Por: Carmen Tavares*
Nas últimas décadas, o debate sobre saúde e segurança no trabalho passou a incorporar, de forma mais ampla e contundente, os fatores psicossociais que impactam direta e indiretamente o bem-estar dos trabalhadores. Esse movimento se intensificou com a publicação da Portaria nº 1.419, de 27 de agosto de 2024, pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a qual alterou a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-01), incluindo os riscos psicossociais no escopo do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR). Esta atualização normativa, com vigência a partir de maio de 2025, representa um marco na gestão da saúde mental no trabalho, exigindo das organizações a adoção de medidas efetivas para a identificação, avaliação e controle desses riscos.
No âmbito das escolas e universidades, a discussão sobre riscos psicossociais ganha contornos particularmente sensíveis. O ambiente educacional, embora tradicionalmente associado a um ideal de formação e cuidado, revela-se, em muitas circunstâncias, como um espaço de pressões intensas, sobrecargas emocionais e vulnerabilidade institucional. Professores, gestores, técnicos administrativos e demais profissionais da educação estão cada vez mais expostos a condições de trabalho que favorecem o adoecimento psíquico.
Entre os principais fatores psicossociais identificados no setor educacional estão: a intensificação do trabalho, marcada por jornadas extensas e múltiplas demandas simultâneas; a escassez de recursos materiais e humanos; a cobrança por resultados imediatos, muitas vezes desvinculados das reais condições de ensino; a precarização dos vínculos contratuais; o assédio moral institucional; e a fragilidade dos canais de escuta e acolhimento. Em universidades, soma-se a esses elementos a crescente pressão por produtividade acadêmica, publicações científicas e captação de recursos, configurando um cenário de exigências elevadas, mas com pouco suporte estruturado.
Pesquisadores brasileiros vêm apontando, com crescente ênfase, a necessidade de reconhecer esses fatores como elementos estruturais da organização do trabalho educacional, e não como ocorrências isoladas ou atribuídas unicamente à fragilidade individual dos trabalhadores. A literatura científica nacional tem evidenciado que os riscos psicossociais são responsáveis por um número significativo de afastamentos por transtornos mentais, especialmente em redes públicas de ensino e em instituições de ensino superior. Estudos como os publicados na Revista Brasileira de Saúde Ocupacional destacam que o estresse crônico, a ansiedade generalizada e a síndrome de burnout figuram entre os principais agravos relacionados ao ambiente de trabalho educacional, configurando uma crise silenciosa e persistente.
Com a atualização da NR-01, torna-se imperativo que as instituições educacionais passem a integrar os riscos psicossociais em seus processos de gestão da saúde e segurança no trabalho. Essa integração não se limita à elaboração de documentos formais, mas exige uma reconfiguração profunda das práticas institucionais. O PGR deverá incluir diagnósticos detalhados sobre o clima organizacional, avaliações regulares das condições de trabalho, instrumentos para escuta ativa dos trabalhadores, e planos de ação que envolvam desde mudanças na organização do trabalho até o fortalecimento das relações interpessoais e do suporte emocional.
Vale destacar que a legislação não estabelece um modelo único para a identificação dos riscos psicossociais, nem determina uma categoria profissional exclusiva para a elaboração do PGR. Contudo, recomenda-se que a condução desse processo seja realizada por profissionais com formação e experiência em saúde ocupacional, psicologia do trabalho, ergonomia e gestão de pessoas. No contexto educacional, torna-se ainda mais relevante o envolvimento das áreas pedagógicas, das coordenações e das comissões internas de saúde, de modo a assegurar uma abordagem participativa, plural e contextualizada.
Outro desafio que se impõe diz respeito à cultura organizacional vigente em muitas instituições de ensino, ainda pautada por uma lógica de produtividade a qualquer custo, meritocracia exacerbada e resistência à escuta dos sofrimentos laborais. Mudar essa cultura exige ações contínuas de sensibilização, formação de lideranças empáticas e comprometidas, bem como o fortalecimento de políticas institucionais de saúde mental.
A legislação, nesse sentido, funciona como um catalisador, mas a transformação efetiva dependerá do compromisso ético e político das gestões educacionais. Portanto, a entrada em vigor da Portaria nº 1.419/2024 representa uma oportunidade histórica para que escolas e universidades avancem na promoção de ambientes de trabalho mais saudáveis, inclusivos e humanos. Não se trata apenas de cumprir uma exigência legal, mas de reconhecer que o trabalho educacional é, por sua natureza, relacional e emocionalmente exigente — e, por isso mesmo, demanda cuidado, acolhimento e proteção. A prevenção dos riscos psicossociais é, em última instância, uma estratégia de valorização dos profissionais da educação e de qualificação do próprio processo de ensino-aprendizagem.
A equipe da Pro Innovare Consultoria encontra-se disponível para atende-los diante desta demanda que atinge às nossas Instituições de Ensino.
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*Maria Carmen Tavares Christóvão é Mestre em Gestão da Inovação com área de pesquisa em Inovação Educacional. Diretora da Pro Innovare Consultoria de Inovação, atuou como Reitora, Pró Reitora e Diretora de Instituições de Ensino de diversos portes e regiões no Brasil.