“As massas humanas mais perigosas são aquelas em cujas veias foi injetado o veneno do medo. Do medo da mudança.” (Octavio Paz)O novo sempre teve duas faces: de um lado seus entusiastas e do outro seus detratores. Foi assim em 1874 com a quase desconhecida Revolta dos Quebra-quilos, deflagrada na Paraíba, que se opunha à introdução dos novos padrões de pesos e medidas do sistema métrico internacional. Para a gente simples do nordeste rural, o metro e o quilo, tornados válidos por decreto imperial em 1872, eram representações do demônio, com as quais comerciantes e poderosos enganavam o povo. Os revoltosos partiam para os povoados e se apoderavam das "balanças", quebrando-as e lançando-as no rio. Não foi diferente com a Revolta da Vacina, dessa vez apoiada pela imprensa e por ninguém menos do que o então senador Rui Barbosa (que anos mais tarde reconheceu o valor das ideias de Oswaldo Cruz). Entre os dias 10 e 18 de novembro de 1904, na cidade do Rio de Janeiro o cenário era desolador: bondes tombados, trilhos arrancados, calçamentos destruídos, tudo feito por uma massa de três mil revoltosos. A causa foi a lei que tornava obrigatória a vacina contra a varíola. Esses são dois tênues exemplos do que o medo do novo pode assustar. Mas, nos séculos XX e XIX, o tempo era mais lento e as notícias demoravam a atravessar fronteiras. O mundo está diminuindo, porque não há distância espacial que a Internet não consiga encurtar, não só aproximando pessoas que dela se utilizam para manter contatos entre si, mas também modificando mercados e alterando as relações de trabalho. O que, no mínimo, gera temores quanto à empregabilidade. Um estudo da consultoria McKinsey indica, no entanto, que a automação não vai extinguir os empregos como se pensa, apesar de que mudará a vida de mais da metade dos trabalhadores em todo o mundo. O medo de que o desemprego se espalhe por todo o planeta é real, o temor de que as máquinas tomem o lugar dos homens não é novo: no século XIX, luditas[1] destruíram fábricas que substituíam trabalhadores braçais por máquinas a vapor. No entanto, na história das "revoluções produtivas", o desemprego é momentâneo. A introdução da máquina no campo substituiu o homem, que migrou para a cidade à procura de novos empregos. Quando na cidade a máquina tomou-lhe o lugar nas fábricas, o homem foi para a área de serviços. O uso de automação para melhorar a produtividade das empresas é já uma realidade, mas, segundo a McKinsey, cerca de metade das atividades hoje realizadas por humanos será automatizada até 2055. Isso equivale a 16 trilhões de dólares em salários. Os efeitos da automação não estarão só no chão de fábrica, pois, de acordo com a consultoria, até os CEOs terão seu trabalho afetado, por exemplo, na análise de relatórios e dados para tomar decisões que podem passar a ser feitas por algoritmos. Especialistas estão preocupados com o fato de que os avanços na inteligência artificial e na automação poderiam resultar em muitas pessoas perdendo seus empregos para robôs. A relação entre homens e máquinas, no entanto, segundo previsão da McKinsey, não será de conflito porque existirá uma alteração nas profissões em vez de uma extinção generalizada dos empregos. Acredito que aqui está uma ótima oportunidade para os sistemas educacionais refletirem e se anteciparem ao futuro: é necessário mudar para que a os jovens ganhem competências nas áreas que vão gerar emprego no futuro. É necessário um aprendizado prático que desenvolva no aluno a capacidade de pensar e achar soluções aos desafios propostos, que incentive o trabalho em grupo, a cooperação, o planejamento, a pesquisa, a tomada de decisões, a definição de ações, que promova o diálogo e o respeito a diferentes opiniões. Stephen Hawking, Bill Gates e Elon Musk têm algo em comum (além de riqueza e inteligência): eles estão todos aterrorizados com uma possível “revolução das máquinas”. Também conhecido como apocalipse da inteligência artificial, esse cenário hipotético tem sido campo fértil para presságios, profecias e vaticínios, que, muitas vezes, não passam de opinião de intrometidos ou ignorantes no assunto. São os palpiteiros do futuro que atemorizam aqueles que já começam a ver robôs andando pelas ruas puxando pessoas pelos cabelos e atazanando a humanidade além dos insanáveis problemas que ela já possui. Mas, ficção à parte, que tal estar diante de um robô de última geração que está começando a entender o nosso comportamento? É o que já vem ocorrendo com o Facebook, inegavelmente, a mais influente e poderosa plataforma de mídia social hoje e parte essencial da nossa rotina diuturna. Cada vez que usamos o Facebook, estamos interagindo, sem saber, com uma inteligência artificial (IA), um algoritmo, que será o grande oráculo do século XXI. Cientistas acabarão chegando às IAs superinteligentes, capazes de aprender novas habilidades e melhorar a si mesmas, algo que poderia ou melhorar as nossas vidas ou nos levar à extinção. A linha divisória parece ser delgadíssima. Aterrador é que muitos cientistas estão trabalhando com afinco para conquistar a fronteira final (?) entre humanos e robôs: a capacidade de sentir emoções e ter ideias talvez as únicas qualidades que nos diferencia das IAs. Ray Kurzweil, futurista, inventor e diretor de engenharia do Google, prevê que até 2030 “nanobots implantados em nossos cérebros nos farão semelhantes a Deus”. Robôs minúsculos dentro de nossas cabeças nos farão capazes de acessar e aprender qualquer informação em questão de minutos. Poderíamos ser capazes de arquivar os nossos pensamentos e memórias, e seria possível enviar e receber e-mails, fotos e vídeos diretamente em nossos cérebros. Ou seja, vão invadir nossos cérebros. Se usados corretamente, os nanobots podem fazer coisas incríveis, como o tratamento da epilepsia ou melhorar a nossa inteligência e memória. Liderados por Mark Riedl e Brent Harrison, da Faculdade de Computação Interativa no Instituto de Tecnologia da Geórgia, nos EUA, os investigadores estão tentando incutir a ética humana nas IAs através do uso de histórias. Isto pode parecer simplista, mas faz muito sentido. Na vida real, ensinamos valores humanos para as crianças pela leitura de histórias para elas. IAs são como crianças. Elas realmente não sabem diferenciar o certo do errado ou o bem do mal, até que sejam ensinadas. Como se vê, com ou sem alarmes apoteóticos, há sim muita imaginação e coisa não só para roteiristas e cineastas. Diante desse cenário, é importante que os governantes se aperceberem do papel fundamental dos sistemas educacionais, que, somente antenados com o futuro, serão capazes de criar estratégias consistentes para vencer os desafios do novo mundo de ocupações que vem por aí.
[1] Ludita: partidário do ludismo (não se leia lulismo...), movimento coletivo, iniciado por Ned Ludd, que se estendeu pela Inglaterra desde o início do século XIX e que era contrário à mecanização do trabalho e visava à destruição da máquina, responsabilizando-a pelo desemprego e pela miséria social nos meios de produção.