Antonio Carbonari Netto
Membro do Conselho da Presidência da ABMES
Vice Presidente do Semesp
*** O mundo, como o conhecemos hoje, mudou substancialmente na segunda década deste século. Fim do século passado, de heranças dos modelos da onda industrial, fim das crenças ortodoxas do último século, fim dos paradigmas educacionais conservadores, retrógrados e de interesse da aristocracia educacional dominante.
Vocês se lembram daquele antigo exame de admissão aos ginásios? Eu fui um dos que passaram nele. E aqueles outros 49 colegas de turma que não lograram aprovação? Provavelmente estão hoje em algum subemprego, mal remunerados e com poucas chances de mudar de classe social, salvo exceções. Era o tempo dos exames eliminatórios, que excluíam um conjunto de pessoas para que não subissem ao pódio e não atrapalhassem os senhores dominantes na aristocracia rural e industrial brasileiras e seus defensores, detentores dos melhores cargos para si, ou para os seus.
Essa era a crença de outrora, da visão da educação como passagem para a elite. Pode-se lembrar também do vestibular eliminatório, para poucas vagas, em poucas instituições credenciadas, cujo maior pretexto era o de não deixar cair a qualidade (na visão da elite, é claro). Um resquício desse tempo e dos seus argumentos é o que alguns ainda falam: os alunos de hoje em dia não são bons, não têm a mesma qualidade de outrora, chegam muito fraco, não têm mais o mesmo nível, etc.
Se esses jovens estudantes perguntassem a muitos de nós se usamos bem a internet, chats, blogs, Messenger, Skype, SMS, Whatsapp, Google App, Youtube, Instagram, Facebook, etc., até diríamos, se honestos, que não muito bem. Do ponto de vista deles, nós é que não somos tão bons, não temos nível para viver no futuro, não temos a mesma qualidade, somos muito fracos, etc. É muito importante observar que o conceito de qualidade mudou bastante nessas duas ou três gerações. Qualidade hoje é atendimento dos interesses e aspirações dos usuários dos serviços ou produtos e não mais aquilo que nós achávamos em conformidade com o que era para nós.
Pasmem todos: a legislação brasileira de outrora ainda colocava entre suas preocupações que a educação superior era para formar as elites dirigentes do País, oferecendo poucas vagas, concursos seletivos difíceis e eliminatórios. E os jovens da população de poucos recursos, classe média baixa, que trabalham durante o dia e querem estudar à noite?
Somente a partir de 1996, com a aprovação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei nº 9294/96, é que ficou claro que uma das principais finalidades da educação superior era a de... ”formar diplomados, nas diferentes áreas de conhecimentos, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua...”. A ascensão social, agora, ficou para o desenvolvimento pessoal e profissional de cada um.
A partir de 1970, com a popularização do ensino superior para mais brasileiros, das faculdades particulares sendo criadas em toda parte, graças à visão de alguns estadistas, a oferta cresceu, melhorou a aproximação com os pequenos centros urbanos e favoreceu as matrículas de milhares de estudantes que, até então, estavam à margem do processo educativo superior. Foi a partir daí que começou realmente a educação superior da população brasileira. E não antes, com poucas universidades, nos grandes centros, com poucas vagas, buscando a formação para a elite.
É claro que, com a mudança dos conceitos relativos à qualidade, muita gente ainda ficou no passado, achando que o melhor é aquilo que essa gente acha e não no ponto de vista do usuário. A maior quantidade de faculdades veio para atender a demanda, ao maior acesso, à maior possibilidade dos jovens crescerem nos seus projetos de vida, melhores chances nas ocupações e profissões. E ainda é muito pouco.
Dados do IBGE de 2010 mostram que na faixa dos jovens de 18 a 24 anos (e são mais de 24 milhões de pessoas), aproximadamente 14% estão matriculados no ensino superior (cerca de 3,360 milhões), os demais matriculados são jovens de idades mais avançadas. A meta do Plano Nacional de Educação anterior, que era, até 2010, chegar aos 30% dessa faixa, não foi atingida! Continuamos com a metade da meta. Isso não foi possível porque ainda há defensores das ideias de diminuição das vagas dos cursos, há poucos cursos noturnos nas universidades públicas, redução de oferta de cursos à distância, etc. Como se o País não precisasse de mais e mais profissionais formados em cursos superiores. Hoje busca-se importar esses profissionais do exterior. Que vergonha para os defensores daquelas ideias!
O que fazer hoje para mudar a educação superior no Brasil? Mudar as cabeças de muitos detentores de posições retrógradas e suas crenças nos antigos paradigmas educacionais que não têm mais validade. O mundo de hoje, e o Brasil em especial, precisa de muito mais profissionais de formação superior, para que eles consigam desenvolver melhor seus projetos de vida e levem o país para lugar de destaque internacional. Não é mais possível tolerar alguns Conselhos profissionais defenderem o controle do número de vagas para os cursos de medicina e outros da área da saúde, das áreas tecnológicas e das engenharias! Os cursos devem ser amplamente criados, para aqueles que querem estudar e não para serem controlados por conselhos profissionais com crenças mais conservadoras. Esses conselhos estão buscando o seu fim, podem crer!
Ainda há aqueles que são contra a Educação a Distância, como se somente pudessem estudar aqueles alunos dos grandes centros e dos cursos diurnos, sustentados ainda por seus pais.
É preciso aceitar os novos paradigmas educacionais e - principalmente - aqueles que a nova sociedade compreende hoje:
-o perfil dos atuais estudantes mudou radicalmente atualmente, eles têm visões muito diversas e globalizadas, onde o aprendizado servirá para sua inserção no mundo e não mais no seu bairro, sua cidade, seu país; -o uso das novas tecnologia da informação e comunicação estão mudando o planeta, armazenando informações, conhecimentos, encurtando distâncias, extrapolando o conceito de proximidade, enfim, alterando a essências dos processos de aprendizagem; -as instituições universitárias deverão urgente mudar radicalmente seus processos de puro ensino para o foco de promover maior aprendizagem, com ênfases em atividades reais, do cotidiano real, em função da pouca existência, hoje em dia, de estudantes passivos e apenas ouvintes e, é de fundamental importância a percepção de que o aprendizado não está mais preso a um espaço (sala de aula), a uma carga horária pré definida pelos órgãos oficiais e ao passado; -os prédios escolares, aqueles "elefantes brancos" pouco servirão quando as rotinas acadêmicas baseadas em matérias, disciplinas, currículos mínimos, semestres ou anos letivos, etc. todos artefatos da era industrial, forem mudadas pelas novas tecnologias; -a formação dos estudantes deve ter estreita relação com as necessidades das organizações, empresas, órgãos públicos e do próprio País, não mais com profissões formais, geradas por currículos mínimos definidos por conselhos profissionais. A palavra profissão provavelmente será trocada por ocupação; -uma visão fundamental é aquela que a universalização da educação superior precisará de políticas e estratégias para um ensino de massa e não de pequenos grupos. Essa educação está se tornando um direito do cidadão, de conquista socioeconômica, de indução a uma melhor qualidade de vida e de ascensão social; -o modelo atual do sistema de educação superior corre iminente perigo: programas mundiais de aprendizado on-line, recursos educacionais abertos e interativos, conteúdos internacionalizados, novos meios de comunicação inter-pares, ensejarão uma formação mais globalizada, com competitividade, com trabalhos em equipes multifuncionais e visão de resultados, de mundo e não de cidade ou país.




