Não podemos prever o futuro, mas podemos criá-lo. (Peter Drucker)Quem vivencia o ensino superior, há mais tempo, vai se lembrar dos tão falados “cursos de fim de semana” do século passado. Embora criticados na época, representavam uma oportunidade para aqueles que não tinham a possibilidade de frequentar cursos regulares em uma instituição de ensino superior. Cidades como Bragança Paulista, Mogi das Cruzes, Franca, Presidente Prudente, Itapetininga, Ouro Fino, Niterói e tantas outras ficaram famosas por oferecerem cursos – especialmente os de Administração, Direito, Contabilidade e Pedagogia – com calendário especial. Os fins de semana eram uma festa. O comércio daquelas cidades se expandia, graças ao aumento de consumo nos bares, hotéis e restaurantes. Os estudantes tinham aulas na sexta-feira à noite, no sábado inteiro e no domingo pela manhã. Era tudo muito corrido, as aulas bem apostiladas, ao lado de infindáveis trabalhos para leitura e exercícios a serem entregues na semana seguinte ou no final do mês. Na realidade, havia muito mais atividades práticas do que aulas. Faço referência a esses tempos remotos porque li a excelente entrevista de Edson Nunes na Folha Dirigida, repercutida no site da ABMES na semana passada. Ele faz uma análise crítica do sistema de ensino superior atual e aborda, dente outras questões, a carga horária do ensino brasileiro comparada com a dos sistemas norte-americano e europeu. Nestes, a carga de trabalho varia de 1.500 a 1.800 horas por ano, enquanto que no Brasil é de 600 horas, das quais 400 são dedicadas às aulas expositivas. Além disso, há de se levar em conta o relativo aproveitamento do alunado brasileiro que, em grande número, estuda à noite, depois de um extenuante dia de trabalho. Os alunos ouvem passivamente, sempre, e se exercitam muito pouco. Tal fato demonstra que a estratégia das aulas de fim de semana não era tão ruim, porque, em muitos casos, poderia até trazer melhores resultados. Penso que tal modelo, à época, deveria ter sido aperfeiçoado, em vez de demonizado. A obsolescência total do sistema universitário mundial – principalmente a dos métodos de transmissão do ensino – é o tema “da hora”. O estudante não suporta mais ouvir conceitos jurássicos sobre uma matéria que ele nunca mais vai usar na vida e à qual poderá ter acesso, sempre que quiser, no Google. Realmente há uma transição no modelo atual, com maior participação do aprendizado fora da sala de aula, graças ao ensino a distância – um misto de sistema híbrido e blended – caracterizado pela prevalência da imagem visual. Edson enfatiza em sua entrevista outra questão importante:
“No Brasil, ensinam-se profissões, quando os alunos deveriam aprender Literatura, História, Ciência, Métodos Quantitativos, Lógica, Línguas, enfim, uma gama de conhecimentos necessários para prepará-los para a vida, para exercer qualquer ocupação do mundo moderno.”Há de fato um processo de mudança paradigmática da educação superior, que está deixando de ser uma prerrogativa das classes mais privilegiadas, para ser um direito inalienável das populações de menores recursos. As famílias e a sociedade como um todo já perceberam que a educação superior é a maneira de propiciar a ascensão social e de aumentar as oportunidades no mercado de trabalho. Nesse sentido, enquanto reivindicação de toda a sociedade, a educação precisa ser modernizada para atender a uma população cada vez mais numerosa de estudantes. Outro fator a ser considerado é que a área de abrangência de uma instituição não está limitada à rua, à cidade ou ao país. Está no mundo. O ensino não pode ser mais local, e sim global, e deve possibilitar a interação do aluno com as áreas do conhecimento, com os fenômenos de natureza e com as questões sociais, políticas e econômicas mundiais. O estudante precisa estar conectado com a realidade, ser um cidadão do mundo, e estar consciente de que as oportunidades de trabalho se encontram onde talentos sejam demandados. Não afirmo que as universidades devam relegar a um segundo plano o seu papel local, regional ou nacional, substituindo-o por uma perspectiva de ação global. Pelo contrário, creio que devem ter fortes raízes locais, porque sua identidade e diversidade são essenciais para o sucesso como instituições. As mudanças só acontecerão graças aos avanços da tecnologia de informação e comunicação, já citadas inúmeras vezes em artigos deste blog. A tecnologia é um meio colaborativo imprescindível para romper com o atraso educacional. O certo é que a administração superior das instituições educacionais deve assumir um papel proativo de enfrentamento dos novos desafios da globalização e dos avanços tecnológicos e ter uma visão estratégica centrada na inovação. Tais fatores são imprescindíveis para todos os que estão empenhados em garantir a sobrevivência do sistema. Creio que os desafios dos novos tempos educacionais devem ter como meta a desconstrução do atávico sistema universitário vigente há mais de mil anos. Creio, finalmente, que os cursos de fins de semana de trinta anos atrás provaram que os focos nas atividades extracurriculares, nas discussões em grupo e na determinação do estudante em aprender valem mais do que a “hora bunda cadeira”. Imagine hoje esses cursos, com projetos aprimorados aliados às forças da tecnologia? Poderiam mudar todo o conceito do ensino presencial. Certa ou errada, essa é uma provocação que faço para suscitar a discussão. “Vamos nessa?”