Educação Superior Comentada | Políticas, diretrizes, legislação e normas do ensino superior

Ano 1 • Nº 5 • De 26 de março a 1º de abril de 2013

A Coluna desta semana analisa a polêmica acerca da suspensão das autorizações de funcionamento de cursos de Direito.

01/04/2013 | Por: Gustavo Fagundes | 3304

SUSPENSÃO DAS AUTORIZAÇÕES DE FUNCIONAMENTO DE CURSOS DE DIREITO


Não é surpresa para aqueles que atuam no segmento da educação superior privada o fato de que qualquer espasmo emanado da Comissão Nacional de Educação Jurídica da Ordem dos Advogados do Brasil tem o condão de gerar uma repercussão no Ministério da Educação com reflexos para as instituições que oferecem ou pretendem oferecer curso de Direito.

Felizmente, pelo menos até recentemente, o MEC, embora sensível à postura da OAB, que parece confundir curso de Direito com curso de Advocacia, sempre manteve preservada a sua autoridade para decidir os processos relativos aos referidos cursos, entendendo claramente que a participação da OAB nos processos relativos aos cursos jurídicos, conforme expressamente contido no inciso XV do artigo 54 do Estatuto da OAB e da Advocacia – Lei nº 8.906/94

“Art. 54. Compete ao Conselho Federal:

XV – colaborar com o aperfeiçoamento dos cursos jurídicos, e opinar, previamente, nos pedidos apresentados aos órgãos competentes para criação, reconhecimento ou credenciamento desses cursos;”. (grifamos)

A competência do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por intermédio de sua Comissão Nacional de Educação Jurídica, portanto, é “opinar” nos processos de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos jurídicos, e não decidir tais processos.

Opinar, na lição do léxico, significa “emitir opinião; expor o que se pensa” , não se confundindo, de forma alguma, com o vocábulo “decidir”, este sim, com significado de “deliberar, julgar, sentenciar”.

O papel da OAB, portanto, é de emitir sua opinião, incumbindo ao MEC a tarefa de deliberar, deferindo ou indeferindo a solicitação formulada pela instituição de ensino superior relativa ao pedido de autorização de funcionamento, de reconhecimento ou de renovação de reconhecimento de cursos de Direito.

Não é de hoje, portanto, que a OAB vem buscando atribuir a si própria uma competência que em muito extrapola aquela que lhe é concedida em lei nos processos de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos jurídicos.

Poderíamos, inclusive, apontar diversas contradições na atuação da Comissão Nacional de Educação Jurídica da OAB, principalmente no que pertine à situação do corpo docente dos cursos de Direito propostos, mas entendemos não ser este o momento adequado para este debate.

O certo é que, nos últimos tempos, temos assistido à crescente pressão da OAB sobre o MEC em relação à concessão de autorização de funcionamento e de reconhecimento dos cursos jurídicos existentes no País.

Evidentemente, a missão de buscar a qualidade na educação superior, e não apenas nos cursos de Direito, deve ser uma constante na atuação de todos aqueles que estão envolvidos na área educacional, pois é certo que muitos dos cursos atualmente oferecidos deixam a desejar em termos de qualidade, não apenas no campo dos cursos jurídicos.

Outro aspecto que merece destaque é o fato de não serem os cursos de Direito destinados exclusivamente à formação de advogados, o que parece não estar sendo levado em conta na discussão travada pela OAB. Não são autorizados cursos de Advocacia, mas sim cursos de Direito, sendo certo que, entre as diversas atividades profissionais a serem exercidas pelo bacharel, encontra-se a advocacia.

E, lembrando que a atribuição de decidir os processos de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento é exclusiva do MEC, cumpre também lembrar que todo o processo de avaliação destinado à obtenção dos referidos atos autorizativos é lastreado, precipuamente, em aplicação de critérios de avaliação definidos pelo próprio Ministério, mediante aplicação do instrumento de avaliação elaborado pelo INEP e aprovado pela CONAES.

Em suma, as instituições de ensino superior nada mais fazem do que cumprir, à risca, a regra estabelecida pelo próprio Ministério da Educação para fins de aferição da qualidade dos cursos de Direito pretendidos ou já ofertados!

Vale dizer, todos os processos de Direito cuja emissão da portaria de autorização está suspensa pelo Ministério da Educação passaram pelo crivo avaliativo dos órgãos do sistema federal de ensino, tendo, portanto, atendido aos critérios de qualidade estipulados pelo MEC.

Se assim não fosse, bastaria ao MEC indeferir o pedido de autorização formulado, com base no desatendimento aos critérios de qualidade vigentes, em conformidade com a Lei do SINAES.

As regras para autorização de funcionamento de cursos superiores não foram criadas pelo livre arbítrio das instituições que pleitearam autorização para oferta de novos cursos de Direito, as quais se limitaram, exclusivamente, a seguir as regras vigentes e atender aos critérios de qualidade estabelecidos pelo Ministério da Educação, não sendo legítimo, portanto, serem sancionadas pelo acatamento ao ordenamento jurídico vigente.

Suspender esses processos depois de vencidas todas as etapas do devido processo legal, inclusive com obtenção de conceitos satisfatórios no processo avaliativo realizado com fulcro no instrumento de avaliação aprovado pela CONAES é, no mínimo, desrespeito aos princípios constitucionais mais elementares, sobretudo se a justificativa para essa suspensão, como afirmado pelo titular da pasta ministerial é a estipulação de novos critérios de avaliação.

Ora, novos critérios somente poderiam ser aplicados a novos processos, pois permitir a aplicação retroativa de critérios avaliativos a processos já ultimados e aguardando apenas decisão final é conduta visivelmente antijurídica e antidemocrática.

Evidentemente, os processos de autorização de funcionamento de cursos de Direito que já superaram a fase de avaliação in loco, com obtenção de conceitos favoráveis, devem ser decididos com base na instrução processual já realizada, não sendo lógico ou admissível que sejam afetados por modificações futuras nos critérios de avaliação.

Permitir a adoção desta postura equivale e permitir a retroatividade das normas e a revogação do princípio do devido processo legal, porquanto permite simplesmente desconsiderar todo o contexto probatório já produzido, com o atendimento aos critérios de qualidade estabelecidos pelo Ministério da Educação, penalizando injustamente as instituições que, com muita seriedade e competência, demonstraram cumprir os padrões de qualidade contidos no instrumento de avaliação aprovado pela CONAES.

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