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Especialistas apontam falhas em projeto de residência pedagógica

28/09/2013 | Por: Terra | 3069
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Motivo de debate pela Comissão de Educação da Câmara de Deputados, o projeto de lei do Senado 284/2012, que altera a Lei nº 9.394/1996 para instituir a residência pedagógica para os professores da educação básica, têm provocado controvérsias entre especialistas. A deficiência na articulação entre escolas e universidades, a pesada carga horária e a falta de clareza no projeto de lei são apontados como pontos negativos.

O formato da proposta se assemelha à residência médica, em que os graduados em medicina trabalham em instituições de saúde orientados por médicos especialistas. O projeto do senador Blairo Maggi (PR-MT) adapta o PLS 227 proposto por Marco Maciel (DEM-PE) em 2007. A proposta do ex-vice-presidente da República criava a “residência educacional” e acabou arquivada sem ser votada. A reformulação de Maggi busca melhorar as condições da educação básica, através de “uma etapa ulterior de formação inicial para a docência na educação infantil e nos primeiros anos do ensino fundamental, na forma da ‘residência’, remunerada por meio de bolsas de estudos e com carga horária mínima de 800 horas”.

O projeto não prevê a residência como pré-requisito para a atuação na educação básica, para não impedir a atuação de docentes em exercício que não tiveram acesso a essa formação. Professores já formados poderiam realizar a residência para se atualizar profissionalmente.

Para o coordenador da comissão de estágios da faculdade de educação da Universidade de São Paulo (USP), professor Marcos Garcia Neira, o problema da proposta é a dificuldade de articulação com universidades: “Infelizmente as articulações se dão apenas no nível burocrático. A instituição assina uma documentação que valida as horas de estágio, sem acompanhamento. Essa etapa da formação dos graduandos precisa ser acompanhada por um professor da universidade”. Além disso, é necessário fazer uma seleção criteriosa das escolas que acolherão os residentes para garantir a qualidade, aponta Neira. Esse processo, porém, pode resultar em falta de vagas para residentes.

Bolsa pequena desestimularia alunos

A proposta de residência pedagógica pode trazer como efeito colateral a queda na procura pelo curso de pedagogia. É o que diz José Roberto Covac, consultor jurídico da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior. Se, por um lado, ele entende que a medida é positiva por buscar melhorar as condições de estudo do aluno, por outro, a operacionalidade pode ser um problema.

O valor da bolsa ainda não está determinado pelo PLS. Caso ela não seja bastante atrativa, ela pode desmotivar o aluno, que provavelmente teria que deixar eventuais empregos para cumprir a carga de 800 horas.

Professora defende formação continuada

Maria de Fátima Guerra é PhD em educação infantil e professora da Universidade de Brasília (UnB) e vê o projeto como um despropósito. Para ela, é muito mais interessante uma política de formação continuada, que libere o professor para realizar cursos de pós-graduação, do que “repousar” na residência pedagógica como solução. “A proposta de residência precisa acontecer ao longo do curso e nas disciplinas de estágio supervisionado”, acredita.

Neira entende que é necessário que o estágio seja concomitante aos estudos, e não após a formação. Desta forma, os alunos poderiam levar as questões do trabalho para a sala de aula. Para o professor da USP, esquecer a importância da prática cotidiana é uma perda.

Unifesp tem residência desde 2008

A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) realiza, desde 2008, um programa de residência pedagógica simultâneo ao andamento do curso. Coordenadora do Programa de Residência Pedagógica (PRP) da universidade entre 2007 e 2012, Celia Maria Benedicto Giglio afirma que o projeto é bem-sucedido. O PRP é um estágio curricular obrigatório no curso de pedagogia, acontecendo durante a graduação e buscando o contato dos residentes com os cenários profissionais. Segundo ela, o projeto ajuda os alunos a superar dificuldades no trabalho pedagógico.

Uma pesquisa realizada pela instituição aponta que a avaliação média dos alunos para o PRP foi - numa escala de zero a 10 - entre 7,3 e 8,0. “Foi possível verificar que os estudantes confirmam ter estabelecido relação entre os conteúdos acadêmicos, as práticas pedagógicas dos formadores das escolas (professores e gestores), e suas vivências como residente nas diferentes residências pedagógicas”, afirma Celia Maria.

As dificuldades de conciliar trabalho e residência, apontadas por Covac, podem ser percebidas dentro do curso da Unifesp. Dos participantes da pesquisa, 64,3% tem trabalho remunerado e outros 11,3% fazem estágio remunerado paralelamente com o curso de pedagogia. Para este grupo, as residências pedagógicas tiveram que ser realizadas durante as férias. A falta de tempo e os deslocamentos necessários para cumprir as atividades foram os principais problemas apontados pelos estudantes.

De acordo com Celia Maria, a boa aceitação do PRP se deve ao acompanhamento da residência por parte das instituições formadoras, o que pode não ocorrer no projeto de lei do Senado. A professora aponta ainda que o PLS não é claro quanto à obrigatoriedade da residência, já que, apesar de não prevê-la como pré-requisito, sugere um acréscimo no tempo na formação inicial. Para ela, o projeto também peca por se restringir à formação inicial de professores para a educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, e por não apresentar os custos dessa formação para o Estado.

Secretário de assuntos educacionais da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo vê no projeto apenas uma medida paliativa. Segundo ele, o Ministério da Educação vem buscando equiparar a formação do professor à do médico, sem que, no entanto, se corrija a defasagem salarial. “Essa política deve ser acompanhada da melhora nas condições do trabalho. É preciso fazer uma reforma ampla, que envolva as entidades da categoria e as universidades, definindo metas a serem alcançadas”.


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