes se renovava a cada ano e por 20 anos o conteúdo era o mesmo. Hoje, a necessidade de aprender o novo aparece a cada instante. O que era comunicação oral agora é por múltiplos meios de comunicação e tecnologia. Há dezenas de ocupações à nossa espera. Há um novo mundo precisando das nossas competências. A palavra de ordem é aprender sempre. Estamos deixando o lugar de transmissores do conhecimento, para nos tornarmos o que sempre sonhamos: ser eternos estudantes.
Excelente dia dos professores para todos!