O presidente Jair Bolsonaro editou uma medida provisória (MP) que libera a participação no Programa Universidade Para Todos (Prouni) para alunos de escolas privadas que não tiveram bolsa. Antes, a participação só era permitida para quem estudou em escola pública ou quem teve bolsa integral em instituições particulares.
A MP altera a lei que criou o Prouni, de 2005, e cria diversas novas possibilidades de participação no programa, como para alunos que estudaram parcialmente em escolas públicas e parcialmente em escolas particulares, com bolsa integral, parcial ou nenhuma bolsa.
Para participar do programa continua sendo necessário, no entanto, não ter diploma de ensino superior e ter renda familiar per capita que não ultrapasse o valor de um salário mínimo e meio (atualmente, R$ 1.650).
A medida exclui ainda artigo que estabelecia a contrapartida por parte de instituições filantrópicas, o que é apontado por especialistas como um dos pontos mais preocupantes.
O texto foi publicado nesta terça-feira no Diário Oficial da União (DOU). Uma medida provisória tem validade imediata, mas precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado no prazo de 120 dias para virar uma lei. Os parlamentares podem fazer alterações no texto.
Alguns dos pontos da MP, no entanto, só terão efeitos a partir de 1º de julho de 2022, como a flexibilização nos critérios de entrada no programa.
De acordo com comunicado da Secretaria-Geral da Presidência, "a iniciativa busca ampliar a abrangência das condições de acesso às bolsas de estudo Prouni, alcançando, assim, estudantes egressos do ensino médio privado que foram pagantes ou bolsistas parciais".
Outra alteração feita pela MP foi a revogação de um artigo da lei de 2005 que determinava que "a instituição de ensino superior (...) somente poderá ser considerada entidade beneficente de assistência social se oferecer, no mínimo, 1 (uma) bolsa de estudo integral para estudante de curso de graduação" para cada nove estudantes pagantes. Na prática, segundo especialistas, a medida acaba com qualquer tipo de regulação relacionada às entidades filantrópicas.
— Agora elas não têm mais contrapartidas. Elas tinham que investir 20% da movimentação financeira em gratuidade, conceder bolsas e respeitar critérios de funcionamento. O resultado é que o credenciamento dessas entidades e a contrapartida delas fica praticamente livre — explica Daniel Cara, professor da faculdade de Educação da USP.
De acordo com ele, caso a MP se converta em lei, é importante definir como essas mudanças seriam operacionalizadas durante a seleção para evitar que desigualdades sejam aprofundadas.
— Do jeito que está o texto vai acontecer uma competição entre estudantes de escola pública e privada. O prejuízo em termos do conjunto da política é muito grave — opina Cara.
Cotas
A MP modifica ainda o cálculo para disponibilização de vagas destinadas a cotas no âmbito do ProUni para negros, indígenas e pessoas com deficiência. De acordo com o texto, a conta para determinar a quantidade de bolsas a serem distribuídas deve ser feita com base no percentual mínimo de pessoas autodeclaradas pretas, pardas ou indígenas; ou de pessoas com deficiência, separadamente, na população de cada unidade federativa do país.
Na regra anterior à medida provisória, o cálculo era feito a partir da soma de todos esses grupos na população.
A mudança na regra era um pleito antigo de entidades ligadas ao ensino privado. O governo Bolsonaro tem feito reiterados acenos ao setor ao longo de sua gestão. Nesta terça-feira, após a publicação da MP, grupos ligados a escolas particulares e ao ensino superior privado comemoraram a medida.
— As mudanças no ProUni são uma bandeira do setor há quase 10 anos. O setor vem apresentando sugestões de melhoria para que as vagas possam ser adequadamente preenchidas e uma das coisas que limitava isso era a questão de exigir que fosse estudante de escola pública o tempo inteiro ou com bolsa integral na escola privada — defendeu Celso Niskier, diretor presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES).
Comprovação de renda
O Ministério da Educação poderá dispensar a apresentação da documentação que comprove a renda familiar mensal do estudante, "desde que a informação possa ser obtida por meio de acesso a bancos de dados de órgãos governamentais".
"A ideia aqui não é dispensar do cumprimento de exigência legal, mas tão somente exonerar o estudante da obrigação de comprovar situação que possa ser aferida diretamente por meio de informações disponíveis em bases de dados públicas", afirma o comunicado da Secretaria-Geral.