O MEC (Ministério da Educação) estuda alternativas para flexibilizar a regulamentação das instituições privadas de ensino superior. Há cerca de um mês, ele criou uma proposta de decreto abrandando um leque de regras como exigir apenas uma análise documental, sem avaliação da qualidade dos cursos, para processos de credenciamento de novas instituições.
No entanto, esse projeto demandaria grandes mudanças regulatórias, o que fez o MEC colocá-lo em banho-maria. O documento chegou a circular entre representantes de grandes companhias do setor, segundo uma fonte. Logo após esse recuo, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, passou a oferecer, em diversas declarações públicas, a possibilidade de universidades particulares formalizarem uma iniciativa de autorregulação.
Rapidamente, as entidades que representam as instituições privadas abraçaram a ideia e já iniciaram grupos de trabalho para apresentar propostas ao MEC. Um dos pilares é a criação de agências independentes de “acreditação”, entidades autônomas já utilizadas nos Estados Unidos e na Europa. Porém, nessas regiões, tais agências são responsáveis apenas por questões envolvendo a qualidade do ensino, e não sobre a regulação, papel que continua sob responsabilidade do Estado.
Em discursos, Weintraub tem sinalizado carta branca para que todas as etapas regulatórias sejam realizadas sem ação estatal. O Semesp, sindicato do setor, defende que essas agências de acreditação tenham poder sobre temas referentes à qualidade dos cursos e também à regulação.
“O MEC fez um chamamento e nós vamos atender. Estamos analisando como isso pode ser feito, vamos procurar especialistas porque é algo novo no Brasil”, afirmou Hermes Figueiredo, presidente do Semesp.
“Vamos ver com o MEC o que podemos incluir na autorregulação: se apenas os indicadores de qualidade ou se será possível estender para as normas de regulação”, disse Sólon Caldas, diretor-executivo da ABMES, Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior. Ambos citam que os processos regulatórios são muito burocráticos, cujos prazos de credenciamento levam anos.
No entanto, segundo fontes, há certo ceticismo sobre a flexibilização no ensino superior tão alardeada pelo ministro. Isso porque passar o bastão para as agências de acreditação demandaria uma mudança brusca na legislação e esvaziaria a Seres, secretaria responsável pela regulamentação de ensino superior do MEC.
O presidente do Semesp admite que o MEC perderia poder ao passar a responsabilidade para as agências acreditadoras, mas que essas seriam obrigadas a prestar contas ao MEC. “O ministro possui um discurso para o público externo que não é retransmitido aos servidores da pasta”, observou uma fonte. Entre técnicos do MEC, há incerteza sobre qual a real proposta de Weintraub em razão dos dois movimentos em direção a uma política de desregulamentação.
Segundo o consultor Maurício Garcia há diversas empresas de acreditação nos EUA, mas elas só emitem certificados sobre a qualificação dos cursos superiores. O selo de acreditação mais procurado é o Title Four, que possibilita às instituições concederem financiamento estudantil. “Os Estados americanos são responsáveis pela regulação e em alguns casos é até mais complicado que no Brasil. O Departamento de Educação, espécie de MEC dos EUA, é quem regula as agências”, explicou Garcia.
Segundo uma fonte, o desejo de replicar o modelo americano já vem desde a gestão de Ricardo Vélez Rodríguez, antecessor de Weintraub no comando do MEC. O diretor-executivo do Semesp pontua que a mudança é um projeto de longo prazo – dificilmente ocorreria numa gestão de governo. “Mas precisa haver um primeiro passo”, disse. Na visão de uma fonte, esse é um processo de no mínimo oito ou dez anos.
A proposta de decreto na qual o MEC vinha trabalhando previa que o CNE (Conselho Nacional de Educação) perderia algumas atribuições para agilizar o trâmite burocrático, principalmente na abertura de cursos, cabendo a ele papel apenas recursivo.
No fim de 2017, o então ministro Mendonça Filho publicou o decreto 9.235, documento que abriu espaço para, entre outros desdobramentos, a expansão dos cursos a distância. Segundo uma fonte, a ideia inicial do MEC era aprofundar as desregulamentações criadas há três anos.