Um tsunami é uma série de ondas causada pelo deslocamento de um grande volume de água num oceano ou num grande lago. Cento e noventa e cinco tsunamis, aproximadamente, já foram registrados no Oceano Pacífico. Devido aos imensos volumes de água e energia envolvidos, podem devastar regiões costeiras.O Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) vinha navegando desde o seu lançamento em mares calmos quando, em dezembro de 2014, uma tempestade estrondosa se abateu sobre o programa. Até Poseidon – deus dos mares, irmão de Zeus, deus dos deuses, na mitologia grega – se preocupou. Quem diria? Assim no governo que se inicia, em decorrência da política fiscal estabilizadora, o Programa foi inopinadamente atingido, devido à falta de recursos públicos de sustentação. Trata-se de uma nova realidade que precisaria ter sido administrada, considerando o início do período letivo de 2015, aliado ao fato de que o MEC e as instituições de ensino superior deveriam, antecipadamente, ter discutido as medidas para solucionar o impasse das políticas governamentais. As alterações introduzidas pelas Portarias Normativas MEC nº 21 e 23/2014 – editadas às vésperas do início do governo da presidente Dilma Rousseff, em cujo discurso de posse lançou o lema da política educacional “Brasil, Pátria Educadora” – produziram um imenso tsunami que atingiu estudantes, escolas, famílias e administrações, dirigentes e corpo docente das IES e avançou na contramão do Plano Nacional de Educação (2014-2024). Medidas mal pensadas e afoitas atingiram uma “área delicadíssima”: os anseios dos que desejam acessar o ensino superior e se preparar melhor para enfrentar o concorrido mercado de trabalho. De uma hora para outra, todos os planos foram desfeitos, porque o financiamento era a única maneira de permitir que alunos de baixa renda pudessem cursar a universidade. Nenhuma alteração no programa poderia ter sido introduzida pelo regulador sem ouvir os executores do programa, pois de uma forma ou de outra estavam sendo atingidos 2 milhões de estudantes. Será que nenhum burocrata mais sensível se apercebeu que Janeiro é o período das matrículas dos novos alunos e dos veteranos e que a mudança geraria um caos no sistema universitário, como o acontecido? As soluções para a falta de recursos poderiam ter sido pensadas três meses antes, com toda a transparência, com o objetivo de buscar mecanismos para mitigar, com antecedência, os problemas havidos. Mas tal não aconteceu. A formação de pessoas em nível universitário no Brasil ainda é diminuta comparada com as de outros países. É necessário um esforço para aumentar a quantidade de alunos e situar o Brasil no patamar do desenvolvimento. Daí as metas estabelecidas pelo PNE de se alcançar 33% de estudantes na idades entre 18 e 24 anos na universidade e de 50% acrescentando-se os com idade superior. A título de exemplo, podemos citar o presidente Obama que ao encerrar seu mandato quer atingir 100% da população entre 18 e 24 anos na universidade. Sabemos que a educação, pela sua complexidade e importância, exige das pessoas que nela militam – mantenedor, administrador e professor – amor, paixão, dedicação, interesse, percepção de seus objetivos e finalidades, sobretudo o de formar o profissional e o cidadão. A universidade brasileira foi criada pela e para a elite visando garantir os quadros na política, nas empresas e na administração pública. Os filhos das classes mais pobres iam para as profissões chamadas de “menos nobres” que dependiam do uso das mãos. A partir da década de 1960, o ensino particular foi instigado a se desenvolver para atender os filhos da classe média emergente que eram aprovados no ensino público superior, mas que não conseguiam vagas, os célebres excedentes. E foi graças ao desenvolvimento do ensino superior particular que o país pode fazer crescer os seus índices de população nas instituições de ensino superior (IES). Assistimos hoje a um paradoxo na educação brasileira: as famílias ricas pagam os melhores colégios para que seus filhos ingressem na universidade pública gratuita, enquanto os filhos das famílias de menores recursos frequentam o ensino médio público deficiente, para depois entrarem nas escolas privadas arcando com o custo das mensalidades. Para que o Brasil possa atingir os índices compatíveis com as nações desenvolvidas, será preciso aumentar sua população universitária. Isto só pode ser conseguido com a inclusão dos estudantes das classes “C”, “D” e “E” que não têm recursos mas que anseiam por financiamentos. Embora o número de concluintes do ensino fundamental brasileiro tenha crescido 9%, de 2007 a 2013 as matrículas do ensino médio se mantiveram praticamente estáveis. Em 2012, apenas 1,9 milhão de estudantes estariam aptos aos cursos superiores, mas a população de 17 anos no país é de 3,5 milhões. A rigor, poderíamos ter quase o dobro de jovens ingressando no superior. O fato é que, sob a ótica da política social, o governo Lula da Silva criou o Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Fundo de Desenvolvimento Estudantil (Fies) e o governo de Dilma Rousseff os fortaleceu de forma a permitir o ingresso de estudantes com menores recursos nas IES. O Fies, por exemplo, depois de quatro anos de existência e de enorme sucesso alcançou quase 2 milhões de alunos. Constatamos hoje que o Programa não foi bem planejado, como seria exigível, dada a necessidade de grande envergadura de recursos financeiros por muitos anos. Importante ressaltar que na iniciativa privada um curso custa 1/4 de preço do curso correspondente na IES pública, fato que justificou a adoção dos financiamentos do ProUni e do Fies, menos onerosos ao governo do que construir prédios, alocar serviços, corpo docente, laboratórios, bibliotecas, entre outros. A iniciativa privada arcou com todos os insumos e riscos referentes à abertura da abertura e manutenção de seus próprios cursos. É preciso olhar os dois lados. Sabemos que ainda existem resistências visíveis do governo e da sociedade em relação ao ensino superior particular; sabemos porém, que há sérias controvérsias sérias em relação ao modelo como os cursos são avaliados pelo Poder Público. Se o Estado deseja ser parceiro do segmento particular visando cumprir as metas do PNE deverá fazer uma opção clara de investir em educação e de aperfeiçoar os programas de fomento hoje existentes – ProUni e Fies. Não podemos aceitar o improviso, como ocorreu com o Fies, sob o argumento de aperfeiçoar o programa, para limitar e fazer cortes que resultaram em insegurança para o aluno que, de uma hora para outra, se vê obrigado a recorrer à justiça para que não lhe tirem o direito de estudar. Temos que reconhecer que existem duas classes de alunos no Brasil: os que estudam gratuitamente à custa de nossos impostos, a fundo perdido e os que buscam financiamento para poder estudar por que não têm recursos próprios para arcar com o custo das mensalidades. Aperfeiçoar os programas com um debate entre a área técnica do Poder Público e as IES particulares que recebem os alunos é fundamental para encontrar alternativas viáveis à sustentabilidade de qualquer programa de financiamento estudantil, sem esquecer que ao Estado compete cumprir o que determina a Constituição.