Domingo Hernández Peña
Escritor, professor, consultor, Honoris Causa pela Anhembi Morumbi
***Por incrível que possa parecer, já estamos às vésperas da Copa do Mundo e nas janelas do Brasil ainda não aparecem bandeiras que possam reviver o entusiasmo de outros tempos. A ideia de perder ou não perder, de ganhar ou não ganhar, só parece importar a personagens comprados ou manipulados e a políticos irresponsáveis. A Seleção Brasileira convocada pela corrompida burocracia esportiva está formada quase na sua totalidade por jogadores que não jogam aqui – por brasileiros de nascimento que preferem viver e jogar em mundos melhores...
Nesse fato amargo poderiam encontrar-se quase todas as respostas capazes de explicar o desencanto crescente que está levando às multidões a dizer não nas ruas. Consciente ou não, o povo que está gritando, reclamando, manifestando-se, opondo-se, não está insatisfeito por casualidade. Não é casualidade, não, que o melhor da juventude brasileira, e não só no esporte, esteja indo embora...
Perguntem: alguém conhece alguma família brasileira que não tenha um filho, um parente, um amigo, um vizinho, um conhecido, morando, trabalhando, estudando, no Exterior?
A verdade é que são muitíssimos os brasileiros conscientes e qualificados que estão emigrando. E, sem aprofundar nas causas dessa verdade que ninguém estuda nem reconhece o suficiente, não é possível saber com exatidão porque há tantos grupos opondo-se à Copa, e tão poucos, ou nenhum, apoiando-a sem condições.
A sociedade brasileira de 2014 não é a mesma sociedade que cantava ou chorava, dependendo dos goles, nas Copas do passado. Hoje, para bem e para mal, a maioria dessa sociedade sabe perfeitamente que PIB e felicidade não são a mesma coisa – que a festa do futebol não tem sentido quando a mesma é colocada perante e por cima das condições de vida básicas...
Quando os melhores futebolistas brasileiros emigram, e só voltam para receber os aplausos da Seleção, estão deixando constância do difícil que é o patriotismo do ser sem estar, ou sem poder estar.
Quando os melhores universitários brasileiros vão embora, quase sempre é por um motivo principal: a descoberta de que há países onde os valores humanos são mais importantes que as capacidades produtivas e quantitativas, aqui prioritárias no Ensino Superior.
Quando multidões pacíficas se manifestam nas ruas, dizendo não à Copa envenenada, não estão traindo ninguém nem contrariando nada. Nem estão pedindo, pura e simplesmente, escolas e hospitais antes que estádios inúteis e disparatados. Estão, sobre tudo, chamando a atenção para o imenso engano de uma festa esportiva que pretende ocultar uma realidade cotidiana cada vez mais insuportável, por violenta, injusta, corrompida, desastrada e triste. Estão, em resumo, revoltando-se contra a informação analfabeta de certos canais de televisão, contra as provocações do senhor Blatter, contra a miséria moral de Edson Arantes, que considera a coisa mais natural do mundo a morte dos que trabalham pendurados na construção de estádios...




