Rainer Marinho da Costa
CAO Chief Academic Officer at ABC EDUCATION e Owner at RR Consultoria educacional legalGraduado e licenciado em História, mestre em História Social e especialista em Direito Educacional, em Gestão EmpresarialAtuação em Gestão Escolar
rainercosta@hotmail.com
***Faço parte de um grupo de privilegiados, nasci em 1964 e a minha geração foi uma daquela em que muitos poucos chegaram ao ensino superior, e muito menos ainda na idade correta, ou seja, entre 18 e 24 anos.
Pude cursar um ensino médio em uma escola particular frequentada pelos filhos da intelectualidade de esquerda dos anos setenta e oitenta em São Paulo, o Colégio Equipe. Fiz a graduação numa universidade de renome, PUC SP, tive a chance de estudar em Paris na Ecole Du Louvre e na Sorbonne, fiz o mestrado na mais importante universidade publica do Brasil a USP. Cheguei aos 30 anos com mais de 20 de escolaridade. Sou sim um privilegiado. Não pelo dinheiro, mas pelas oportunidades que um filho das então classes medias urbanas podia ter.
Tornei-me docente do ensino superior privados aos 24 anos, numa instituição que apesar de ser privada tinha uma boa reputação nos cursos oferecidos, o Centro Ibero Americano.
Poderia, portanto fazer parte do coro de docentes e da população em geral que em redes sócias, em post de artigos publicados nos jornais eletrônicos, em salas de professores, ou simplesmente em numa mesa de bar dizem que o ensino superior particular brasileiro está indo de mal a pior.
Acusar o sistema privado de visar somente o lucro e não a qualidade, que os alunos cada vez mais chegam menos preparados, que o MEC não pensa na qualidade. Ou seja, que o ensino superior brasileiro caiu de qualidade, que antigamente tudo era melhor.
Por ser historiador de formação e gestor acadêmico não consigo sucumbir à falácia desse discurso conservador que vê no passado os melhores tempos, um saudosismo descabido que nega a própria essência humana de ser transformar o tempo todo.
Essas pessoas perderam a noção da linha do tempo e não percebem que aquele passado “tão bom” era para poucos privilegiados, nem percebem que eles próprios estão sendo atendidos pelas novas oportunidades que a ampliação do sistema de ensino superior permitiu, com abertura de novos mestrados e muitos latu sensu.
Os atuais docentes são os que mais me chocam, em redes sócias, como o Linkedin, nos fórum de discussões postam observações das mais incongruentes, tipo O MEC não fiscaliza adequadamente as instituições privadas, não impõem regras para melhorar a qualidade do ensino superior, os alunos são na maioria analfabetos funcionais, as IES somente visam lucros e não buscam a qualificação acadêmica de seus docentes. Das particularidades buscam a generalização sem fazerem a devida parametrização do que ocorre no sistema.
Nesses quase 25 anos de docência do ensino superior tive a oportunidade de trabalhar com alunos das mais diversas classes sociais, das mais diversas faixas etárias, tanto de faculdades em regiões centrais como de periferia ou interior.
Para minha felicidade percebi que a ampliação do número de vagas e de instituições de ensino superior privado, vivenciado nos últimos 15 anos, além de ter trazido, sim alguns problemas inerentes a qualquer ampliação dessa magnitude, trouxe, sobretudo, mais oportunidades para pessoas que sem esta ampliação estariam completamente fora do sistema de ensino. Marginalizados do ponto de vista educacional.
O discurso da baixa qualidade do sistema privado não consegue perceber que tamanha ampliação, num primeiro momento, sim acarretou uma qualidade questionável das instituições, quanto a infraestrutura e qualificação docente. Contudo pela própria fiscalização e regulamentação do MEC, as IESP foram obrigadas a investirem fortunas em bibliotecas, em equipamentos, em prédios e também na contratação de docentes qualificados.
Quando iniciei no magistério do nível superior os prédios eram normalmente adaptados, poucos eram construídos com fim educacionais, as bibliotecas em lugares pouco privilegiados e com acervos desatualizados, a compra de novos livros era uma dificuldade. Suporte ao professor quase não existia. A maioria dos colegas mal tinha especialização, sendo a maioria ainda portadores do “chamado parecer”.
Nesses últimos 15 anos apareceram monumentos arquitetônicos destinados ao ensino superior privado, as bibliotecas se tornaram os lugares mais nobres de varias IESPS, os computadores e projetores de multimídias invadiram as salas de aulas, as redes sem fio estão em todos os lugares.
Com certeza essas mudanças não ocorreram somente pelo livre vontade dos chamados mantenedores, mas sim por exigências normativas impostos pelos instrumentos de avaliação do MEC e pela crescente concorrência do mercado que provocou uma comoditisação de muitos dos aspectos pelos quais se podem aferir qualidade. Logicamente o objetivo é o lucro, contudo isso não é um pegado capital, mas ainda quando parte dele é reinvestida nas melhorias de ensino. Ou seja, o resultado final foi à melhoria da qualidade da oferta de ensino.
Em paralelo tivemos a ampliação de titulação docente na maioria da IESPs, sim em muitos casos ainda a certa instabilidade, pois ainda existem algumas que acabam dispensando os mais titulados em momento de crises ou após avaliações do MEC. Todavia os novos instrumentos de avaliação estão a valorizar para pontuação do curso e da própria IES o tempo de permanecia do docente titulado. E nos casos das Universidades esta cobrança aumentará a partir de 2016 com a exigência de 4 mestrados e 2 doutorados.
Mas o maior avanço em tudo isso foi sem duvida a democratização do acesso ao ensino superior, mais ainda muito longe da universalização. Nesse sentido o PROUNI veio fazer a diferença, pois muitos alunos que nunca entrariam numa publica agora estão tendo a chance de estar no ensino superior particular. E por outro lado a competição acirrada de preços entre as IESPs também possibilita que hoje um número crescente de alunos da chamada nova classe C entre no ensino superior.
Tive a chance de ter alunos que há 20 anos nunca teriam a oportunidade de entrar numa universidade, de sentar em suas carteiras, seja porque não teriam recursos financeiros, seja porque o número de vagas ofertadas eram tão poucas, que eles vindo de escolas públicas não dariam como concorrer com alunos melhores preparados oriundos de escolas particulares.
Tive a chance de ter alunos mais velhos do que eu, já com 60 anos realizando o seu sonho de mocidade e de ter alunos de minha geração que não foram privilegiados, como eu, e tiveram que abandonar os estudos e somente agora na maturidade tiveram a disposição pessoal e os recursos financeiros e de tempo para enfrentar uma carteira escolar.
Fico feliz por ver que muitos agora podem realizar seus sonhos. Sim graças à ampliação do sistema de ensino superior privado, pois cabe ao estado priorizar o ensino básico e ele não teria condições de fazer esta ampliação com recursos próprios, inclusive vários países já tiveram esta consciência, por exemplo, a China, na qual o ensino superior e pago seja ofertado pelo estado ou pela iniciativa privada. O que ainda nos falta é uma ampliação do PROUNI e do FIES para atender um numero crescente da demanda de pessoas com poucos recursos financeiros.
E não me esqueço de que quem faz uma instituição de ensino não são suas paredes, seus livros, seus computadores, mas sim eu como docente em sala de aula, que tenho que pegar um carvão e tentar transformar em diamante. Seus coordenadores e diretores assumindo seus reais papéis, e não de meros burocratas da educação.
É fácil me eximir da responsabilidade que tenho como educador e dizer que o “vestibular” não avalia mais ninguém, que era bom os velhos tempos, que tínhamos bons alunos preparados para apreender, que as faculdades eram seria e não visavam o lucro.
Mas o papel do educador é transformar as pessoas, mostrando os caminhos de seu crescimento intelectual.
Sei que pelo que escrevo aqui serei julgado por muitos, pois falar mal do sistema superior privado em voga, mas o dia em que todos que quiserem entrar num curso superior, público ou privado, será um dia muito feliz para este país, pois teremos a oportunidade de construir uma Nação melhor e mais justa fazendo o nosso papel de professores.




