O ensino superior brasileiro corresponde à realidade do século 21? Debater essa questão é a proposta do 10º Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular (CBESP), que começou nesta quinta-feira (25) e segue até sábado (27) no Hotel Master em Gramado (RS). O tema deste ano — inovação e sustentabilidade na educação superior no século 21 — será analisado de perto por reitores, mantenedoras, gestores e educadores por meio de uma série de painéis e palestras ministrados por especialistas em educação e avanços tecnológicos. Estão presentes no evento representantes da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), da Associação Brasileira das Mantenedoras das Faculdades (Abrafi) e da Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen).
A abertura do CBESP, na noite desta quinta-feira, foi feita pelo pronunciamento do diretor presidente da ABMES e presidente do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular José Janguiê Bezerra Diniz, que agradeceu a contribuição dos que, nos últimos anos, têm se comprometido com a educação no Brasil e proclamou a continuidade dos desafios. “Nestes três dias, queremos discutir com profundidade as inovações e as atualizações de mercado, vinculadas ao futuro das IES (Instituições de Ensino Superior), sempre com foco no desenvolvimento do aluno e do Brasil”, diz.
A seriedade no tom do presidente da ABMES aumentou quando ele falou sobre as dificuldades no ensino superior enfrentadas atualmente. José chamou a atenção para o abismo entre a graduação superior e a formação no ensino médio de alunos de baixa renda, revelado pela pesquisa Processo decisório para o acesso à educação superior feita pela ABMES. “Foram entrevistados 1,2 mil alunos e recém-formados do ensino médio e pais, que afirmaram que a motivação financeira é a maior barreira para não ingressam no ensino superior. Apenas 62% revelam desejo de fazer faculdade logo após concluir o ensino médio, mas 70% confirmam que não se graduarão por não ter recursos financeiros”, declara.
“Dessa forma, o Brasil ainda está longe de atingir a meta do Plano Nacional de Educação que estabelece que o país alcance, até 2024, pelo menos 33% da população matriculada no ensino superior. Até o momento, o número é de apenas 17%. Essa é uma demonstração clara da necessidade da expansão de vagas nas instituições de ensino superior e de mais investimentos em programas de bolsa de estudo e financiamento estudantil”, afirma. As instituições de ensino superior são apontadas como chave de mudança para o cenário. “Vamos aproveitar a presença dos maiores atores da área educacional para nos comprometer com o futuro do país. Numa nação em que a educação não tem o destaque que merece ter, nós, mantenedoras das IES particulares, sabemos que só o ensino pode mudar essa cultura de que as mudanças vêm pelo jeitinho e por tirar vantagem”, reforça. “A educação muda a cabeça, histórias e destinos e, com certeza, mudará vidas. Nossas instituições são espaços qualificados para formar o jovem para o mercado de trabalho, mas também ajudá-lo na formação do seu caráter”, conclui.
O secretário de Estado de Educação do Rio Grande do Sul, Ronald Krummenauer, também esteve presente na abertura e analisou que há urgência do avanço da educação no país. “Há 50 anos, o nível de analfabetismo era muito grande e o Brasil conseguiu revolucionar esse quadro. Mas o fato é que hoje temos uma escola no modelo do século 19, com professores formados no século 20 e com alunos de uma nova geração que sai das escolas de ensino médio formados como no passado”, diz. “O atraso na educação é culpa de toda a sociedade. Nós, de alguma maneira, deixamos isso ocorrer e precisamos fazer o caminho de volta. O poder público pecou em não ter dado a importância devida para a qualidade de educação. Para reverter o caso, é preciso que parcerias com as IES particulares sejam feitas, de forma que demos uma guinada no desenvolvimento do país e na formação dos estudantes”, pontua. Ronald abordou as restrições no investimento na área no RS — dos 9 bilhões destinados à educação, 8 bilhões são usados para cobrir a folha de pagamento. “Espero que olhem com carinho a necessidade do estado, não só financeiramente, mas com novos modelos de ensino e educação. Se falharmos na formação dos alunos, falhamos como nação. Precisamos, juntos, agir para voltar a desenvolver o país”, conclui.
Demandas atuais
A doutora em educação pela Universidade de Sevilla Ana Elena Schalk ministrou a conferência de abertura do evento, A educação superior e as demandas do século 21: uma perspectiva mundial. Ana deixou claro o erro das IES: pensar em formar profissionais somente para o Brasil. “Que tipo de profissionais formam e para onde? Se acharem que entregam trabalhadores para o Brasil, se enganam. As IES capacitam pessoas para o mundo inteiro e é preciso fazer com que os estudantes tenham uma visão de mundo e uma vivência atual para que não estejam ultrapassados daqui um tempo. É preciso prepará-los e formá-los para que sejam capazes de competir no mundo global”, pontua.
Ana Elena deu exemplos de mudanças inovadoras internacionais. “Algumas universidades dão o poder de escolha do estudante quanto ao tempo de graduação e o certificado que terá, como por exemplo a Universidade de São Francisco. Outras faculdades dividem o campus com indústrias para que os estudantes tenham a prática do que aprendem”, afirma. “Há ainda os Bootcamps, modalidade em que se oferece cursos de curta duração que visam exclusivamente capacitar profissionais para as necessidades do mercado. Na França, esse modelo não tem professores. Algo que parecia impossível, mas que é realidade”, diz.
Segundo a chilena, as instituições de ensino adequadas ao século priorizam a inovação e ficam alertas às necessidades do mundo. Tais IES conseguiram chegar nesse patamar seguindo alguns passos: adotaram componentes tecnológicos que superaram barreira e espaço, democratizando o ensino; desenharam mecanismos tecnológicos que permitam obter dados para criar novos modelos de ensino, a partir de um grupo formado por competências interdisciplinares, que pensavam constantemente nas atualizações do ensino e designaram equipes que monitoram as novas profissões surgidas por meio do avanço da inovação.
“O processo não é fácil, mas é necessário. O futuro é brilhante, mas nós, universidades, não estamos preparadas para enfrentá-lo como estamos”, sentencia. “Reinventar-se sem perder a estabilidade no processo é a missão dos líderes. Somos muitos mais que reitores ou participantes da diretoria, somos um núcleo de ativação destas mudanças. As universidades do século 21 sonharam e se empenharam para mudar e, com esforço, tal avanço educacional também é possível na América Latina”, conclui.