Enquanto as universidades federais têm sido alvo de críticas, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, indicou em encontro com representantes do ensino superior particular que o setor é a prioridade para o governo Jair Bolsonaro (PSL) na busca pela expansão de vagas.
Weintraub disse que o governo pretende relaxar as regras de regulação de cursos e instituições, mas não detalhou outras ações planejadas pelo governo nesse sentido. A fala do ministro vai ao encontro da agenda do setor privado, defensor da simplificação de regulação.
Abraham Weintraub falou nesta quinta-feira (6) na abertura do 12º Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular, que ocorre em Belo Horizonte desta quinta até sábado (8). O evento é organizado pelo Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior e reúne mais de 500 participantes, entre proprietários de instituições e grupos educacionais, investidores, pesquisadores e professores.
O ministro disse, já no início de sua fala, que fez questão de aceitar o convite pela "mensagem inequívoca" de sua presença. "Fiz questão de estar aqui. É muito importante pela mensagem. A minha presença, não do Abraham, mas do ministro da Educação do governo eleito democraticamente pela maioria dos brasileiros, de Jair Bolsonaro, tem de ser uma mensagem inequívoca", disse. Em outras edições, o Congresso recebeu representantes do MEC.
Como já havia feito em outras oportunidades, Weintraub ressaltou que a maioria das matrículas do ensino superior está no setor privado.
"Existe espaço para as federais, existe espaço para estaduais, mas olhando a perspectiva para o Brasil, o crescimento que vai acontecer, é muito claro que não há condições com o atual estado de contas do setor público, o estado, a sociedade, os pagadores de impostos, a atual estrutura educacional estatal, atender a demanda das mudanças que vão acontecer neste país", disse.
O governo Bolsonaro e aliados mantêm o discurso de que as universidades públicas são dominadas por militantes de esquerda. Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo em abril, Weintraub disse que três universidades federais teriam cortes de 30% do orçamento por promoverem o que ele chamou de balbúrdia e por não terem foco na qualidade.
Além de os indicadores da UnB, UFBA e UFF, as instituições citadas, mostrarem boa produção acadêmica, a ideia foi considerada inconstitucional por especialistas ouvidos pela Folha e causou uma crise com dirigentes das federais.
Após má repercussão, o MEC disse que o corte seria de 30% (dos recursos discricionários, que não contam salários) para todas as universidades federais. Weintraub também já disse que as universidades agem como torres de marfim e, nas redes sociais, ironizou reitores ao falar sobre tolerância e pluralidade.
O bloqueio nas federais, que atinge R$ 2 bilhões, compõe um contingenciamento total de R$ 5,8 bilhões no MEC neste ano. Os congelamentos atingem recursos que vão da educação infantil à pós-graduação.
Outro corte, de R$ 1,6 bilhão, foi revertido pelo governo após protestos serem registrados em todo país em maio. O governo tem insistido que os cortes podem ser cancelados caso a economia melhore.
Na palestra, Weintraub não citou as instituições públicas ou os bloqueios vigentes. Ressaltou que acredita que a economia do país voltará a crescer e que setores como o educacional terão grande demanda.
"O estado brasileiro, através dos impostos que já são pesados, não tem condição de atender a demanda gigantesca nos próximos anos", disse. "A mensagem, além da perspectiva econômica, é a profissão de fé do que nós acreditamos nesse governo: claramente um viés liberal da economia, e conservador nos costumes. [Se há] duas pessoas honestas tendo uma relação econômica, seja ela qual for, de livre arbítrio, por que alguém tem que interferir? Qual razão de se ficar criando um monte de regras entre uma pessoa que quer estudar e uma grupo de pessoas que quer ensinar na iniciativa privada?"
Hoje, o governo lidera, baseado em lei específica, um complexo sistema de avaliação de qualidade, supervisão e autorização do funcionamento de cursos superiores no país. Para funcionarem, os cursos de graduação no país passam por avaliações de qualidade, como o Enade (avaliação federal feita por alunos), e análise da oferta escolar, como infraestrutura.
Essas informações são a base para o credenciamento e a renovação de credenciamento de cursos e também das instituições de ensino. Um baixo desempenho pode resultar até mesmo no fechamento do curso ou impedir sua participação no Fies (Financiamento Estudantil).
De 2.066 faculdades, universidades e centros universitários com indicador de qualidade divulgado em dezembro ano passado (o chamado IGC, Índice Geral de Cursos), apenas 35 tiveram nota máxima (1,6%). Levando em conta, por exemplo, cursos de formação de professores a distância, esse índice é de 0,5%.
Os indicadores federais de cursos e instituições, e também dos alunos, são classificados em uma escala de 1 a 5. A maioria das instituições e cursos tem ficado no nível intermediário da avaliação, que é 3.
Há denúncias de fraudes no sistema por parte de algumas instituições de ensino pelo menos desde 2016. Weintraub disse que casos de má fé, que são minoria, devem ser tratados pela Justiça.
"Eu acredito que a grande maioria dos brasileiros é de pessoas de boa fé. E a gente quer dar liberdade para vocês buscarem felicidade", diz. "Nós não temos preconceitos. Nós queremos que a sociedade possa buscar sua felicidade. E isso só é possível com um setor de ensino superior fortemente baseado na iniciativa privada, fortemente livre para se desenvolver e atingir suas metas. Essa é a mensagem."
Celso Niskier,diretor presidente da ABMES (Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior), ressaltou em seu discurso de abertura que o setor é responsável pela inclusão de estudantes de baixa renda, mas que também tem potencial para inovação. "Quero defender a educação superior particular como instrumento para a libertação das amarras que prendem o desenvolvimento do país", disse.
Atualmente, 18% dos jovesn de 18 a 24 anos estão no ensino superior. A meta do PNE (Plano Nacional de Educação) é chegar a 33% em 2024. O ministro evitou falar com a imprensa ao fim da palestra. Em rápida entrevista, disse que não há riscos para a realização do Enem, agendado para novembro.
O Inep, órgão do MEC responsável pelo exame, passou por mudanças na presidência. A diretoria que cuida do Enem está sem diretor, depois da exoneração de Francisco Vieira Garonce, envolvido em uma falha de segurança no exame voltado para jovens e adultos.