O governo vem anunciando, como lema de sua atuação, a figura da “Pátria Educadora”, levando o cidadão a crer que, finalmente, a educação será, de fato, tema central e preponderante nas políticas públicas.
Infelizmente, parece que a noção de “Pátria Educadora” simplesmente se perdeu em algum ponto do percurso entre a propaganda institucional e a prática cotidiana, não apenas do Poder Executivo, mas de todas as esferas dos três poderes.
Temos visto toda sorte de iniciativa para aumento de custos da máquina pública, entre as quais podemos citar a concessão de auxílio moradia para magistrados e membros do Ministério Público, inclusive para aqueles que possuem residência própria no município de exercício profissional, o aumento das verbas para despesas de gabinete no Congresso Nacional, ensejando a utilização de dinheiro público para aquisição de passagens aéreas para os cônjuges dos parlamentares.
No âmbito do Poder Executivo, acompanhamentos nos últimos anos o crescimento das despesas com festas e solenidades, o aumento dos gastos secretos e suportados com os famigerados cartões corporativos, entre outras despesas injustificadas com uma máquina inchada e sabidamente ineficiente.
Mais grave que esses “equívocos” na condução das atividades de gestão pública e de destinação do dinheiro público, é o estado de manifesta penúria que aflige a educação em todo o País.
Para ficarmos apenas na esfera do sistema federal de ensino, podemos citar três exemplos que demonstram, claramente, que a figura da “Pátria Educadora” não é, e infelizmente, nunca foi, a efetiva mola mestra na condução das políticas públicas.
Apenas para ficar nos temas mais divulgados pela mídia, podemos citar as incertezas que rondam o Fies, que recebeu a imposição de uma “trava” nos procedimentos de aditamento dos contratos antigos, com o estabelecimento de um teto limite para o reajustamento das anualidades e semestralidades, tema já tratado na coluna da semana passada.
Ainda no âmbito do Fies, convém lembrar a ilegítima alteração no sistema de repasse e recompra dos títulos e as incontáveis dificuldades encontradas pelos estudantes que pretendem celebrar novos contratos com o FIES, obrigados a se sujeitar a um sistema instável, problemático e pouco confiável.
Temos, ainda, o problema do Pronatec, reiteradamente apresentado pelo Governo como o maior programa de inclusão educacional e qualificação profissional já realizado, mas que enfrenta diversos problemas, entre os quais uma reiterada inadimplência, que vem assombrando os participantes do programa desde outubro de 2014, sem qualquer solução efetiva à vista.
Esta semana, ainda, foi revelada a informação de que 1/3 (um terço) dos recursos destinados às universidades federais simplesmente serão retidos pela União, deixando essas instituições em situação de penúria financeira para o ano de 2015.
É certo que boa parte dessa penúria decorre de má qualidade na gestão da res publica, infelizmente uma característica já tradicional em nosso País, evidenciada ao verificarmos que o orçamento destinado a cada universidade pública é significativamente mais avantajado do que o montante de recursos com que os gestores privados estão acostumados a conduzir suas atividades cotidianas.
De qualquer forma, a retenção dessa verba, previamente estipulada nos orçamentos das universidades para o exercício 2015, trará grave repercussão para a condução de suas atividades durante este ano, com reflexos quase inevitáveis na qualidade dos serviços educacionais prestados a seus estudantes.
Por fim, a última medida anunciada foi o corte de 64,6% das bolsas e de mais de 34 milhões de reais do programa Jovens Talentos para Ciência, evidenciado o completo descaso do Poder Público com a educação e a formação de nossos jovens.
No entanto, nada disso é grande surpresa, muito menos o desprezo do Estado pela relevante figura da “Pátria Educadora”, haja vista que a educação destina-se, entre outras coisas, a preparar o estudante para a cidadania efetiva.
Ora, não há inimigo maior para regimes pouco afeitos ao trato democrático e com tendências autoritárias do que uma população educada, consciente e politicamente atuante.
Assim, o desprezo pela educação de qualidade, caracterizado pelo descompasso entre o discurso e a prática, é apenas mais uma ferramenta de manutenção da população em situação de ignorância e desmobilização, desprezando sua efetiva qualificação para o exercício da cidadania ativa e consciente.
A efetividade da figura da “Pátria Educadora”, portanto, deverá ser decorrência da participação e cobrança ativa de toda a sociedade, e não da espera passiva de providências efetivas por parte do poder público, a quem, inequivocamente, não interessa a existência de uma sociedade educada, consciente e mobilizada.
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