Baixada há um mês com o objetivo de acabar com a oferta indiscriminada de crédito estudantil, reduzir os custos operacionais e diminuir as taxas de inadimplência, a Medida Provisória (MP) 785, que impõe novas regras para o funcionamento do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) a partir de 2018, já recebeu 278 propostas de emendas. Desse total, 42 foram apresentadas por parlamentares vinculados a entidades como a Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup) e Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES).
Isso dá a medida da resistência ao fim da farra que, durante os 13 anos e meio do lulopetismo, possibilitou vultosos negócios no âmbito do ensino superior privado, levando ao surgimento de grandes conglomerados educacionais financiados por fundos estrangeiros e com ações cotadas em bolsas de valores. Essas corporações reclamam, entre outras coisas, das medidas que aumentam sua responsabilidade nos casos de inadimplência, reduzindo as obrigações do governo federal.
Atualmente, as universidades privadas destinam 6,5% do valor das mensalidades para um fundo responsável por cobrir a inadimplência do Fies. Pelas novas regras do programa, esse patamar ficará entre 13% e 20%. Num total de 2,6 milhões de contratos ativos, a taxa de inadimplência dos estudantes financiados pelo Fies, por atrasos acima de 310 dias, era de 16,4%, no início de 2017. Segundo os técnicos do Tesouro Nacional, ela poderá crescer nos próximos meses, uma vez que uma parcela relevante dos contratos de financiamento estudantil não atingiu a fase de amortização, pois os alunos ainda não concluíram o curso.
Com as novas regras do Fies, as autoridades econômicas querem fechar um buraco negro nas finanças públicas. Só em 2017, o custo fiscal desse programa está estimado pelas autoridades econômicas em R$ 30,2 bilhões – o equivalente a 0,5% do PIB. “Enquanto mais de 1 milhão de novas matrículas (não financiadas) foram realizadas na rede privada entre 2009 e 2015, o Fies concedeu, no mesmo período, mais que o dobro de novos financiamentos, alcançando 2,2 milhões de estudantes. Assim, boa parte desses contratos foi celebrada com estudantes que já cursavam o ensino superior”, diz a Nota Técnica preparada para análise do tema pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara, o que revela como as universidades privadas usaram o Fies para transferir seus riscos para a União.
Os conglomerados educacionais reclamam, também, da obrigação de pagar uma tarifa de 2% sobre as mensalidades financiadas, que é a remuneração aos agentes financeiros responsáveis pelas operações de crédito. Só com essa medida, o novo Fies economizará aos cofres públicos R$ 300 milhões por ano. Isso significa que, em dez anos, o Tesouro estará poupando de R$ 6 bilhões a R$ 7 bilhões, que poderão ser revertidos para a educação pública, e não para multiplicar os lucros dos empresários do setor educacional privado.
O reajuste das mensalidades é uma das alterações que as universidades particulares querem promover na MP 785. Pela proposta do governo, as instituições têm de definir a previsão do reajuste na assinatura dos contratos de financiamento. Para elas, essa regra as impedirá de repassar para as mensalidades não só as taxas de inflação, mas, também, os eventuais investimentos que fizerem. Outra emenda patrocinada pelas instituições prevê o uso do FGTS para pagamento do financiamento estudantil.
Definidas em meio a um controle mais severo das finanças públicas, as regras impostas pela MP 785 ao Fies consolidam modelo mais restritivo e responsável na concessão de crédito estudantil. Acostumadas a registrar lucros milionários e a atuar sem riscos na época do antigo Fies, era natural que as universidades resistissem a essa mudança. Elas não perceberam que, com o fim do capitalismo de compadrio do lulopetismo, seus lucros, a partir de agora, terão de vir da qualidade de seus sistemas de gestão, e não de benesses do poder público.