Por Ronaldo Mota*
Em meados do século XX, no Japão, a empresa Toyota desenvolveu um sistema de produção em que as partes chegavam na linha de montagem exatamente quando elas estavam sendo requeridas (“just in time”), evitando assim estoques desnecessários e outras inconveniências associadas.
Esse conceito, de alguma forma, também foi aplicado a como as pessoas aprendem, permitindo múltiplas visões e enfoques. Embora não haja uma definição simples e única para aprendizagem “just in time”, a ideia principal trata da abordagem associada a propiciar aos indivíduos as informações de que eles precisam no momento exato em que elas são mais necessárias.
Na década de 1990, o educador americano Gregory Novak apresentou o que se pode chamar de Ensino sob Medida (em inglês, “Just-in-Time Teaching”), a qual é, basicamente, uma metodologia ativa que inclui entre seus objetivos o estímulo a fazer do educando autor do seu próprio aprendizado, desenvolver a capacidade de trabalhar em equipe e estimular o debate entre os próprios alunos sobre um determinado tema proposto.
Em geral, no desenvolvimento da abordagem, há a previsão de momentos, antecedendo a aula propriamente, nos quais os alunos são expostos, via diversas mídias, ao assunto a ser tratado. Nessa ocasião são coletadas informações sobre suas compreensões preliminares acerca do tema, as quais propiciam as bases para o docente preparar as atividades seguintes. Na aula, o debate entre os próprios estudantes cumpre papel central, sendo a etapa onde os educandos localizam e entendem as eventuais fragilidades de suas respostas anteriores e trabalham, em conjunto, na elaboração de um eventual consenso.
Essa abordagem, quando bem implementada, tem se mostrado, sistematicamente, capaz de reduzir a evasão, aumentar o desenvolvimento de múltiplas habilidades e ampliar capacidades fundamentais tais como raciocínio crítico e analítico, domínio do método e da lógica e a capacidade argumentativa e de expressão oral e escrita do educando.
Adicionalmente, o que me parece despertar o maior interesse nesta metodologia é ser ela capaz de estimular habilidades metacognitivas, ou seja, aquelas que transcendem a cognição simples.
O ensino tradicional é baseado, essencialmente, em transferência de conhecimento. Ocorre que os tempos, as circunstâncias e os contextos educacionais mudaram radicalmente. Entre as alterações mais relevantes, a informação se tornou amplamente disponível, instantânea e, progressivamente, gratuita. As consequências acerca do que se espera de um profissional e de um cidadão foram drásticas. É cada vez menos previsível o que o mundo do trabalho vai exigir, tornando muito mais complexo formar alguém apto a enfrentar, com sucesso, quaisquer desafios.
O ensino tradicional dialoga com os elementos cognitivos, enquanto a aprendizagem contemporânea estabelece forte conexão com a metacognição. Cognição, em geral, diz respeito aos processos associados à aquisição de conhecimentos. Metacognição, por sua vez, se refere àquilo que transcende a cognição, onde tão importante quanto o que foi aprendido é a reflexão, por parte do educando, sobre a própria aprendizagem, com ênfase nos aspectos socioemocionais. Ou seja, a prática consciente do aprender a aprender, despertando a percepção do aprendiz acerca de como se aprende.
Um educando contemporâneo tem a expectativa de que uma enorme quantidade de informações deva estar disponível instantaneamente, tendo ele plena consciência de que a tarefa complexa passa a ser selecionar daquele vasto conteúdo os elementos necessários que sejam a base para possíveis soluções para o problema a ser resolvido ou para o projeto a ser completado. Consequentemente, a competência não está definida a priori, principalmente, pela quantidade de conhecimento adquirido antes, mas sim pela habilidade de lidar naquele momento específico com os dados disponíveis para levar a cabo a missão que estiver em jogo.
Tal perspectiva, nem de longe diminui a necessidade de o aluno conhecer elementos básicos que viabilizam a capacidade de raciocínio, pensamento abstrato e domínio do método e da lógica. Pelo contrário, tais predicados se somam ao domínio dos elementos básicos fundamentais da matéria objeto que será necessária no enfrentamento de um problema complexo.
Aprender a exercitar clareza de linguagem é imprescindível para propiciar raciocínios que deem conta da complexidade do problema em tela. Quanto mais organizado e racionalizado o pensamento, mais bem ele é aplicado naqueles momentos que demandam aprendizagem rápida e compreensão dos desafios em curso. A capacidade de descrever, oralmente ou por escrito, situações problema e a habilidade de interpretar textos mais intrincados são instrumentos fundamentais.
Em resumo, enquanto o aprender, calcado no cognitivo, diz mais respeito à aquisição do conhecimento, o aprender a aprender, associado ao metacognitivo, prepara para a aprendizagem contínua, incluindo preparar-se para aprender na hora certa e sob medida, fruto de toda a aprendizagem anterior que habilita o educando a aprender ao longo de toda a vida.
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*Ronaldo Mota é Diretor acadêmico do IPD/ITuring e diretor científico da Digital Pages