Define-se empatia como sendo a capacidade que temos de entender o outro por se colocar na posição dele. Compaixão, por sua vez, seria uma espécie de empatia aplicada à medida que vai além ao fazer algo em função dessa sensibilidade sobre o alheio.
O uso intensivo de tecnologia, especialmente via redes sociais, tem alterada a forma e a qualidade de como nos relacionamos e, portanto, impacta em empatia. Educadores e pesquisadores da área têm, sistematicamente, apontados os riscos decorrentes da diminuição de empatia pelo uso excessivo de redes sociais. Por outro lado, sabemos também que a internet tem sido um laboratório muito eficiente de novas formas de comunicação, seja para o bem ou para o mal.
O desafio passa a ser em que medida a própria tecnologia pode ou deve fazer parte da solução do problema por ela mesma criado. Assim como o soro antiofídico tem no veneno o seu principal ingrediente, seremos ou não capazes de fazer uso do mesmo ambiente tecnológico para colaborar na formação de pessoas mais empáticas?
Segundo a jornalista do VICE, Kaitlin Phillips, no inspirador texto “The Future of Feeling: Building Empathy in a Tech-Obsessed World”, crianças de 8 a 10 anos dispendem por dia, em média, 6 horas frente à tela dos dispositivos, as de 11 a 14 anos 9 horas e a maioria dos adultos permanecem conectados algo da ordem de 10 horas diariamente. A pesquisadora da Universidade de Notre Dame, Sara Konrath, observou que os estudantes de nível superior em 2010 demonstravam 40% menos empatia do que seus correspondentes pares em 1979. Provavelmente, essa diferença já deve ser bem maior atualmente.
Vários estudos mostram que o uso das mídias sociais, gradativamente, passou a ter um aspecto “gameficado”, onde o objetivo do jogo nas conversas prioriza, na maioria dos casos, vencer ou dominar totalmente. Trata-se, em geral, de um ambiente que pouco sugere mudar de opinião ou de ênfase adotada. Ao contrário, salvo os “likes” (sobre os quais também se disputa quem tem mais), relevante mesmo parece ser aniquilar os argumentos dos demais, conquistando de forma exclusiva e definitiva os terrenos virtuais, supostos em disputa, garantindo-os exclusivamente para si ou para aqueles que pensam identicamente.
Dylan Marron no podcast “Conversations with People Who Hate Me” realizou um interessantíssimo experimento convidando pessoas que o haviam ofendido nas redes sociais para uma conversa gravada. Os diálogos foram antecedidos por um acordo assumindo um conjunto mínimo de regras civilizadas. Na maioria das conversas, os participantes demonstraram surpreendente respeito e compreensão acerca dos pontos de vistas diferentes dos seus, ainda que mantendo eventuais e naturais discordâncias. Ou seja, a mediação humana direta e algumas regras acordadas previamente podem alterar as relações entre pessoas e os frutos dos diálogos.
Sobre o papel da educação, das escolas e dos professores, nada há de inédito em estimular empatia; por sinal, missão que eles já vêm cumprindo há milênios. O desafio contemporâneo é como conectar o ambiente escolar de aprendizagem com os novos espaços virtuais tendo em vista acelerar a curva de aprendizagem sobre a importância do respeito aos demais, ampliando a noção de comunidade e de solidariedade. Já há vários aplicativos que têm obtido grande sucesso nessa missão, alguns deles já incorporando novidades como Inteligência Artificial e Realidade Múltiplas (Virtual, Ampliada e Mista) como elementos de aumento de empatia e de engajamento emocional entre os partícipes.
Sobre Inteligência Artificial, é amplamente conhecido o caso da empresa “Cambridge Analytics”, a qual, em 2016, fazendo uso inescrupuloso de dados pessoais, promoveu, via conteúdos digitais muitas vezes falsos ou manipulados, posicionamentos radicais pela eleição de Donald Trump ou pela aprovação do Brexit.
Curiosamente, a mesma abordagem, com propósitos muito diversos daqueles, pode ser utilizada, via analítica da aprendizagem (“learning analytics”), coletando dados dos educandos nos ambientes virtuais de aprendizagem para conhecer os detalhes de cada um. As informações neste caso incluem ter muito mais clareza acerca do que ele ou ela sabem e quais suas lacunas, seus comportamentos típicos, como otimizar suas aprendizagens, em que meios e em que contextos educacionais se dão melhor, quais as abordagens mais indicadas etc. Ao conhecer o aluno e permitir que ele se conheça melhor, podemos construir trilhas de aprendizagens que lhes são mais apropriadas, viabilizando uma educação híbrida (fazendo uso simultâneo de várias modalidades), flexível (adaptável aos diversos contextos e propósitos educacionais) e, especialmente, personalizada (cada um aprende de forma única).
Realidades múltiplas têm um enorme potencial para despertar emoções e promover engajamentos. De forma muito especial, pode promover atividades que estimulam a formação emancipatória e a capacidade de cada um decidir a partir de seus próprios valores e convicções. A ênfase não está somente em transmitir conhecimento ou estabelecer polarizações ou crenças, mas sim ampliar em cada um a sua própria percepção acerca de como analisamos contextos e a partir de quais elementos ou argumentos formamos as nossas próprias opiniões. Ou seja, controlamos, até certo ponto, os ambientes, os roteiros e as abordagens preliminares, porém, a dinâmica ao longo das atividades deve, necessariamente, refletir também o usuário, enquanto participante ativo e consciente do processo.
Em suma, não há profissão que possa ou deva dispensar empatia e compaixão. Tecnologia, por meio da educação, demonstra ser ingrediente indispensável e estratégico para ampliar essas características em qualquer cidadão. A qualidade dos trabalhos desenvolvidos por todos os profissionais, sem exceção, será tão melhor quanto mais bem preparados eles estiverem no que diz respeito a entender aqueles com quem eles lidam e serem estimulados a fazer algo positivo em função disso.
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