Por Carmen Tavares*
Para pensar num sistema educacional que promova uma prática pedagógica disruptiva e divergente do modelo clássico de educação, é preciso, segundo uma visão holística, repensar a gênese do Projeto Político Pedagógico. É necessário, também, reformular sua análise sob os ângulos do desenvolvimento institucional, que abrange, além da capacitação do docente, a missão, visão, valores, premissas da instituição e sugestões para a sua implementação. No entanto, a partir do momento em que começamos a conceber uma escola de prática diferenciada com maior isenção e menor espírito de autodefesa, somos capazes de antever, diríamos até, com certa precisão, que o desequilíbrio existente entre a cronologia biopsicossociológica e o tempo das realizações, na esfera profissional, está com os seus dias contados.
É claro que o reconhecimento do descompasso não tem o poder de diminuir a inquietação gerada no corpo diretivo, docente, discente e na comunidade, pois a demanda das instituições de ensino possui uma rotina que propicia o estresse e frequentemente afeta a saúde mental dos colaboradores. Porém, a esperança se infiltra quando nos damos conta de que, na nova ordem econômica e social, o futuro pertence àqueles que o estão construindo hoje. Portanto, ao iniciarmos a caminhada da escola que temos hoje para a escola que queremos, faz-se necessário um plano de ação mais abrangente que nos norteie e oriente.
Sem dúvida, um bom começo para a mudança seria a formação continuada do educador constando como meta em nossos Planos de Desenvolvimento Institucionais e capaz de criar um programa de Formação Permanente do Professor que verdadeiramente impacte em sala de aula, considerando o docente a melhor metodologia ativa de que dispomos. Sua implementação nas instituições de ensino deve partir do pressuposto de que todo educador precisa ser um pesquisador de sua prática pedagógica imediata e ir até as raízes do conhecimento, construindo uma fundamentação teórica de qualidade. Só assim esse profissional estará capacitado para sair do senso comum e da sua realidade, para se tornar um visionário da realidade social.
Na realidade da escola ou universidade adequada à sociedade atual, só as ferramentas tecnológicas, capacidades organizacionais e metodologias ativas não conseguem mais responder aos desafios de competitividade; a vantagem competitiva, capaz de projetar no mercado a escola moderna, está na qualidade, na criatividade e na inovação, enfim... nas pessoas.
Estamos na década das "pessoas" e das grandes transformações. As escolas, assim como todas as outras entidades e organizações, estão no mundo, fazem parte deste grande contexto global de mudanças. Essa é a grande visão que desponta no cenário educacional: os professores precisam comandar as mudanças em vez de serem conduzidos por elas. Quem sabe aonde quer chegar pode contribuir mais com o resultado na trajetória profissional do aluno. A escola de hoje requer um professor mais crítico, criativo, que participe, que empreenda. Um professor mais inteiro e com mais consciência profissional. O que fazer? Como conseguir que o educador da minha escola desenvolva habilidades e competências para atuar de forma dinâmica? Promovendo a conscientização de que ele não é simplesmente agente de mudanças, mas um agente nas mudanças fazendo parte delas, não sendo apenas um catalisador do processo. Isso exige uma reformulação na sua prática pedagógica e na concepção do ato de educar.
Se, na filosofia emergente de educação, a ação de educar pode ser concebida como meio de desenvolvimento integral do aluno, o professor deverá ser o elemento estimulador das múltiplas linguagens, inteligências, metodologias e tecnologias, percebendo o conhecimento de forma não-linear. Se visto como agente formador da consciência crítica, terá, antes de tudo, de se dar tratamento crítico diante dos conteúdos trabalhados e também diante de suas posturas. Lembro ainda que, no ambiente da escola conservadora, o compromisso maior do professor era com o trabalho em si, com sua execução, não com seu resultado. O professor tinha de estar ocupado cumprindo planos, não pensando sobre sua prática. Com o advento da sociedade do conhecimento o docente conquistou um espaço que não sabe ocupar. Para garantir qualidade, muitas Instituições optaram por retomar à antigos métodos de ensino por possuírem docentes com um perfil capaz de respaldar uma boa formação. No momento em que essas mudanças, entre outras, estão abrindo caminho em direção a um mundo no qual o conhecimento, poder e capacidade produtiva estarão mais dispersos do que em qualquer outro período da nossa história - um mundo no qual apenas os conectados sobreviverão, cabe ao educador, docente ou gestor conduzir a formação humana para o alcance de melhores resultados e, sobretudo, holísticos: a reflexão da ação, a busca pela criatividade e inovação. Vivência, experimentação, aplicação prática e relacionamento humano é o que mais rico pode sustentar a ação docente.
Nesse novo contexto, a preocupação com a formação permanente do educador deve, em sua ação mais específica, conseguir que todo o grupo se comprometa com a qualidade de seu trabalho, com os objetivos de uma educação contemporânea. Cabe, portanto, aos docentes e gestores acompanharem o passo histórico. Com as instituições fica o dever de estabelecer claramente quais resultados esperados da função do docente ou gestor, ressaltando a sua importância para o mundo atual que se reconfigura. Além disso, terá de envolvê-lo na formulação desses objetivos e nas formas de atingi-los. A formulação de estratégias para essa capacitação é um grande desafio. A implementação de ações coerentes com as estratégias exige muita coragem. Propor a mudança, descortinar uma nova maneira de pensar a profissão, gerar no grupo a sua visão, o seu sonho, a sua forma de caminhar, mais que treinar ou capacitar, é conscientizar que a qualidade de que tanto falamos está situada na relação entre homem e o mundo. Quero dizer que ela não está centrada nem no homem nem nos objetos, mas se apresenta como mediadora em todos os âmbitos na vida do homem e do educador, cobrando-lhe continuamente uma atitude de coerência e respeito em todos os seus atos de inter-relação com os outros homens e com o mundo. Atitude não se ensina com informações.
Enfim, só podemos esperar que o professor se disponha a projetar qualidade na sua obra, se primeiro o ajudarmos a entender a sua forma de estar no mundo.
-------------------------------------
*Maria Carmen Tavares Christóvão é Mestre em Gestão da Inovação com área de pesquisa em Inovação Educacional. Diretora da Pro Innovare Consultoria de Inovação atuou como Reitora, Pró Reitora e Diretora de Instituições de Ensino de diversos portes e regiões no Brasil. www.proinnovare.com.br