Solano Portela
CFO. Universidade Presbiteriana Mackenzie
***A importância do tema: Durante anos as Instituições de Ensino Superior têm levantado dados e discutido o problema da evasão. Ainda assim faltam, no Brasil, estatísticas confiáveis sobre essa questão, bem como uma metodologia uniforme de medição. (1) Algumas IES medem, ano a ano, quantos alunos desistiram do curso, quer por trancamento da matrícula, quer por cancelamento mesmo (uma medição que não chega a aferir a perda real da receita). (2) Outras fazem a medição do curso inteiro – quantos alunos iniciaram o curso e quantos, daquela turma, completaram (uma medição conturbada pelos possíveis alunos recebidos por transferências). (3) Outras, ainda, expurgam os trancamentos, perante a possibilidade do retorno (enganando-se a si mesmas, pois a receita se esvai também com o trancamento e a grande maioria desses resulta em cancelamento posterior). No entanto, mesmo que o critério de medição não seja uniforme e os dados do segmento fiquem guardados a sete chaves (ninguém gosta de admitir a perda de alunos) a verdade é que o percentual de alunos que não completam os seus cursos é assustadoramente alto. Medições realizadas pelo critério (2), acima, em cursos específicos, apresentam um percentual de 20 a 30%.[1] A evasão média na década passada, de acordo com Lobo (2007), foi de 22%.[2] Isso representa uma tremenda redução na renda das IES particulares e pode ser o ponto chave que vai direcionar o sucesso ou o gravitar na insolvência financeira.
Onde focar a atenção e as ações? A grande maioria dos trabalhos sobre evasão, no nosso país, concentra-se na descontinuidade dos estudos na Educação Básica, principalmente no Ensino Médio (faixa dos 15 a 17 anos).[3] Obviamente, as IES têm o máximo interesse nisso, são alunos que deixam de entrar no Ensino Superior, mas a realidade cruel é que elas pouco podem fazer para remediar essa situação – é uma questão a ser abordada pelo governo junto com as Escolas de Educação Básica. Ou seja, o foco das IES tem de estar concentrado naqueles alunos que já entraram por seus portões; os que foram persuadidos a ingressar, mas estão motivados ou prestes a deixá-las. Mas, nesse sentido, levantar estatísticas de evasão é tão somente olhar para trás e só tem sentido se alguma coisa for feita com os dados coletados. É necessário voltar os olhos ao levantamento de dados dos sinais de evasão iminente e nas ações que podem ainda ter a possibilidade de reversão das intenções de fuga.
Evasão ou retenção? Assim, é melhor falarmos de retenção em vez de em evasão. É verdade que nos círculos acadêmicos a palavra “retenção” pode designar os alunos que ficaram retidos e não passaram para o patamar seguinte nos seus cursos. Mas o termo, além de ser mais objetivo e pró-ativo, é amplamente utilizado na literatura internacional para designar o conjunto de medidas destinadas a manter o aluno viável na instituição, tanto financeira, como academicamente, para que não ocorra a evasão. Os nossos estudos acadêmicos abordando essa questão no ensino superior não são tão abundantes assim, mas não é assim no contexto internacional. Existe, pelo menos, pródiga literatura e também grandes especialistas[4] nos Estados Unidos e também na Austrália – países que têm abordado de forma científica este campo. A importância, nesses países do tema pode ser comprovada pela gestão da retenção exercida pelo menos por uma gerência específica, quando não por um ocupante em nível de diretoria. Veja, por exemplo, a descrição de funções do Diretor de Retenção da Morehead University (grifos nossos): “Colabora com os professores, auxiliares educacionais e administradores para arquitetar, desenvolver e implementar novos programas e adaptar ações/cursos/serviços de apoio para incrementar o número de alunos que retornam à Universidade a cada ano, para completarem os seus cursos e se formarem. Administra o escritório de retenção de alunos”.[5] Percebem? Enquanto estamos preocupados em medir a evasão, eles têm um escritório de retenção. Enquanto consideramos esse campo uma atividade meramente estatística e administrativa, eles estão participando da estruturação de cursos e desenvolvendo ações proativas para aumentar o número de alunos que retornam, ano a ano. Se medirmos os custos da evasão, veremos que essas ações de retenção representarão uma fração do que ela está nos custando.
Conselhos externos? Nossa xenofobia latente pode levar a uma rejeição a priori do exame e prescrição dessas coirmãs do exterior, para a retenção de alunos. Mas ao examinarmos com maior intensidade as situações levantadas e ações sugeridas, veremos que as diferenças não são tão grandes assim. A comparação com o que acontece em outras terras auxilia, inclusive, a quebra de alguns mitos, como por exemplo, o de que a maior causa da evasão é a dificuldade financeira (não é: ela é responsável apenas por 16% dos cancelamentos[6]). Palestras ministradas no Simpósio Nacional de Retenção de Alunos,[7] (Nova Orleans, 2012) apontaram, entre outros, os seguintes pontos de concentração às IES que desejam reter os seus alunos:
- Desenvolver a percepção do quanto a experiência universitária transcende as salas de aula. O processo de ensino-aprendizado é, por vezes, maior na interatividade com a Instituição, do que no tempo passado nas classes. Consequentemente, quanto mais a Instituição ampliar essa interatividade, mais possibilidade de retenção ela terá.
- Repensar as políticas, programas e práticas acadêmicas pensando na retenção. Se a retenção for o eixo, o que deveria ser modificado? Pode ser que após os estudos iniciais as mudanças não sejam totalmente viáveis, mas considerando o custo da evasão é certamente um exercício que vale a pena cada instituição realizar.
- Dar mais ênfase à parte prática do ensino. A hiperconcentração na teoria é um grande fator de desmotivação e afastamento de alunos de um determinado curso. O envolvimento em pesquisas desde o primeiro ano é um grande fator de motivação.[8] Isso tem ficado conhecido como “experiências pessoais de alto impacto”.
[1] Luiz Maurício Tigrinho, “Evasão Escolar nas Instituições de Ensino Superior”, disponível em: http://www.gestaouniversitaria.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=649:evasao-escolar-nas-instituicoes-de-ensino-superior&catid=135:173&Itemid=21 acessado em 20.12.2012.
[2] Roberto Leal Lobo e Silva Filho, “Evasão no Ensino Superior Brasileiro” (2007), disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/v37n132/a0737132.pdf , acessado em 20.12.2012.
[3] Vide, por exemplo o excelente estudo coordenado por Marcelo Neri: “Motivos da Evasão Escolar”, sob os auspícios da FGV (2009), concentrados neste segmento, disponível em: http://www.cps.fgv.br/cps/tpemotivos/, acessado em 20.12.2012.
[4] Vincent Tinto, Chickering & Gamson, Pascarella & Terenzini, entre outros.
[5] Uma das melhores universidades americanas, localizada no estado do Kentucky, com corpo estudantil de 9.000 alunos e 1.100 professores e funcionários. Site acessado em 20.12.2012: http://www2.moreheadstate.edu/hr/exempt/index.aspx?id=33412 .
[6] Levantamento feito no período de três anos (2009 a 2011) no Mackenzie.
[7] Evento que congregou representantes de 250 Instituições de Ensino Superior, entre os quais dois do Mackenzie, para discussão das políticas e metodologias internas visando a retenção de alunos. Anotações do Dr. Argemiro Severiano.
[8] Os nossos Programas de Iniciação Científica, congressos e atividades análogas já providenciam essa alternativa.




