Paulo Freitas
Professor e Consultor de Estratégia, Ex Sócio de Consultoria da Ernst & Young e da PricewaterhouseCoopers
***Nas últimas duas décadas o Brasil vem passando por um processo de desenvolvimento econômico baseado em um modelo mais aberto e globalizado. Em grande parte o combustível deste processo foi o aumento da demanda global das “commodities” produzidas pelo país, mas também, pelo consumo interno, fruto de uma maior distribuição e aumento da renda da população que gerou uma classe média mais robusta e com um poder de compra nunca antes visto.
Em um cenário competitivo cada vez mais global, a sustentabilidade do crescimento brasileiro passa inevitavelmente por um aumento da produtividade e competitividade das empresas nacionais. Neste ambiente mais globalizado e competitivo, um dos gargalos mais importantes ao desenvolvimento econômico brasileiro é a pouca educação de seu povo e a baixa formação profissional da mão de obra ativa disponível atualmente. Esta situação cria dificuldades para que certos setores produtivos aproveitem com plenitude as oportunidades geradas pelo crescimento econômico. Este gargalo, no médio prazo, poderá representar uma grande dificuldade no aumento da competitividade da economia brasileira como um todo e com isso o processo de desenvolvimento brasileiro estará ameaçado.
Um melhor nível educacional da sociedade brasileira em geral, assim como, uma formação profissional mais sólida dos jovens é crítica para suplantar este gargalo. O Brasil precisa ter níveis mais próximos dos internacionais em relação ao número de anos de escolaridade de sua mão de obra, assim como, em relação ao número de jovens matriculados em cursos superiores. Para atingir estes níveis, é fundamental que haja um aumento substancial do número de alunos matriculados nas IES brasileiras. O setor de educação deve apresentar taxas de crescimento bem acima dos outros setores da economia e principalmente do PIB.
É bem verdade que na última década o número de alunos matriculados nas IES brasileiras cresceu a taxas bem acima do histórico do setor, porém este crescimento tem sido suportado por um único modelo de crescimento adotado pelas IES brasileiras, sempre baseado em abertura de novos cursos tradicionais e na expansão geográfica dos seus campi. Este modelo é ancorado em uma premissa que define a demanda por um segmento muito homogêneo, praticamente uniforme, o que não é mais verdade nos dias de hoje.
O crescimento da demanda na última década vem acompanhada de uma grande segmentação da mesma. Este fenômeno é verificado em função de uma maior inserção das chamadas classes sociais emergentes no preenchimento das novas matriculas oferecidas pelas IES brasileiras, mas também pela mudança no perfil, comportamento e expectativas do jovem brasileiro em geral.
Estes novos segmentos apresentam necessidades diferentes daquelas apresentadas pelos segmentos que tradicionalmente frequentavam os bancos das salas de aulas das universidades brasileiras no passado. Em geral estes novos segmentos apresentam um menor poder aquisitivo e uma necessidade de participar, cada vez mais cedo, do mercado de trabalho, muitas vezes para custear o próprio curso universitário, ou mesmo ajudar no sustento de sua família. Além disso são mais exigentes e tem pressa, são mais globalizados e independentes.
Uma demanda que apresenta uma segmentação tão diversa, com interesses e expectativas tão diferentes, faz com que as IES brasileiras vejam a necessidade de repensar seus modelos de gestão, atualmente tão uniformes e igualmente desatualizados. Em um ambiente tão mais competitivo e com uma demanda tão diversificada, existe espaço para implantação de diferentes posicionamentos competitivos associados a novos modelos de gestão que permitam que as IES´s brasileiras estejam mais preparadas para oferecer uma solução de valor mais aderentes às novas necessidades do mercado. As estratégias de crescimento devem então estar alinhadas ao posicionamento competitivo associado ao modelo de negócio adotado por cada IES.
Em função da impossibilidade do estado brasileiro prover ensino superior público e com isso atender às necessidades econômicas e sociais do país, o crescimento do número de matriculas tem sido fortemente suportado pelas IES´s privadas. Neste modelo, o financiamento das mensalidades é uma barreira ao crescimento em larga escala quase que intransponível. Porém, além de equacionar a necessidade de financiamento dos alunos, os custos de infraestrutura, como: aluguel e manutenção dos campi, tem se apresentado como uma dificuldade a mais no planejamento das IES em prol do seu crescimento. Nos últimos anos, esta classe de despesa que representou menos de 10% sobre a receita líquida, cresceu para algo em torno de 20%, em alguns casos podendo superar este patamar.
Além disso, como a maioria das IES´s não desenvolvem estratégias que realmente definam posicionamento competitivo claro e diferenciado, o que poderia representar uma vantagem competitiva sustentável, as iniciativas de comunicação e marketing tem sido cada vez mais utilizadas para promover o crescimento e tentar passar uma imagem de diferenciação pouco convincente no mercado. Esta situação pressiona ainda mais os custos operacionais e consequentemente o resultado financeiro das Instituições.
Como a receita das IES não encontra muito mais espaço para crescer em valores reais, pressionada por um ambiente muito mais competitivo, e os custos operacionais aumentam de forma exponencial, o resultado financeiro das IES acaba sendo muito prejudicado. Para que o resultado não seja impactado, algumas IES tem compensado este aumento dos custos operacionais com diminuição dos recursos destinados a iniciativas que privilegiam a qualidade acadêmica dos programas oferecidos, assim como, a formação de professores mais qualificados e motivados.
Para crescer oferecendo soluções acadêmicas de qualidade e ao mesmo tempo equacionando a relação “Receita x Custos Operacionais” , é critico adotar uma gestão muito mais criteriosa e moderna, suportada por instrumentos de gestão muito mais estruturados e sofisticados, que auxiliam os gestores a analisarem os resultados financeiros de cada curso identificando sua viabilidade, tendo em vista que aqueles que não agregam valor ao posicionamento estratégico adotado pela Instituição ocupam espaços cada vez mais escassos e caros.
Sistemas de planejamento do espaço físico disponível, a partir de conceitos que otimizam a ocupação considerando variáveis financeiras, capacidade de investimento, resultado dos cursos, crescimento da demanda e etc...não é mais uma realidade apenas para companhias sofisticadas dos setores de transporte aéreo e de logística. Estes sistemas devem fazer parte do portfólio das ferramentas de gestão de uma IES competitiva e moderna.
Porém apenas implantar sistemas sofisticados de gestão não será suficiente para atender às necessidades de crescimento em grande escala da oferta de mão de obra qualificada. Adicionalmente, as IES´s deverão investir fortemente em tecnologias de ensino e aprendizagem mais modernas e abrangentes que não utilizem, de forma extensiva, a ocupação de espaços físicos sem com isso aumentar substancialmente os custos operacionais.
Oferecer uma solução acadêmica de qualidade e mais aderente às novas necessidades deste novo público requer uma visão inovadora e estratégias de crescimento diferenciadas. Estes novos segmentos da demanda, necessitam de conteúdos que recuperem o “gap” produzido pela deficiência de seus cursos básicos e médios e por programas mais conectados com às necessidades contemporâneas e urgentes do mercado de trabalho. Neste sentido é fundamental a implantação de modelos pedagógicos mais acessíveis, tornando o processo de ensino e aprendizagem mais controlado e ao mesmo tempo mais flexível para o aluno. Estas iniciativas podem representar um ganho de eficiência e escalabilidade para as IES´s brasileiras, neste sentido, modelos e sistemas de EAD e a disseminação dos modelos híbridos que conjugam no mesmo programa técnicas pedagógicas de ensino a distância e presencial são fortes aliados.
Estamos vivendo um momento econômico único na história recente do país, existem claras oportunidades de desenvolvimento econômico e social que não podem ser desperdiçadas ou adiadas. A sociedade brasileira tem urgência em se desenvolver e recuperar anos e anos de atraso e pobreza. Este é um momento que governo e iniciativa privada têm grande responsabilidade com um futuro mais prospero e a altura da expectativa da sociedade brasileira, tanto na oferta de financiamento estudantil como na oferta de programas de educação superior mais adequados e sustentáveis no médio prazo. Neste contexto as IES privadas tem um desafio ainda maior, a modernizando da gestão a partir da implantação de ferramentas gerenciais sofisticadas, assim como, uma atualização pedagógica do processo de ensino e aprendizagem são inegavelmente os maiores desafios das IES nesta década.




