Educação Superior Comentada | Políticas, diretrizes, legislação e normas do ensino superior

Ano 1 • Nº 6 • De 19 a 25 de abril de 2011

25/04/2011 | Por: Celso Frauches | 8523

ENADE: DIRETRIZES E AÇÕES INCONSTANTES

A Lei nº 10.861, de 2004, que institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, o Sinaes, criou, em substituição ao Exame Nacional de Cursos (ENC ou provão), o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes – Enade. As regras para a oferta desse exame estão contidas no art. 5º da referida lei, transcrito a seguir:

 

Art. 5º A avaliação do desempenho dos estudantes dos cursos de graduação será realizada mediante aplicação do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes – ENADE.
§ 1º O ENADE aferirá o desempenho dos estudantes em relação aos conteúdos programáticos previstos nas diretrizes curriculares do respectivo curso de graduação, suas habilidades para ajustamento às exigências decorrentes da evolução do conhecimento e suas competências para compreender temas exteriores ao âmbito específico de sua profissão, ligados à realidade brasileira e mundial e a outras áreas do conhecimento.
§ 2º O ENADE será aplicado periodicamente, admitida a utilização de procedimentos amostrais, aos alunos de todos os cursos de graduação, ao final do primeiro e do último ano de curso.
§ 3º A periodicidade máxima de aplicação do ENADE aos estudantes de cada curso de graduação será trienal.
§ 4º A aplicação do ENADE será acompanhada de instrumento destinado a levantar o perfil dos estudantes, relevante para a compreensão de seus resultados.
§ 5º O ENADE é componente curricular obrigatório dos cursos de graduação, sendo inscrita no histórico escolar do estudante somente a sua situação regular com relação a essa obrigação, atestada pela sua efetiva participação ou, quando for o caso, dispensa oficial pelo Ministério da Educação, na forma estabelecida em regulamento.
§ 6º Será responsabilidade do dirigente da instituição de educação superior a inscrição junto ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP de todos os alunos habilitados à participação no ENADE.
§ 7º A não-inscrição de alunos habilitados para participação no ENADE, nos prazos estipulados pelo INEP, sujeitará a instituição à aplicação das sanções previstas no § 2º do art. 10, sem prejuízo do disposto no art. 12 desta Lei.
§ 8º A avaliação do desempenho dos alunos de cada curso no ENADE será expressa por meio de conceitos, ordenados em uma escala com 5 (cinco) níveis, tomando por base padrões mínimos estabelecidos por especialistas das diferentes áreas do conhecimento.
§ 9º Na divulgação dos resultados da avaliação é vedada a identificação nominal do resultado individual obtido pelo aluno examinado, que será a ele exclusivamente fornecido em documento específico, emitido pelo INEP.
§ 10. Aos estudantes de melhor desempenho no ENADE o Ministério da Educação concederá estímulo, na forma de bolsa de estudos, ou auxílio específico, ou ainda alguma outra forma de distinção com objetivo similar, destinado a favorecer a excelência e a continuidade dos estudos, em nível de graduação ou de pós-graduação, conforme estabelecido em regulamento.
§ 11. A introdução do ENADE, como um dos procedimentos de avaliação do SINAES, será efetuada gradativamente, cabendo ao Ministro de Estado da Educação determinar anualmente os cursos de graduação a cujos estudantes será aplicado.

 

A Portaria INEP nº 107/2004, que inicialmente regulamenta o Enade, estabelece, entre outros critérios, que o exame será anual, mas o mesmo curso será avaliado de três em três anos e os resultados (Conceito Enade) serão expressos numa escala de cinco níveis, passando a integrar o conjunto das dimensões avaliadas quando da avaliação dos cursos de graduação para fins de alcance dos objetivos do Sinaes.

A Portaria Normativa nº 40/2007, republicada em 29/12/2010, sem revogar expressamente a Portaria Inep nº 107/2004, regulamenta a oferta do Enade, nos novos artigos 33-D a 33-L, trazendo, entre outras novidades, o § 3º do art. 33-F, que permite aos ingressantes a substituição do Enade pelo Enem, “mediante apresentação do resultado válido”. Estabelece que o “Enade aferirá o desempenho dos estudantes em relação aos conteúdos programáticos previstos nas diretrizes curriculares do respectivo curso de graduação, e as habilidades e competências adquiridas em sua formação”. No art. 33-E dispõe que o exame “será realizado todos os anos, aplicando-se trienalmente a cada curso, de modo a abranger, com a maior amplitude possível, as formações objeto das Diretrizes Curriculares Nacionais, da legislação de regulamentação do exercício profissional e do Catálogo de Cursos Superiores de Tecnologia”. O § 1º desse artigo fixa o calendário trienal para a realização do Enade:

 

I – Bacharelados e licenciaturas:
 Ano I - saúde, ciências agrárias e áreas afins;
 Ano II - ciências exatas, licenciaturas e áreas afins;
 Ano III - ciências sociais aplicadas, ciências humanas e áreas afins.
II – Cursos superiores de tecnologia, por eixos tecnológicos:
Ano I - Ambiente e Saúde, Produção Alimentícia, Recursos Naturais, Militar e Segurança;
Ano II - Controle e Processos Industriais, Informação e Comunicação, Infra-estrutura, Produção Industrial;
Ano III - Gestão e Negócios, Apoio Escolar, Hospitalidade e Lazer, Produção Cultural e Design.

 

Até o Enade de 2008, segundo o art. 2° da citada portaria, estavam habilitados ao exame os estudantes matriculados, até a data inicial do período de inscrição, entre 7% a 22% e os que tivessem concluído, pelo menos, 80% da carga horária mínima do currículo do curso selecionado. Em 2009, a Portaria Inep nº 145/2009 alterou esse percentual para os cursos superiores de tecnologia (CST), nos seguintes termos:

 

Art. 1º ...
§ 1º Para os cursos superiores de tecnologia selecionados com carga horária mínima de até 2.000 (duas mil) horas, inclusive, estarão habilitados, para inscrição no ENADE, os estudantes do final do primeiro ano do curso que, até a data estabelecida em regulamento do Ministro de Estado da Educação, tiverem concluído entre 7% (sete por cento) e 25% (vinte e cinco por cento), inclusive, da carga horária mínima do currículo do curso da Instituição de Educação Superior (IES), e os estudantes do último ano do curso aqueles que, até a data estabelecida em regulamento do Ministro de Estado da Educação, tiverem concluído pelo menos 75% (setenta e cinco por cento) da carga horária mínima do currículo do curso da IES.

 

O § 2º do mesmo artigo, por outro lado, “considerando as diferentes opções de arranjos na disposição curricular”, estabeleceu que “todo estudante na condição de possível concluinte no ano da realização do Exame será considerado estudante habilitado do final do último ano”.

Para o Enade de 2011, a ser realizado no dia 6 de novembro, nos termos da Portaria Normativa nº 8/2011, serão considerados estudantes ingressantes aqueles que tenham iniciado o respectivo curso com matrícula no ano de realização do exame e concluintes aqueles que tenham expectativa de conclusão do curso também no ano de realização do exame, assim como aqueles que tiverem concluído mais de oitenta por cento da carga horária mínima do currículo do curso da IES.

Nos termos do art. 33-F da Portaria Normativa nº 40/2007, republicada em 29/12/2010, “os alunos ingressantes que tiverem realizado o ENEM, aplicado com metodologia que permita comparação de resultados entre edições do exame, poderão ser dispensados de realizar a prova geral do ENADE, mediante apresentação do resultado válido”.

Segundo a assessoria de Comunicação Social do MEC, estima-se que 1,2 milhão de estudantes sejam inscritos este ano e que cerca de 400 mil façam as provas.

Entre 2004 e 2010 foi avaliado o desempenho dos estudantes de 44 bacharelados e licenciaturas e de 22 cursos superiores de tecnologia. Em 2011 foi incluída a licenciatura em Artes Visuais.

O quadro seguinte demonstra os cursos inseridos no Enade, de 2004 a 2011, incluindo o genérico “Formação de Professores” (Os CST foram inseridos a partir de 2007):

Enade – 2004/2011
Bacharelados e licenciaturas

Tabela 1

Enade – 2007/2011
Cursos superiores de tecnologia (CST)

Tabela 2

A data de divulgação dos cursos cujos estudantes devem participar do Enade deveria ser feita no ano anterior à sua realização, assim como as competências, habilidades e os conteúdos a serem avaliados. Os cursos superiores de tecnologia, por exemplo, não têm diretrizes curriculares nacionais. Cada IES pode dar enfoques curriculares diferenciados, de acordo com a região e a sua missão e objetivos institucionais. Um exame nacional não pode ignorar as normas legais, a autonomia universitária e a regionalidade. A divulgação no ano anterior à realização do Enade contribuirá para que nenhum aluno, IES ou curso seja prejudicado.

O Inep, todavia, tem demonstrado falta de organização para essa programação, não havendo data certa para a publicidade do evento. É o que demonstro no quadro seguinte:

Enade – 2004/2011
Ano de realização e de divulgação dos cursos

Tabela 3

Em relação à data de divulgação dos conteúdos de formação geral e específica e as competências e habilidades a serem avaliadas, por curso e a cada ano, a situação é ainda pior.

Enade – 2004/2011
Ano de realização e de divulgação dos conteúdos a serem avaliados

Tabela 4

A data de divulgação dos resultados do Enade é também desorganizada. Um exemplo: os resultados do Enade/2009 foram publicados somente em janeiro de 2011.  Nos anos anteriores, essa divulgação era promovida ao longo do segundo semestre, sem um mês definido. Não há nenhum motivo plausível para que esses resultados sejam divulgados após os primeiros quatro meses da realização do exame.

A falta de diretrizes consistentes e de planejamento adequado refletem, ainda, no tipo de ato que fixa o elenco dos cursos e a data de realização do Enade anualmente: portaria normativa, portaria ministerial e portaria do Inep.  Afinal, qual é a autoridade competente e o tipo de ato adequado?

O Enade não é a avaliação do curso. É avaliação do desempenho do estudante. A avaliação do curso, como determina o Sinaes, é desenvolvida in loco, com instrumentos e critérios fixados pela Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes). Mas, como o MEC vem adotando o Enade como fonte de avaliação dos cursos de graduação, espera-se um mínimo de organização. Não é compreensível como o MEC vem tratando o Enade, em todas as suas fases. E nem estou questionando a metodologia do exame e nem a segurança de sua realização e apuração. Caso continue esse desleixo, o Enade poderá ficar desmoralizado perante a comunidade acadêmica e a sociedade.

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AUTONOMIA DA UNIVERSIDADE: A CONSTITUIÇÃO, A LEI E OS DECRETOS

A Constituição de 88, em seu art. 207, dispõe que “as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.

A Lei nº 9.394, de 1996, a LDB, no art. 53, diz que “no exercício de sua autonomia, são asseguradas às universidades, sem prejuízo de outras, as seguintes atribuições: I - criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e programas de educação superior previstos nesta Lei, obedecendo às normas gerais da União e, quando for o caso, do respectivo sistema de ensino; ...”. A legislação ordinária limitou à sede da universidade, o município da unidade da Federação onde está sediada, o exercício da autonomia de criar, organizar e extinguir cursos e programas de educação superior. O que a Constituição não limitou a lei ordinária o fez.

O parágrafo único do citado art. 53 dá aos colegiados de ensino e pesquisa das universidades a competência para “garantir a autonomia didático-científica das universidades”, cabendo-lhes, “dentro dos recursos orçamentários disponíveis”, as seguintes atribuições: “I - criação, expansão, modificação e extinção de cursos; II - ampliação e diminuição de vagas; III - elaboração da programação dos cursos; IV - programação das pesquisas e das atividades de extensão; V - contratação e dispensa de professores; VI - planos de carreira docente”. Esse dispositivo não limita a autonomia da universidade, apenas determina qual órgão colegiado interno é responsável pelo exercício da autonomia nos assuntos que especifica. Ignora, todavia, que a universidade não tem personalidade jurídica própria. No caso das universidades privadas, a constituição e a natureza jurídica das entidades mantenedoras estão reguladas pelo Código Civil. A contratação e dispensa de empregados – professores e técnico-administrativos – é da exclusiva competência da entidade mantenedora, constituída na forma do referido Código. Por outro lado, a criação, expansão, modificação e extinção de cursos e programas de educação superior podem gerar aumento, redução ou eliminação de receita, com reflexos na despesa e nos investimentos. O mesmo em relação às funções de pesquisa e extensão, que podem gerar receitas e despesas de custeio e investimentos. A aprovação prévia da entidade mantenedora, responsável juridicamente pela universidade, torna-se imprescindível.

A limitação da autonomia para a criação de cursos de graduação surge, por incrível que pareça, em sucessivos decretos (2.207/97, 2.306/97, 3.860/2001), desaguando no Decreto nº 5.773, de 2006, em vigor, que, com a redação dada pelo Decreto nº 6.303, de 2007, no § 2o   do art. 28, cassa a autonomia das universidades para a “criação de cursos de graduação em direito e em medicina, odontologia e psicologia”. Para a criação desses cursos as universidades dependem de autorização do ministério da Educação, com prévia manifestação da OAB (cursos de direito) e do Conselho Nacional de Saúde (CNS), para os demais cursos. A agressão à autonomia da universidade, quanto aos cursos da área da Saúde, é, aqui, autoritária, porque vem de ato do executivo, sem qualquer audiência do Poder Legislativo. Para os cursos de direito há dispositivo em lei ordinária que autoriza essa limitação, embora em conflito com o art. 207 da Constituição. A autonomia universitária para a criação de cursos e ampliação de vagas é, ainda, limitada à sede ou município-sede. Nos câmpus ou nas unidades fora de sede, pelo Decreto nº 5.773, de 2006, a universidade perde essa autonomia. As autoridades do MEC parecem ignorar o conceito e o significado de universidade. Alguns mais afoitos argumentam que autonomia não é soberania. Mas, isto, qualquer rábula sabe. Não se trata da universidade dos tempos medievais.

A autonomia constitucional de organização e gestão administrativa está limitada ao cumprimento da Lei nº 9.192, de 1995, com as alterações introduzidas pela Lei nº 9.640, de 1998, que altera dispositivos da Lei nº 5.540, de 1968, regulamentando o processo de escolha dos dirigentes universitários, recepcionada pela Lei nº 9.394, de 1996. Na realidade, essa lei é destinada à escolha dos reitores, vice-reitores e diretores de instituições federais de educação superior (IFES). Para as instituições de ensino superior privadas é estabelecido que “os dirigentes de universidades ou estabelecimentos isolados particulares serão escolhidos na forma dos respectivos estatutos e regimentos”.

Os estatutos das universidades, todavia, estão sujeitos à deliberação da Câmara de Educação Superior (CES) do Conselho Nacional de Educação (CNE), cujos pareceres dependem de homologação do ministro da Educação. Ou seja, não há autonomia da universidade para organizar a sua estrutura acadêmico-administrativa e o processo de gestão. É o que determina a Lei nº 9.131, de 1995, que altera dispositivos da Lei nº 4.024, de 1961, também recepcionada pela Lei nº 9.394, de 1996. A redação da alínea “f”, § 2º, art. 9º da citada Lei nº 4.024, de 1961, foi alterada, posteriormente, pelo art. 20 da Medida Provisória nº 2.216-37, de 2001, aprovada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001. Determina que seja atribuição da CES/CNE, entre outras, “deliberar sobre o credenciamento e o recredenciamento periódico de universidades e centros universitários, com base em relatórios e avaliações apresentados pelo Ministério da Educação, bem assim sobre seus respectivos estatutos” (grifei). Mais uma vez a autonomia constitucional das universidades é limitada por uma lei ordinária. A agressão é mais violenta quando a CES/CNE, mediante o Parecer nº 282/2002, aprova normas gerais para análise e aprovação de estatutos de universidades. Essas normas não são “gerais”, são limitadoras ao exercício da autonomia das universidades, à sua organização científica, acadêmica e administrativa.

A autonomia de gestão financeira e patrimonial, para as universidades públicas, está limitada aos respectivos orçamentos aprovados na forma prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Para as universidades privadas, a gestão financeira e patrimonial é exercida na forma dos estatutos, contrato social ou outros instrumentos legais de constituição das entidades mantenedoras, de acordo com o Código Civil. Trata-se, é conveniente registrar, de autonomia para o exercício da “gestão financeira e patrimonial” (grifei). A universidade não tem autonomia e nem competência legal para arrecadar as receitas oriundas de seus serviços, gerar despesas e nem adquirir, alienar ou onerar os bens patrimoniais que lhe são cedidos pela mantenedora. Somente esta possui personalidade jurídica para essas ações. À universidade, pública ou privada, cabe somente a gestão financeira dos recursos que lhe são repassados, conforme orçamento aprovado pelo Poder Público ou pela mantenedora, de acordo com a sua natureza jurídica.

A autonomia universitária está submissa, ainda, ao art. 206 da Constituição, que reza:

 

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
VII - garantia de padrão de qualidade.
VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

 

A universidade mantida pela livre iniciativa, segundo o art. 209 da Constituição, deve atender ao “cumprimento das normas gerais da educação nacional” e à “autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público”. Não há soberania, mas a autonomia consagrada pelo art. 207 da Constituição deve ser respeitada.

Nenhum dos dispositivos constitucionais remete para qualquer lei – complementar ou ordinária – a regulação da autonomia universitária. Leis e decretos não podem limitar o que a Constituição não o fez. E muito menos portarias, como a Portaria Normativa nº 40/2007, republicada em 29/12/2010.

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EXTRAORDINÁRIO APROVEITAMENTO DE ESTUDOS

O art. 47, da Lei nº 9.394, de 1996, a LDB, em seu § 2º dispõe que:

 

Art. 47. ...
§ 1º ...
§ 2º Os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca   examinadora  especial,  poderão  ter  abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino.

 

Trata-se de saudável inovação. A legislação anterior não permitia tal procedimento. Cabe a cada IES regulamentar o processo de aceleração da aprendizagem, objeto do citado §2º do art. 47 da LDB, para que o aluno, com “extraordinário aproveitamento nos estudos”, possa abreviar o prazo de integralização curricular.

O Parecer CES/CNE nº 60/2007, homologado em despacho publicado no DOU de 27/8/2007, em resposta à consulta da PUC-MG, estabelece normas gerais para a aplicação do citado § 2º do art. 47 da LDB.

O parecer reconhece que:

 

Os fundamentos contidos no referido dispositivo (o § 2º do art. 47 da LDB) são dois: (i) a afirmação de que os percursos formativos devem ser dotados de flexibilidade e (ii) o reconhecimento de que existem estudantes cujo aproveitamento é extraordinário. Para esses estudantes, a flexibilidade é representada pela possibilidade de abreviação da duração dos estudos, com a condição de que o extraordinário aproveitamento deve ser demonstrado por meio de instrumentos de avaliação específicos.

 

Diz mais, o referido parecer, que:

 

A demonstração exigida é um ato acadêmico por excelência. A avaliação por banca examinadora especial deve assegurar o caráter não corriqueiro da condição a ser avaliada. A autonomia didático-científica das Instituições de Educação Superior deve valer, no que se refere à liberdade para ensinar e aplicar exames e avaliações, para todas as categorias institucionais, não havendo benefício na fixação de regulamento para esses fins. O caráter de excepcionalidade da previsão do artigo 47, § 2º, leva à mesma conclusão. Naturalmente, a contrapartida a essa autonomia é a observância, por parte das Instituições, da aplicação da norma do artigo em tela aos casos realmente extraordinários, assim como o de documentar os procedimentos utilizados em cada caso junto aos demais registros acadêmicos, de modo a permitir a sua verificação em procedimentos de avaliação. De outro lado, caberia aos organismos do Ministério da Educação responsáveis pelas avaliações dos cursos de graduação incluir essa verificação, de modo a coibir o eventual uso impróprio da abreviação de estudos.

 

O parecer responde objetivamente às questões levantadas na consulta da seguinte forma:

 

a – O texto do artigo 47, § 2º, da LDB exige que os procedimentos adotados pelas Instituições de Educação Superior para a sua aplicação devem estar em acordo com as normas de cada sistema de ensino. Portanto, a regulamentação não é obrigatória, e a autonomia didático-científica das Universidades e das demais Instituições de Educação Superior pode ser invocada para aplicar diretamente esse dispositivo.
b – Os cursos de graduação tecnológica têm o aproveitamento de competências profissionais adquiridas em cursos regulares e no trabalho reguladas pela Resolução CNE/CP no 3/2002. Quanto à aplicação do previsto pelo artigo 47, § 2º, da LDB, vale para esses cursos a mesma recomendação acima.
c – Em vista dos argumentos acima, a Câmara de Educação Superior decide, por meio do presente parecer, não expedir regulamentação, mas apenas estabelecer um conjunto de recomendações às Instituições de Educação Superior e à Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação no sentido de reconhecer a autonomia das Instituições para a aplicação do mencionado dispositivo e de prevenir o seu uso impróprio.
d – Os Sistemas de Ensino podem expedir regulamentação para a matéria no âmbito de suas competências, mas não há obrigatoriedade para isso.

 

O Voto do Relator conclui recomendando:

 

1. às Instituições de Educação superior a observância da aplicação da norma do artigo 47, § 2º, da Lei nº 9394/1996 aos casos realmente extraordinários, além da documentação dos procedimentos utilizados em cada caso junto aos demais registros acadêmicos, de modo a permitir a sua verificação em procedimentos de avaliação;
2. à Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação as providências para incluir essa verificação nos procedimentos de avaliação dos cursos de graduação.

 

Cada sistema de ensino – o federal, os estaduais e o do Distrito Federal – pode, portanto, adotar critérios diferenciados. O sistema federal de ensino optou por não regulamentar a matéria, mas “estabelecer um conjunto de recomendações” às IES, consubstanciadas no citado Parecer CNE/CES nº 60/2007. De acordo com esse parecer, cada IES, por seu colegiado competente, definido no estatuto, regimento geral ou regimento, deve fixar as normas internas para o processo de extraordinário aproveitamento de estudos, regulamentando a aplicação do § 2º do art. 47, da Lei nº 9.394, de 1996, mediante deliberação específica. Essa deliberação deve, contudo, atender à recomendação “da aplicação da norma do artigo 47, § 2º, da Lei nº 9394/1996 aos casos realmente extraordinários, além da documentação dos procedimentos utilizados em cada caso junto aos demais registros acadêmicos, de modo a permitir a sua verificação em procedimentos de avaliação”.