Há uma competição extremada entre grandes e pequenas escolas, mas, por outro lado, melhor oportunidade não existe para a área educacional que, em todos os níveis, está carente de renovação e precisa ser desbravada depois de dez séculos de inanição. (J. P.Wilkinson)Na conferência de abertura do 16º Fórum Nacional do Ensino Superior Particular (Fnesp), realizado na semana passada em São Paulo, o presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior Estado no Estado de São Paulo (Semesp), Hermes Figueiredo, enfatizou que o desenvolvimento das organizações está apoiado na renovação constante dos processos administrativos e acadêmicos e que estes, para se manterem saudáveis e sustentáveis, precisam estar sempre em consonância com as demandas educacionais para enfrentar os desafios da competitividade existente no setor. O presidente do Semesp relatou também um comentário que seu filho fizera ao constatar, numa publicação de 2005 da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), que, entre as 29 instituições paulistanas citadas, apenas 15 ainda permaneciam no cenário educacional com os mesmos mantenedores. Como Figueiredo não questionou as razões para a ocorrência dos fatos relatados, vamos aproveitar a oportunidade para registrar que estes são naturais e esperados na vida empresarial e até na história da humanidade. Diferentemente das pessoas – que nascem, crescem e morrem –, o maior obstáculo das empresas é se perpetuarem no decorrer das gerações. Poucas conseguem. Tal fato é próprio da história dos povos desde as civilizações antigas até nações modernas. Em cada época, a luta pela liderança passa de país para país, com o domínio de uns e com a extinção de outros. O mesmo acontece em todas as áreas. Nossa memória é capaz de registrar grandes impérios empresarias do século passado, assim como centenas de marcas que não mais existem. A lista de empresas e produtos é imensa e impossível de ser citada no espaço deste artigo. O mais natural é que esses fatos tenham acontecido e que continuem acontecendo também no cenário educacional. Como inexistem pesquisas no setor, fica difícil quantificá-los. Entre as incontáveis iniciativas que deram certo, devem existir centenas que fracassaram ao lado de outras que não estão mais nas mãos dos fundadores. Como ensina Guimarães Rosa[1], é “o correr da vida que embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”. Assim parece lógico que cada um tenha as suas razões pessoais, motivação familiar e/ou societária para que, em determinado momento, venda seus negócios, sua participação, com a obtenção de bons resultados estratégicos para atuar em outras atividades mais promissoras. Ao analisar a realidade paulistana, que não deve ser diferente das de outras regiões, a entrada da iniciativa particular no ensino superior começa na década de 1960 e se intensifica na de 1970 com o incentivo do próprio Estado, que não tinha condições de atender à grande demanda de estudantes que postulavam ingresso nos cursos superiores das universidades públicas. Nesse contexto, as instituições de ensino particulares religiosas e leigas, que atendiam o ensino secundário, expandiram suas atividades para o ensino superior. Da mesma forma, se estabeleceram sociedades formadas por amigos, professores ou familiares com o mesmo intuito: criar faculdades com a oferta de cursos diferenciados, para atender a formação superior por todo o território brasileiro. Com o crescimento populacional, a necessidade de cursos era maior do que a oferta, fato que provocou a expansão do sistema com a transformação das faculdades em universidades e centros universitários, nas décadas de 1980 e 1990. Como disse o Vice-Presidente de Planejamento e Ensino da DeVry Brasil, Maurício Garcia, também no 16º Fnesp, esta expansão caracterizou a “primeira onda”, na qual bastava ter autorizações de alguns cursos para criar uma faculdade. Alunos é que não faltavam. Veio o novo século, acompanhado de outras exigências tais como gestão administrativa e acadêmica competente e os investimentos na área de marketing. Ao lado disso, a competitividade se tornou maior e passou a exigir planos de expansão para que as instituições pudessem concorrer em outras localidades. Os tempos mudaram. O crescimento da instituição passou a exigir maior profissionalismo para superar os inevitáveis desafios, fato que caracterizou a “segunda onda”. Nesse sentido, os fundadores das instituições de ensino superior (IES) com mais de 30/40 anos de trabalho passaram a refletir sobre a oportunidade de passar o bastão de comando para profissionais da área. Com a missão cumprida, os mantenedores podiam se orgulhar de terem formado perto de 6 milhões de pessoas que colaboraram, e colaboram, para o desenvolvimento do país. A realidade de cada instituição é diferente de outra em relação ao futuro. Os herdeiros das unidades bem sucedidas podem ter mais vocação para outras atividades. Alguns deles pensam, por exemplo, que a educação é uma área muito dependente dos humores do governo e, por isso, difícil de ser administrada. Nas associações, onde os seus membros trabalharam unidos por muitos anos, a relação com os sucessores não é a mesma. Surgem conflitos de poder e desentendimentos para a realização de projetos futuros. E, de certa forma, em algumas organizações religiosas acontece o mesmo, isto é, a liderança que fomentou o sucesso foi substituída e os sucessores não conseguem manter o desenvolvimento institucional. Em todas as partes do mundo surgem estratégias da consolidação de empresas similares – as maiores adquirem ou se fundem com as menores, fortalecidas pela injeção de recursos proveniente de fundos de capitais. Nestes casos, registram-se: a) pontos positivos inegáveis como a economia de escala advinda da redução ou eliminação de custos e despesas com as atividades corporativas (marketing, finanças, recursos humanos e outras); b) avanços nos processos de gestão, melhor desempenho econômico e financeiro, além da eliminação de níveis hierárquicos, de pessoal com funções e atividades redundantes; e c) ganhos de sinergias com os resultados das operações conjuntas. No entanto, os grandes desafios permanecem: como atender, de fato, as expectativas das classes “C” e “D” que pretendem acesso profissional e como contribuir para que o país alcance as metas preconizadas no Plano Nacional de Educação (PNE) entre as quais colocar 30% da população de 18 e 24 anos na universidade. Estamos entrando na “terceira onda” que faz convergir alguns fatores: a) a relativa expansão das classes sociais menos aquinhoadas, advinda da implementação de programas de financiamento governamental como o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o Programa Universidade para Todos (ProUni); b) a busca de melhor desempenho do ensino superior com críticas severas em relação aos egressos do sistema; e c) a expectativa de melhor uso das tecnologias de informação e comunicação para a melhoria do ensino. Os cenários do futuro mostram, cada vez mais, que a sociedade vai cobrar melhores resultados educacionais e, no momento atual, não é o tamanho espetacular das instituições que vai ser levado em conta e sim o aprendizado efetivo do estudante. Neste caso, as pequenas e médias instituições de ensino superior (PMIES), por estarem mais próximas dos estudantes e do seu entorno social, poderão levar vantagem. Isto porque não serão mais avaliadas as horas que os alunos se sentam nas cadeiras universitárias, mas sim as competências profissionais e habilidades e atitudes adquiridas. Em suma, há uma competição extremada entre grandes e as PMIES. Mas deve-se levar em conta que a área educacional, em todos os níveis, como diz Wilkinson, “está carente de renovação e precisa ser desbravada depois de dez séculos de inanição”. Neste cenário, a agilidade estratégica que as PMIES têm e que as IES de grande porte não têm será a “fórmula vitoriosa”. Portanto o caminho ainda está livre para os empreendedores educacionais. Boa sorte e sucesso, pois a vida continua e para tanto será preciso ter muita coragem. [1] Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Editora Nova, 2001.