A pobreza menstrual, expressão utilizada para denominar a falta de acesso a produtos de higiene menstrual como absorvente, coletor, papel higiênico, sabonete e água, deve ser tratada como política pública a fim de combater a precariedade que diversas mulheres enfrentam e as suas consequências, como a evasão escolar.
As consequências são reais: a Organização das Nações Unidas (ONU) estima que uma entre 10 meninas no mundo sofrem com o impacto da pobreza menstrual na vida escolar. No Brasil, se calcula que o número seja uma em cada quatro. Diante do cenário, em 2014, a ONU reconheceu o direito à higiene menstrual como uma questão de direito humano e de saúde pública.
Segundo o relatório "Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos", lançado pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), 713 mil meninas vivem sem acesso a banheiro ou chuveiro e mais de 4 milhões não têm acesso a itens mínimos de cuidados menstruais nas escolas. Os dados ainda apontam que 900 mil não têm acesso à água canalizada em seus domicílios e 6,5 milhões vivem em casas sem ligação à rede de esgoto. O estudo foi feito a partir de informações do IBGE, por meio da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), da Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE) e da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF).
Tão grave quanto os números apresentados acima é o impacto na saúde emocional dessas meninas e mulheres diante da falta de uma estrutura mínima, culminando na evasão escolar.
Diante do cenário, alguns estados e municípios começaram a tomar iniciativas para auxiliar as jovens. No Rio de Janeiro, a Lei nº 8924/2020 passou a considerar absorventes e fraldas infantis e geriátricas produtos da cesta básica no estado. Em São Paulo, foi publicado no Diário Oficial o decreto que estabelece o programa Dignidade Íntima, no âmbito da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Com a publicação, fica garantido o uso dos recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE-SP), estabelecido pela Lei nº 17.149, de 13 de setembro de 2019, para compra e distribuição gratuita de absorventes para estudantes da rede estadual. O programa prevê investimento de mais de R$ 30 milhões para compra de itens de higiene menstrual.
Na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei º 4968/19 foi aprovado e cria o Programa de Fornecimento de Absorventes Higiênicos (PFAH) nas escolas públicas de ensino médio e de anos finais do ensino fundamental. A deputada Tábata Amaral (PDT-SP) também entrou no debate e apresentou o PL 428/2020 visando a distribuição de absorventes higiênicos em espaços públicos. Na justificativa da parlamentar, cabe à Casa apontar rumos para solucionar a pobreza menstrual no País. Infelizmente, o Projeto de Lei da deputada não saiu do papel, sendo que um problema como o apresentado, que engloba saúde e educação, tem verba garantida pela Constituição Federal.
Ainda há diversos projetos da sociedade civil que buscam soluções diante do cenário, como é o caso da associação sem fins lucrativos Ela Instituto de Educadoras do Brasil, com quem tive o prazer de ter uma reunião e pude conhecer o trabalho realizado. O Instituto já arrecadou 308 mil absorventes para distribuir às jovens, visando a diminuição da evasão escolar. Com a iniciativa, alcançaram 50 mil meninas apenas em Paraisópolis, em São Paulo.
Quando o Estado não funciona, infelizmente, iniciativas como a citada são essenciais e o Terceiro Setor acaba substituindo o Estado naquilo que é fundamental. Afinal, a pobreza menstrual não é apenas um problema de saúde, é também uma questão de educação. Sem dúvida, é um debate que deveria envolver todos nós, que somos cidadãos e devemos enfrentar e buscar soluções e formas para colaborar.
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