Com a queda do número de estudantes presenciais no ensino superior, a educação a distância (EAD) é o que faz a taxa de novos alunos permanecer estagnada nos últimos três anos nas instituições privadas. Os dados são do Censo da Educação Superior, divulgado ontem pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O atual momento da economia e a diminuição do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) são apontados como dois dos motivos para este novo cenário.
— A percepção clara é de que a crise econômica afeta a disposição do jovem em ingressar no curso superior. A família empurra o jovem para o mercado — afirmou Mendonça Filho, ministro da Educação.
O censo mostra que o número de ingressos neste segmento saltou de pouco menos de dois milhões por ano, em 2006, para cerca de três milhões em 2014 — para estagnar nos dois anos seguintes. A matrícula também apresentou o mesmo fenômeno: depois de um percentual de crescimento de 5%, amargou 0,2% em 2016.
— A gente percebe o reflexo da diminuição do Fies nesse processo de matrículas de 2015 para 2016. Isso está latente nesses números. Em 2014, tivemos cerca de 730 mil contratos, depois houve uma diminuição drástica tanto por conta da queda no número de vagas, quanto pela crise e pelo desemprego. A falta de uma política pública eficaz de financiamento reflete nessa desaceleração nas matrículas — afirma Sólon Caldas, diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES).
Em 2014, segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o Fies firmou 732.682 contratos. No ano seguinte, o número de contratos caiu para 287.455. No primeiro semestre de 2017, a quantidade foi ainda menor, ficando em 115.445 contratos.
No início de julho, o governo federal anunciou mudanças no programa: a partir de 2018, a iniciativa terá 300 mil vagas, sendo 100 mil a juros zero para estudantes com renda mensal familiar de até três salários mínimos, que terão dívida descontada do salário.
Nem toda a rede apresentou estagnação ou queda. A modalidade de ensino a distância vem demonstrando crescimento e, por causa dela, o número de novos universitários permanece constante mesmo com a queda entre aqueles que cursam presencialmente. Os dados indicam que a taxa de inscritos em cursos presenciais passou de 82,6% de todas as matrículas, em 2015, para 81,4% em 2016. Já o ensino a distância cresceu 20% nos últimos dois anos.
— Em momentos de crise, as pessoas vão buscar um curso superior para tentar melhorar a probabilidade de conseguir um emprego. E, com a falta de financiamento, muitas pessoas buscam o ensino a distância por ser mais barato, tanto o curso em si, quanto a permanência nele, já que não exige deslocamentos diários, entre outras coisas — opina Rodrigo Capelato, presidente Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior de São Paulo (Semesp).
Segundo Capelato, a flexibilização do governo no que diz respeito às regras de concessão de EAD também é responsável por esse aumento:
— Nos últimos dois anos, o MEC acelerou o credenciamento de novas instituições e polos ofertando EAD, isso gerou um aumento de oferta de educação a distância e, consequentemente, a modalidade atingiu um público maior.
MUITO ENTRAM, POUCOS SAEM
Para o presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação (CNE), Luiz Curi, embora os indicadores de matrícula sejam importantes, é necessário levar em conta outros aspectos.
— Precisamos considerar indicadores como evasão. Entre 2010 e 2014 tivemos uma taxa de desistência próxima aos 50% em uma época em que havia grande espaço para o Fies. Isso mostra que a queda nas matrículas não está relacionada somente ao ingresso — afirma Curi ao não creditar as mudanças do Fies aos atuais percentuais do censo. — Acho que a desaceleração nas matrículas é uma coisa sazonal e tem diversas razões. Nossa preocupação é com manutenção, boa qualidade do currículo, diplomação.
Segundo o censo, há no Brasil 34.266 cursos distribuídos por 2407 instituições de ensino superior, das quais 87,7% são privadas. Entre os estabelecimentos públicos, predominam os mantidos pelos estados. Mas quando se trata de alunos matriculados, a rede federal está maior e aumentando sua fatia no bolo.
O censo também mostra que, em 2016, havia 8,05 milhões de matrículas na educação superior brasileira. Deles, três milhões ingressaram no ano passado. No mesmo período, 1,17 milhão se formaram. Em geral, os cursos brasileiros têm um baixo índice de conclusão: muita gente entra, mas boa parte desiste no meio do caminho e poucos saem formados.
— Nosso sistema tem baixa produtividade no sentido de termos concluintes quando comparado com países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que congrega os países desenvolvidos) — disse o diretor de Estatísticas Educacionais do Inep, Carlos Moreno.