Escrever sobre o dr. Gabriel Mario Rodrigues é difícil e fácil ao mesmo tempo. Ao longo de 32 anos trabalhando com ele, para as entidades que presidiu e para o Grupo Gamaro, aprendi muito e ele se tornou um referencial na minha profissão, por isso, é difícil escrever pouco sobre ele. Por outro lado, levando em consideração tudo que ele representa para mim, falar bem sobre ele é bastante fácil.
Como já escrevi nas redes sociais e encaminhei um artigo à Revista de Ensino Superior sobre ele, sem qualquer chance de esgotar sua importância, procurarei complementar com outros fatos não escritos.
No vestibular da Anhembi Morumbi, em 1992, fui à sala dele explicar todas as providências que seriam tomadas para realizar o certame. Depois de expor, ele calmamente me indagou: “o plano A está muito bom e o B?”. Grande ensinamento!
Nas negociações salariais com professores da Anhembi Morumbi, ele criou uma moeda alternativa que era o valor da pizza de muçarela de uma pizzaria da Vila Olímpia. Quando começou a reunião de tratativas, ele pediu para secretária verificar o valor da pizza de muçarela. A secretária se informou e comunicou o valor. Assim, professor Gabriel fez as contas e disse qual era o percentual de reajuste que estava em jogo para negociação, com base na variação do preço da pizza nos últimos doze meses. No mínimo criativo e respeitoso às regras estabelecidas entre as partes!
Em uma outra ocasião, estávamos na reta final de negociação salarial com os docentes da faculdade, quando apareceu um professor na comissão que discordou dos termos da negociação e inovou com uma proposta. Do jeito italiano dele, o professor Gabriel disse que não concordava que uma pessoa que nunca tinha participado da reunião tentasse virar o jogo. A proposta apresentada não vingou e o professor foi convidado a se retirar da reunião.
Nas negociações com os alunos sempre dizia que “o importante é ter o aluno” e que o pagamento de mensalidades era “uma questão de parcelamento ou financiamento”. O mais relevante, dizia ele, “é viabilizar a continuidade dos estudos dos alunos”.
Como a visão dele sempre foi de futuro, teve um momento difícil para ele decidir os caminhos do Instituto Superior de Comunicação Publicitária (ISCP), mantenedor da Universidade Anhembi Morumbi, após a publicação da Lei nº 9.394, de 1996 – LDB; Lei nº 9.131 de 1995 e Lei nº 11.095, de 1995 – Lei do ProUni, que possibilitaram a transformação da natureza jurídica de fins para com fins lucrativos.
O ISCP transformou sua natureza jurídica com finalidade lucrativa e vendeu 51% das quotas para Laureate International. Foi a primeira operação do gênero no ensino superior particular. Com o acordo quase fechado, fomos almoçar na praça São Lourenço, próximo a uma das unidades da Anhembi Morumbi. O local tinha pouca gente, passava das 15h. Foi uma das poucas vezes que vi o Gabriel chorar ao falar dos pais. Foi uma declaração de gratidão aos seus pais.
Um certo momento ele me confidenciou que estava escrevendo uma novela. Disse a ele que sabia do seu gosto por novelas, tanto que tinha uma televisão em sua sala, camuflada para assistir novelas e ele deu aquele sorriso maroto. Eu, como coordenador administrativo da Anhembi, acompanhava as obras e, assim, sabia da televisão. Naquele momento, me fez prometer que jamais copiaria a novela que estava escrevendo e falou de alguns capítulos.
Esses são alguns dos episódios que me marcaram na convivência com dr. Gabriel. No livro “A Educação como Vocação e o Direito como Expressão” que escrevi, há muitas outras histórias dele. Aliás, o prefácio da obra é de sua autoria, bem como o título. O dr. Gabriel sempre inovou na criação de cursos, como Turismo, Moda, Quiropraxia e, aproveitando-se da aprovação da Lei de Diretrizes Básicas, implantou diversos cursos sequenciais.
Embora paciente, era um inquieto contra modelos tradicionais de gestão e de processos regulatórios, de atraso no mecanismo de oferta de cursos tradicionais e optou por propostas de mudanças por intermédio de entidades representativas, como Semesp, ABMES, Fórum, entre outras. Com sua enorme capacidade de articulação, conseguiu sempre unir entidades representativas, respeitando a diversidade de cada um. Sem dúvida que a morte é doce amargo. Doce, pois, quem parte ficará perto de Deus e amargo para nós que ficamos e sentimos sua falta.
Quando alguém lhe dava uma ideia, ele dizia “apresente um projeto exequível e ponha para funcionar”. Creio que se dissesse para ele que irá fazer falta, diria “transforme minha falta em ações”, e, inspiração não lhe faltou para nos dar.
Seu legado é enorme e sua obra está completa, dependendo de cada um de nós darmos sequência e inovarmos.
Gratidão ao amigo Gabriel Mario Rodrigues.
2