Durante o Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular (CBESP), que começou na quinta-feira (7) e continua até sábado (9) na Ilha de Comandatuba, na Bahia, representantes de grupos educacionais debateram formas alternativas de captar e reter alunos num contexto de baixa oferta de financiamento estudantil por parte do governo. Oferecer bolsas, descontos e crédito estudantil, na avaliação dos palestrantes, é um dos caminhos a se trilhar para aumentar a quantidade de pessoas com nível superior no Brasil.
Atualmente, apenas 17% da população entre 25 e 34 anos cursou graduação no país. Taxa bem inferior à média das 37 nações da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), considerada como padrão de excelência, que está em torno de 43%. "Sem financiamento não tem expansão da educação. Isso é importante para que o aluno tenha acesso ou permaneça no ensino superior”, afirma Sólon Caldas, assessor técnico do Fórum (Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior) e diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES).
"De um lado tem um monte de aluno querendo financiamento; de outro, estão sobrando 70% das vagas nas faculdades particulares", denuncia. Jamil Saud Marques, vice-presidente de Finanças da Kroton Educacional, chama a atenção para a correlação entre penetração do ensino superior e questões monetárias. "A gente não pode ignorar que o acesso financeiro é importante ferramenta para aumentar as taxas de penetração do ensino superior", defende o graduado em engenharia de produção pela Universidade de São Paulo (USP), com MBA pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Empresas), na França e em Cingapura.
Nos países da OCDE com maiores índices de penetração do ensino superior, incluindo Reino Unido (52%), Austrália e Noruega (49%), Estados Unidos (48%), Suécia (47%) e Nova Zelândia (40%), a maioria dos alunos (de 52% a 92%) receberam empréstimos estudantis. No outro extremo, em países com menores níveis de acesso ao ensino superior, como Turquia (30%), Itália (25%) e Brasil (17%), a minoria dos estudantes (de 20% a 32%) têm algum tipo de auxílio financeiro.
"O acesso financeiro, não tenho dúvidas, é essencial para que qualquer país evolua em termos de acesso à educação", reitera Jamil, que integra a Kroton Educacional desde 2015 e diz ter sido, ele próprio, beneficiário de programas de acesso financeiro. Ao mesmo tempo em que o número de pessoas com diploma de nível superior é considerado baixo nacionalmente, esse tipo de formação ainda é bastante recompensada no mercado de trabalho em termos salariais. O Brasil tem uma das maiores taxas de retorno econômico de se investir no ensino superior: 149%. A média dos países da OCDE é de 58%.
Alternativas
Em um contexto em que o Ministério da Educação (MEC) reduziu o acesso ao Financiamento Estudantil (Fies), além de ter elevado os critérios para ser beneficiário do programa, não se pode esperar que o aumento do acesso financeiro e da penetração do ensino superior parta apenas do governo. As próprias faculdades podem buscar soluções que sejam benéficas para elas e para os estudantes.
Foi no que investiu a Kroton Educacional, grupo presente no Brasil há 50 anos, que começou como curso pré-vestibular e, ao longo das décadas, adquiriu e fundiu marcas como Anhanguera, LFG, Unopar, Unic, Fama e Unime. "Entre o fim de 2014 e o início de 2015, com a redução na quantidade de contratos financiados pelo governo, vimos nisso uma oportunidade de continuar dando acesso a alunos que não estudariam se não tivessem algum aporte financeiro. Foi então que criamos os produtos de acesso financeiro da companhia", relembra Jamil Marques.
"Criamos, como primeiro produto, um empréstimo temporário para alunos que eram elegíveis pelo Fies, mas que não tinham sido beneficiados pelo financiamento. Ninguém quer turma vazia em suas universidades. Se as turmas já estarão abertas, por que não testar?", indaga o vice-presidente de Finanças do grupo. Até o momento, o teste, em parceria com instituições financeiras, tem apresentado resultados positivos.
"O aluno do parcelamento não se comporta de modo muito distinto do aluno que paga do próprio bolso em termos de permanência", comenta. Pelo programa de acesso financeiro da Kroton, os estudantes podem pagar até 70% do curso em parcelas após a formatura. "O interesse é alinhado, porque é um produto financeiro, mas está alinhado completamente à missão de fazer o aluno realizar o sonho dele. Ao mesmo tempo que a gente viabiliza o ensino, a gente não coloca nosso negócio em risco", comemora Jamil.
Rafael Baddini, sócio-diretor e diretor de Vendas e Marketing do Ideal Invest, responsável pelo crédito universitário PraValer, pondera que é preciso apostar nesse tipo de programa com critérios. "Não adianta deixar todos os custos do curso para o aluno pagar depois de formado porque o estudante vai adquirir uma dívida muita alta e não conseguirá pagar", alerta. Por isso, o PraValer, que atendeu mais de 130 mil alunos em mais de 500 instituições de ensino, só oferece o benefício para quem precisa e de modo que a pessoa consiga quitar o crédito depois.
"A gente conseguiu colocar até 10%, em alguns casos 20%, dos calouros com esse crédito. Fazendo um trabalho a quatro mãos com as instituições, dá para fazer dar certo", diz. A permanência no curso por parte dos alunos com financiamento tem sido maior do que a de universitários sem o benefício e superior também a de universitários que fizeram financiamento próprio em faculdades.
O PraValer é responsável por 90% dos créditos do P-Fies, o "Fies privado", ou Fies 2 e 3, modalidades em que o empréstimo universitário é concedido por instituições financeiras e não diretamente pelo governo (caso do Fies 1). Segundo ele, o programa nessas modalidades, por ser muito novo, ainda está "saindo do chão”. Tanto é que, segundo Sólon Caldas, da ABMES, apenas 800 dos 210 mil contratos previstos para 2018 no P-Fies foram firmados até o momento.