Quando o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) foi instituído, em 2004, os panoramas social, político e econômico eram bastante distintos dos que temos hoje. Ainda assim, o processo avaliativo da graduação segue calcado em princípios e metodologias do século 20, sem considerar as especificidades do século 21.
O Sinaes nasceu como política de Estado e foi essencial para a expansão da educação superior com qualidade. Cumpriu sua missão e possibilitou a criação de um banco de dados capaz de subsidiar novas políticas públicas de graduação. Contudo, está desatualizado.
A boa notícia é que, conforme sinalizado por representantes do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em bate-papo virtual da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), a reformulação do Sinaes está no radar do Ministério da Educação (MEC).
Para que seja justa e eficiente, essa revisão precisa acontecer nas mais distintas esferas e se caracterizar pela construção coletiva, com envolvimento do Estado e da sociedade. É preciso levar em consideração as novas tecnologias aplicadas à educação, mas, também, os cenários estabelecidos a partir da pandemia de covid-19, como o fortalecimento do ensino híbrido, e os novos marcos legais vigentes no país, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
O novo sistema precisa contemplar todas as modalidades avaliativas, mas destacar a autoavaliação institucional. É ela que integra todos os protagonistas do processo educacional, além de contar com a representação da sociedade na Comissão Própria de Avaliação (CPA).
É preciso que a instituição possa se avaliar e ser avaliada de acordo com a sua missão institucional. Uma instituição mais voltada para extensão deve possuir indicadores mais nessa linha. Já aquela focada em pesquisa precisa ser avaliada nessa outra perspectiva.
Também não há mais espaço para padronização de culturas, comportamentos e procedimentos. Tampouco para processos complexos e altamente burocráticos, como os que regulam a educação superior brasileira.
A revisão do Sinaes precisa considerar todos esses aspectos, com a garantia do rigor e da ética. Nos Estados Unidos, por exemplo, a avaliação é feita por órgãos acreditadores regionais compostos por membros da sociedade. Por que não avançar nessa linha por aqui também?
Uma nova avaliação precisa considerar os aspectos regionais inerentes à cada instituição, assim como o incentivo e a valorização da criatividade e da inovação nos processos acadêmicos. Isso, sim, é essencial para que os estudantes sejam preparados para ingressarem no mercado de trabalho do século 21.
Aliás, ampliar o comprometimento dos discentes com o resultado final do processo avaliativo é outra medida que se faz urgente. Sendo componente curricular obrigatório, o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), por exemplo, precisa ganhar relevância entre os estudantes. Para isso, precisa comprometer também os alunos com a avaliação.
Da forma como vem sendo aplicado, sem qualquer desdobramento em relação ao resultado para o aluno, nem a instituição e tampouco o egresso são efetivamente avaliados. Além disso, o Enade atual não avalia as competências socioemocionais, ou soft skills, tão valorizadas pelo mercado de trabalho.
Trata-se de um debate amplo que deve ser liderado pelos órgãos reguladores e abraçado com força por todos aqueles que acreditam no potencial de transformação social que só a educação de qualidade possui.
O artigo também foi publicado na edição desta terça-feira (02) do Estado de Minas. Confira íntegra aqui.