Educação Superior Comentada | Políticas, diretrizes, legislação e normas do ensino superior

Ano 2 • Nº 61 • 12 a 18 de junho de 2012

18/06/2012 | Por: Celso Frauches | 3054

CONGRESSO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR: VÁRIOS OLHARES

Terminou no último sábado (16/6), em Natal (RN), o V Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular (Cbesp), promovido pelo Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, constituído pela Associação Brasileira de Mantenedores do Ensino Superior (ABMES), Associação Nacional de Universidades Particulares (Anup), Associação Brasileira das Faculdades Isoladas e Integradas (Abrafi), Associação Nacional dos Centros Universitários (Anaceu), Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep) e pelo Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp). O encontro contou com a presença de representantes de centenas de instituições de ensino superior (IES) particulares de todo país. O evento foi sediado no Serhs Natal Grand Hotel.

A abertura ocorreu em solenidade realizada a partir das 19h. Deveria fazer a conferência magna – Os desafios da educação no Brasil – o ministro da Educação, Aloízio Mercadante, o que não aconteceu. Em seu lugar falou o secretário de Educação Superior, Amaro Henrique Pessoa Lins, que não trouxe nenhuma novidade para os participantes do evento. O professor Gabriel Mario Rodrigues, em nome do Fórum, apresentou interessante proposta para as IES privadas: transformar alunos da graduação em tutores em língua portuguesa e matemática de estudantes da rede pública da educação básica, numa tentativa de melhoria das condições do ensino público.

A sessão matinal da sexta-feira (15/6) foi movimentada com a apresentação do professor José Cordeiro, da Singularity University, a “universidade do futuro”, sob o tema Os grandes desafios do ensino superior no futuro próximo: como se preparar para superá-los? O professor Cordeiro deu um show em sua apresentação, mostrando os avanços tecnológicos das últimas décadas e uma visão do futuro, até 2045. Dois pontos ficaram cristalinos para os participantes do Congresso: o capital humano é cada vez mais importante e os avanços tecnológicos evidenciados para as próximas décadas mostram um descompasso gigantesco entre as metodologias do ensino superior e as possibilidades de uso dessas tecnologias nos processos de aprendizagem. Ficou evidente, ainda, a impossibilidade desses avanços num país como o Brasil, onde o Ministério da Educação é um agente do retrocesso, com diretrizes curriculares do século dezenove e normas regulatórias da idade média. Superar a mastodôntica estrutura e mentalidade do MEC será o desafio para os próximos milênios. Para as IES particulares e públicas.

A palestra seguinte, do professor Marcos Formiga, da UNB, embora sem o mesmo brilhantismo da anterior, aprofundou, ainda mais, o fosso cada vez maior entre as necessidades de avanços na educação superior brasileira e as posturas retrógradas do MEC. O professor Formiga falou sobre as necessidades de busca de talentos, sem preocupação com a titulação em mestrados ou doutorados, a duração longa dos cursos de graduação, na contramão da história, formas conservadoras de acesso (vestibulares), a insegurança jurídica e a pirâmide invertida nas políticas do MEC: elevado investimento em formação em mestrados e doutorados e baixos investimentos na educação básica. Falou sobre desafios simples para a melhoria do processo de aprendizagem, como o uso menos intenso da sala de aula, a aprendizagem mista – presencial e online –, inovação e criatividade. A palestra tornou mais evidente o fosso entre a modernidade e o MEC. As avaliações do MEC ainda estão presas a quantidades: metragem da sala de aula, relação aluno por metro quadro de sala de aula ou laboratório, quantidade de livros na biblioteca, mesmo nos polos de educação a distância, quantidade de doutores em cursos de graduação, até nos cursos superiores de tecnologia e outras barbaridades. Qualidade da educação para o MEC está na fita métrica. Os instrumentos de medição de qualidade da educação superior, adotados pelo MEC, estão completamente ultrapassados, mas essa realidade não é sentida pelos gestores que vivem na “ilha da fantasia”.

A sessão da tarde teve como ponto relevante Os desafios do aperfeiçoamento do atual modelo de avaliação do ensino superior, com a participação dos professores Renato Hyuda de Luna Pedrosa, da Unicamp; Maurício Garcia, vice-presidente da Devry Brasil, e Cláudia Griboski, do Inep, tendo como debatedora a professora Marcia Regina Brito, da Unicamp. A exposição do professor Pedrosa desnudou os erros e desacertos do atual processo avaliativo adotado pelo MEC, desprezando a Lei do Sinaes. A professora Claudia apenas repetiu o que o Inep entende como indicadores que avaliam a qualidade de IES e cursos, como os marginais IGC e CPC. Afirmou que as IES lutam contra o IGC e o CPC insatisfatórios porque não querem a “visita in loco” (sic).

A avaliação in loco não é contestada. O que se contesta é o uso de indicadores preliminares, como os marginais IGC e CPC, para aplicar penalidades prévias, como as chamadas “medidas cautelares”, pelas quais são suspensas autonomias universitárias, reduzidas vagas iniciais dos cursos e suspensos vestibulares ou processos seletivos, quando essas medidas somente poderiam ser aplicadas após o cumprimento dos rituais previstos no art. 46 da Lei nº 9.394, de 1996 (LDB) e art. 10 da Lei nº 10.861, de 2004 (Sinaes). Identificada alguma deficiência por esses indicadores marginais, o MEC deve determinar a avaliação in loco. Confirmadas as deficiências, o MEC deve determinar a assinatura de um protocolo de compromisso, para o saneamento das mesmas, no prazo máximo de um ano. Concluído esse prazo, o MEC deve realizar nova avaliação. Caso as deficiências não tenham sido saneadas, o MEC deve abrir processo administrativo que pode, até, concluir pelo descredenciamento da IES ou pelo fechamento do curso. Nada disso é feito, todavia.

A fala do professor Maurício Garcia, como sempre, foi precisa. Identificou, como um experiente cirurgião da educação superior brasileira, os pontos falhos do atual processo de avaliação da educação superior, adotado pelo MEC, que necessitam de ser extirpados definitivamente, para a saúde plena das IES e o cumprimento do Sinaes.

A professora Márcia Britto também identificou os pontos fracos do atual sistema do MEC para a avaliação de IES e de cursos, como já o havia feito no seminário promovido pela ABMES, em março findo.

O sábado (16/6) trouxe ao debate O desafio de alcançar 10 milhões de alunos no ensino superior ao final de 2014, com a participação dos representantes do MEC, professor Francisco das Chagas e a professora Priscila (ProUni/Fies), e o Carlos Monteiro, da CM Consultoria, de Marília (SP). Os representantes do MEC apenas repetiram dados estatísticos do ProUni e do Fies, sem apresentarem qualquer estratégia inovadora para o alcance das metas previstas no Plano Nacional de Educação 2011/2020 (PNE), ainda em debate no Congresso Nacional. O professor Monteiro, com a competência de sempre, reafirmou o que já havia dito no IV Congresso, realizado em Salvador (BA), no ano passado: basta eliminar ou reduzir drasticamente a evasão escolar e ampliar o leque de abrangência do Fies e do ProUni para que, em 2014, tenhamos mais de dez milhões de alunos na educação superior.

Ainda na parte da manhã de sábado, assistimos à apresentação do professor Naomar de Almeida Filho, ex-reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e um entusiasta da aplicação, no Brasil, do Tratado de Bolonha. O professor Naomar falou brevemente sobre sua experiência na UFBA e fez longa exposição sobre o projeto da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSC), uma universidade multicampi, que está coordenando. O projeto é uma cópia, adaptada, do Tratado de Bolonha, com bacharelados por área de conhecimento, mestrado profissional e acadêmico e doutorado profissional e acadêmico. O projeto é possível em universidades federais, que não são subordinadas aos rígidos controles do MEC, mas impraticável nas IES privadas, tendo em vista os controles estatais e os atuais atos normativos de regulação. Projetos similares ao previsto no Tratado de Bolonha, para serem aplicados no Brasil, deverão provocar, previamente, uma revisão completa da legislação que regula as profissões que exigem formação superior e das corporações profissionais, a começar pela OAB, e pela desconstrução das atuais diretrizes curriculares, verdadeiros currículos mínimos disfarçados em nova nomenclatura. Por outro lado, creio que tais projetos somente poderão ser pensados – nem falo em efetivados –, quando o professor Namoar for nomeado ministro da Educação.

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CARTA DE NATAL

O V Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular foi encerrado na final da manhã de sábado, 16, com a aprovação da Carta de Natal, considerando as reflexões, debates e conclusões nele realizados, expressando os seguintes compromissos e expectativas:

- necessidade da realização de um estudo com cenários alternativos sobre o ensino superior no Brasil de hoje até 2020 e as respectivas providências em termos de políticas públicas para que se alcance a expansão das matrículas com ensino de qualidade em níveis compatíveis com as aspirações do povo brasileiro e com justiça social;

- desenvolvimento de um trabalho intenso para que o país possa ter os profissionais com nível de formação compatível com a demanda do mercado de trabalho, em especial na área das ciências, tecnologias e  engenharias;

- apoiar a formação dos estudantes do ensino médio mediante ações e atividades que os ajudem a superar obstáculos tais como dificuldades na adaptação ao ensino, no aprendizado da matemática e do português e a evasão precoce;

- contribuir de maneira decisiva para o aperfeiçoamento do atual modelo de avaliação do ensino superior;

- diligenciar para estabelecer alternativas de parcerias com entidades educacionais do exterior buscando alcançar melhores níveis de excelência no contexto do ensino de graduação e pós-graduação;

- apoiar e colaborar com medidas governamentais que envolvam a utilização dos mecanismos do ProUni e do Fies tendo em vista promover a inclusão maciça de jovens das classes C, D e E no ensino superior;

- estimular a implantação de novas alternativas na estrutura curricular no nível de graduação que levem ao aperfeiçoamento do ensino na direção da formação interdisciplinar, multiprofissional e profissionalizante;

- intensificar a utilização de modernas ferramentas de natureza tecnológica que impactam no processo de ensino-aprendizagem;

- atuar de forma intensa para que o país alcance a meta de 10 milhões de alunos no nível de graduação o mais rapidamente possível.

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