Depois de 15 anos cursando História sem se formar, uma aluna da Universidade Federal do Amapá perdeu na Justiça e teve que aceitar seu desligamento do curso. O caso noticiado na semana passada é extremo, mas não tão descolado da realidade brasileira: um número elevado de aprovados no vestibular acaba deixando a faculdade sem se formar.
Segundo os dados mais recentes do Ministério da Educação, 49% dos alunos que entraram na universidade em 2010 haviam deixado seus cursos quatro anos depois. O índice de abandono foi de 52,7% nas universidades particulares e de 42,6% nas públicas.
O problema tem dois aspectos graves: o primeiro é o custo financeiro. Cada aluno que abandona a universidade pública (ou particular com financiamento público) gera desperdício de recursos para o Tesouro.
O outro aspecto é social: o abandono do ensino superior tem como consequência a falta de profissionais qualificados em muitas áreas, e pode atrasar a entrada de jovens no mercado de trabalho.
O ministro da Educação, Mendonça Filho, defende que a reforma do Ensino Médio tende a amenizar o problema, já que prevê a orientação profissional para alunos nos anos finais da escola. Mas, se a medida pode ajudar a resolver parte do problema – o desencanto de estudantes com o curso escolhido – nada faria para resolver outros dois: o despreparo educacional e a falta de recursos financeiros.
“Não adianta nada eu incluir uma orientação de carreira e o aluno decidir que de fato quer fazer engenharia, por exemplo. Se ele não tiver a base de matemática ou física, ele não vai continuar”, diz o professor Oscar Hipólito, diretor acadêmico da rede de universidades Laureate no Brasil.
Hipólito sabe o que diz. Como professor de Física, um dos cursos com maior evasão, ele sempre notou a dificuldade dos alunos em compreender as matérias. Decidiu, então, medir por conta própria os custos da evasão no país: somente os recursos públicos desperdiçados pelas universidades federais e as mensalidades que deixam de ser pagas nas particulares chegam a R$1,5 bilhão por ano.
A conta não inclui outras consequências negativas do abandono, como a falta de profissionais em determinadas áreas (especialmente nas ciências exatas).
Para o professor, o despreparo do aluno – em grande medida consequência da má qualidade do ensino básico – é a principal explicação para a alta evasão no ensino superior.
Crise econômica
Mas o terceiro motivo da evasão, o financeiro, parece estar em alta.
O coordenador de Educação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Paulo Corbucci, acredita que esta hipótese é a que tem mais levado alunos a deixar seus cursos.
Com a crise orçamentária, o Fies (programa federal de financiamento para alunos de universidades particulares) perdeu 50% dos novos alunos entre 2014 e 2015, ainda durante a gestão Dilma, e teve um anúncio de corte de 29% nos recursos neste ano, já durante a gestão Temer.
O número de pessoas que ingressaram no ensino superior também caiu 2.6% nas universidades públicas e 6,9% nas particulares entre 2014 e 2015, mesmo com o crescimento vegetativo da população.
O diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Solon Caldas, diz que a redução no financiamento estudantil teve impacto direto nos índices de evasão, o que levou algumas instituições a flexibilizar os métodos de pagamento. “Muitas delas estão aceitando uma parte de pagamento durante o curso e outra parte depois da formatura, sem juros”, diz.
Outro fator ajuda a explicar o cenário atual, complementa Solon. “Os jovens das classes A e B normalmente vão estudar na universidade pública e o estudante que precisa trabalhar durante o dia é que vai para a instituição privada. O cenário de crise, com o desemprego, dificulta a possibildade de acesso”, afirma.
A meta do Brasil é atingir 34% da população entre 18 e 24 anos na universidade até 2020. Atualmente, este número está abaixo dos 20%. O governo costuma centrar esforços no aumento do número de ingressantes. Reduzir a evasão, entretanto, pode ser a forma mais eficiente de chegar mais perto da meta.