Em edição anterior dessa Coluna, abordamos a situação aflitiva vivenciada pelas instituições de ensino localizadas fora dos grandes centros e nos rincões mais afastados dos aeroportos, decorrente dos reiterados cancelamentos das avaliações in loco designadas.
Essa situação se torna ainda mais grave quando ocorre nos processos de credenciamento e autorização de funcionamento de cursos, em virtude dos pesados ônus decorrentes do retardamento desses processos e seus reflexos no planejamento econômico-financeiro das mantenedoras, com a excessiva demora na obtenção dos atos autorizativos.
Também se mostra extremamente onerosa quando ocorre nos processos em que a avaliação é necessária para a retomada da normalidade do funcionamento institucional ou da oferta de curso superior, haja vista a existência de medida cautelar ou outro tipo de sanção, cuja revogação depende, essencialmente, do resultado do procedimento avaliativo.
Se essa questão, por si só, já se mostra sobremodo grave, ganha contornos ainda mais teratológicos quando começam a surgir relatos de instituições pequenas e médias que estão enfrentando esse sério problema informando que avaliações para cursos semelhantes e nos mesmos municípios onde deveriam ocorrer as avaliações que vem sendo desmarcadas são realizadas normalmente e sem percalços quando a instituição avaliada é integrante de um grande grupo econômico.
Se isso está, de fato, ocorrendo, poderia restar configurada violação a princípios fundamentais da Administração Pública, pois é certo que o agente público deve atender ao administrado com eficiência, celeridade, respeito e polidez, independentemente das condições pessoais do mesmo, ou seja, não cabe ao agente público estabelecer qualquer tipo de distinção entre os administrados como forma de orientar a sua atuação.
Com efeito, não se justifica dar preferência à tramitação deste ou daquele processo, enquanto processos mais antigos e com avaliações já desmarcadas em meia de uma oportunidade permanecem estacionados, simplesmente à espera de designação de comissão de avaliação in loco, haja vista que, nos termos do § 7º do artigo 1º da Portaria Normativa n° 40/2007, republicada em 2010, a tramitação dos processos no sistema e-MEC deve seguir a ordem cronológica de sua apresentação, o que, no caso do tema ora tratado, deve ser entendido como o momento de sua entrada na fase de avaliação perante o INEP:
“Art. 1º A tramitação dos processos de regulação, avaliação e supervisão de instituições e cursos superiores do sistema federal de educação superior será feita exclusivamente em meio eletrônico, no sistema e-MEC, e observará as disposições específicas desta Portaria e a legislação federal de processo administrativo, em especial os princípios da finalidade, motivação, razoabilidade, moralidade, interesse público, economia e celeridade processual e eficiência, aplicando-se, por analogia, as disposições pertinentes da Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006.
.....
§ 7º A tramitação dos processos no e-MEC obedecerá à ordem cronológica de sua apresentação, ressalvada a hipótese de diligência pendente e admitida a apreciação por tipo de ato autorizativo, devidamente justificadas, observadas a impessoalidade e isonomia.”
Registre-se que, além da determinação normativa de atendimento à ordem cronológica de entrada dos processos para fins de designação e redesignação das comissões de avaliação, é impositivo ainda observar a existência de prazo legal, fixado no artigo 24 da Lei n° 9.784/1999, para tal providência, verbis:
“Art. 24. Inexistindo disposição específica, os atos do órgão ou autoridade responsável pelo processo e dos administrados que dele participem devem ser praticados no prazo de cinco dias, salvo motivo de força maior.
Parágrafo único. O prazo previsto neste artigo pode ser dilatado até o dobro, mediante comprovada justificação.”
Força é admitir, portanto, que, além de ser imperiosa a observância da ordem cronológica para a designação e redesignação das comissões de avaliação in loco, estes atos devem ser praticados com o estrito cumprimento do prazo estipulado pelo parágrafo único do artigo 24 da Lei n° 9.784/1999, como acima apontado.
Ora, se existem avaliadores disponíveis para avaliação institucional e nas áreas dos cursos cujos processos estão parados há meses, não parece razoável que sejam encaminhados para compor comissões de avaliação de processos muito mais recentes, nas mesmas áreas e em regiões geográficas próximas, pois, segundo o INEP, o fundamento para a letargia dos processos antigos é justamente a falta de avaliadores disponíveis...
Parece que o que falta não é avaliador capacitado, mas sim interesse e vontade de assegurar, efetivamente, o atendimento da previsão normativa de obediência à ordem cronológica de ingresso dos processos na fase de avaliação, numa conduta que vem a comprovar o adágio segundo o qual “quem pode mais chora menos”...
Se houvesse, efetivamente, interesse em assegurar a observância estrita da ordem cronológica na realização das avaliações e da transparência no processo de designação e cancelamento das avaliações, bastaria ao INEP tornar pública, periodicamente, relação contendo a identificação dos processos submetidos à avaliação no período, com o município e a data de realização da visita ou de seu cancelamento, bem como de seu reagendamento para a primeira oportunidade disponível.
Com isso, todos os interessados poderiam saber, de forma clara e oficial, as avaliações efetivamente realizadas, as canceladas e também as reagendadas, por área e por local de realização, permitindo, com transparência, que as instituições e os demais interessados pudessem acompanhar e verificar o cumprimento dos princípios legais pertinentes, especialmente aquele que determina, como já apontado, a observância da ordem cronológica de entrada dos processos e o atendimento ao prazo para nomeação das comissões de avaliação.
Curiosamente, embora seja uma autarquia, em suas próprias palavras, criada com a missão de “promover estudos, pesquisas e avaliações sobre o Sistema Educacional Brasileiro com o objetivo de subsidiar a formulação e implementação das políticas públicas para a área educacional a partir de parâmetros de qualidade e equidade, bem como produzir informações claras e confiáveis aos gestores, pesquisadores, educadores e público em geral” (http://portal.inep.gov.br/conheca-o-inep), o INEP parece não ser capaz, ou não desejar, tornar públicas informações claras e precisas sobre o desempenho das atividades de avaliação in loco das instituições de ensino superior e dos cursos de graduação no âmbito do sistema federal de ensino.
A disponibilização dessas informações permitiria, de forma absolutamente transparente, verificar o efetivo atendimento ao comando normativo que determina a observância à ordem cronológica de entrada dos processos e ao prazo para nomeação das comissões.
Talvez, justamente por isso, não haja interesse em sua disponibilização....
Todavia, é certo que as instituições de ensino que se consideram preteridas no processo de designação e, sobretudo, de redesignação de comissões de avaliação, possuem ferramentas que lhes possibilitam o efetivo conhecimento acerca das designações realizadas para avaliações institucionais e de cursos em seu município, exatamente para que possam aferir o pleno atendimento ao comando normativo contido no § 7º do artigo 1º da Portaria Normativa n° 40/2007, republicada em 2010.
Com efeito, encontra-se em pleno vigor a Lei n° 12.527/2011, que assegura aos interessados o acesso às informações de interesse público, sendo certo que é obrigação dos órgãos e entidades do poder público garantir a gestão transparente da informação, nos termos do artigo 6º da mencionada lei, assegurando o acesso à informação como contido, ainda, em seu artigo 7º:
“Art. 7o O acesso à informação de que trata esta Lei compreende, entre outros, os direitos de obter:
I - orientação sobre os procedimentos para a consecução de acesso, bem como sobre o local onde poderá ser encontrada ou obtida a informação almejada;
II - informação contida em registros ou documentos, produzidos ou acumulados por seus órgãos ou entidades, recolhidos ou não a arquivos públicos;
III - informação produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada decorrente de qualquer vínculo com seus órgãos ou entidades, mesmo que esse vínculo já tenha cessado;
IV - informação primária, íntegra, autêntica e atualizada;
V - informação sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua política, organização e serviços;
VI - informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos; e
VII - informação relativa:
a) à implementação, acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas, bem como metas e indicadores propostos;
b) ao resultado de inspeções, auditorias, prestações e tomadas de contas realizadas pelos órgãos de controle interno e externo, incluindo prestações de contas relativas a exercícios anteriores.
§ 1o O acesso à informação previsto no caput não compreende as informações referentes a projetos de pesquisa e desenvolvimento científicos ou tecnológicos cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
§ 2o Quando não for autorizado acesso integral à informação por ser ela parcialmente sigilosa, é assegurado o acesso à parte não sigilosa por meio de certidão, extrato ou cópia com ocultação da parte sob sigilo.
§ 3o O direito de acesso aos documentos ou às informações neles contidas utilizados como fundamento da tomada de decisão e do ato administrativo será assegurado com a edição do ato decisório respectivo.
§ 4o A negativa de acesso às informações objeto de pedido formulado aos órgãos e entidades referidas no art. 1o, quando não fundamentada, sujeitará o responsável a medidas disciplinares, nos termos do art. 32 desta Lei.
§ 5o Informado do extravio da informação solicitada, poderá o interessado requerer à autoridade competente a imediata abertura de sindicância para apurar o desaparecimento da respectiva documentação.
§ 6o Verificada a hipótese prevista no § 5o deste artigo, o responsável pela guarda da informação extraviada deverá, no prazo de 10 (dez) dias, justificar o fato e indicar testemunhas que comprovem sua alegação.“
Assim, caso qualquer instituição perceba ser possível o desatendimento à ordem cronológica dos processos para fins de designação ou redesignação das comissões de avaliação in loco, poderá, nos termos do artigo 10 da Lei n°12.527/2011, solicitar ao INEP as informações pertinentes:
“Art. 10. Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1o desta Lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida.
§ 1o Para o acesso a informações de interesse público, a identificação do requerente não pode conter exigências que inviabilizem a solicitação.
§ 2o Os órgãos e entidades do poder público devem viabilizar alternativa de encaminhamento de pedidos de acesso por meio de seus sítios oficiais na internet.
§ 3o São vedadas quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação de informações de interesse público.”
Recebido o pedido de acesso à informação, caberá ao INEP, portanto, proceder na forma prevista no artigo 11 da norma legal em comento:
“Art. 11. O órgão ou entidade pública deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação disponível.
§ 1o Não sendo possível conceder o acesso imediato, na forma disposta no caput, o órgão ou entidade que receber o pedido deverá, em prazo não superior a 20 (vinte) dias:
I - comunicar a data, local e modo para se realizar a consulta, efetuar a reprodução ou obter a certidão;
II - indicar as razões de fato ou de direito da recusa, total ou parcial, do acesso pretendido; ou
III - comunicar que não possui a informação, indicar, se for do seu conhecimento, o órgão ou a entidade que a detém, ou, ainda, remeter o requerimento a esse órgão ou entidade, cientificando o interessado da remessa de seu pedido de informação.
§ 2o O prazo referido no § 1o poderá ser prorrogado por mais 10 (dez) dias, mediante justificativa expressa, da qual será cientificado o requerente.
§ 3o Sem prejuízo da segurança e da proteção das informações e do cumprimento da legislação aplicável, o órgão ou entidade poderá oferecer meios para que o próprio requerente possa pesquisar a informação de que necessitar.
§ 4o Quando não for autorizado o acesso por se tratar de informação total ou parcialmente sigilosa, o requerente deverá ser informado sobre a possibilidade de recurso, prazos e condições para sua interposição, devendo, ainda, ser-lhe indicada a autoridade competente para sua apreciação.
§ 5o A informação armazenada em formato digital será fornecida nesse formato, caso haja anuência do requerente.
§ 6o Caso a informação solicitada esteja disponível ao público em formato impresso, eletrônico ou em qualquer outro meio de acesso universal, serão informados ao requerente, por escrito, o lugar e a forma pela qual se poderá consultar, obter ou reproduzir a referida informação, procedimento esse que desonerará o órgão ou entidade pública da obrigação de seu fornecimento direto, salvo se o requerente declarar não dispor de meios para realizar por si mesmo tais procedimentos.”
Perfeitamente legítimo, portanto, que as instituições solicitem ao INEP informações sobre as avaliações realizadas, por exemplo, durante o período que seus processos estejam parados aguardando nomeação de comissões de avaliação, para saber se houve designação de outras comissões para o mesmo local e cursos semelhantes, relativamente a processos mais recentes que os seus, de modo a verificar o cumprimento das normas em vigor e o respeito à ordem cronológica no andamento dos feitos.
Entendo que, a partir dessas considerações, as instituições estão em plenas condições de evitar que seus processos fiquem adormecidos durante a fase de avaliação, esquecidos em algum canto à espera da boa vontade do INEP, pois, conhecendo a necessidade de observância da ordem cronológica e o prazo legalmente estabelecido para designação ou redesignação de comissão de avaliação, bem como os meios legais para saber se estão sendo indevidamente preteridos para que outras avaliações sejam realizadas, podem, perfeitamente, sair da inércia e passar à ação, exigindo, perante as autoridades competentes, o respeito ao ordenamento jurídico vigente.
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