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Governo suspende criação de novos cursos de medicina. Quem perde: só as faculdades ou a sociedade?

15/04/2018 | Por: Gazeta do Povo | 4481
Gazeta do Povo/Pixabay

No último dia 5, o Ministério da Educação confirmou formalmente a suspensão da criação de novos cursos de medicina no Brasil, que já havia sido ventilada no final do ano passado. A medida foi bem recebida por entidades médicas, que nos últimos anos passaram a cobrar uma fiscalização maior dos novos cursos após o afrouxamento das regras ocasionado pelo Programa Mais Médicos. Por outro lado, grupos de ensino particulares se manifestaram contra o que consideraram um excesso do governo, que teria cedido às pressões dos profissionais da saúde.

“Infelizmente, o governo optou por atender a classe médica em detrimento da sociedade”, lamenta Sólon Caldas, diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), que representa entidades privadas. “O grande problema é que os conselhos extrapolam as suas atribuições. A atribuição do conselho é regular a profissão, mas em vez disso eles querem regular a parte acadêmica, regular o funcionamento dos cursos, algo que compete ao Ministério da Educação”, diz Caldas. “E isso que o setor da educação superior já é um dos mais regulados do país”.

Para o governo e as organizações que defendem a necessidade da moratória, a portaria vem como um “freio de arrumação”, um ajuste do sistema após a ampliação de vagas ocorrida desde 2013, com a menor regulamentação promovida pelo Mais Médicos. “O país efetivamente não tem infraestrutura para abrigar um crescimento tão rápido de escolas médicas no país”, garante Diogo Leite Sampaio, vice-presidente da Associação Médica Brasileira (AMB). “Tanto não tem essa capacidade que o governo, à época, promoveu um afrouxamento na avaliação de qualidade e de abertura, facilitando o credenciamento de hospitais de ensino e os editais de chamamento para as escolas médicas”.

Má distribuição

Hoje, graças a medidas que concorrem para ampliar os cursos de medicina existentes e facilitar a criação de novos, o Brasil ultrapassou as 31 mil vagas para estudantes na área. Quando se consideram os profissionais já atuantes no mercado de trabalho, os números do país seguem o mínimo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Em um país com população estimada em 207 milhões de habitantes, o Conselho Federal de Medicina (CFM) registra mais de 453 mil médicos em todo o território nacional. No geral, são cerca de 2,19 profissionais para cada mil brasileiros, enquanto a recomendação da OMS é que o número seja pelo menos um a cada mil. A meta do Mais Médicos era elevar o patamar para 2,7 até 2026.

Existe, no entanto, uma grande desigualdade na concentração de médicos ao redor do país. A região com os melhores números é a Sudeste, que conta com mais da metade dos profissionais: por lá, a média é de 2,90 médicos a cada mil habitantes, número superior ao de países como Canadá e Estados Unidos, que têm uma proporção de cerca de 2,5 profissionais por mil pessoas, de acordo com dados da OMS. Por outro lado, estados do Norte e do Nordeste sofrem com a escassez. O último colocado no Brasil inteiro é o Maranhão, com número abaixo até mesmo do padrão mínimo recomendado internacionalmente – cada mil maranhenses hoje têm à disposição uma média de 0,75 médico, quantidade inferior à de países como o Iraque (0,85). Dentro dos estados hoje marginalizados, também ocorre uma segunda concentração, com a maioria dos médicos radicados nas capitais.

“Desde que a lei do Mais Médicos entrou em vigor, de 2013 a 2018, voltou sarampo, a tuberculose piorou, a hanseníase piorou, a febre amarela reapareceu... O grande problema do país é a gestão. O que se passou nos últimos cinco anos foi a preocupação com número. Com a quantidade, não com a qualidade”, entende o médico. Os baixos salários e as más condições de trabalho, com a constante falta de medicamentos e equipamentos, são apontados como razões principais para que certas áreas nunca consigam superar seu déficit de profissionais.

Na visão de Sólon Caldas, da ABMES, a má distribuição independe da situação dos novos cursos. “Isso é muito mais um problema estrutural do que uma questão de ter muito ou pouco médico. O governo tem que repensar a política de condições para fixar o profissional num determinado local”, indica. “Agora, isso é um problema de política pública, que não vai ser resolvido estancando a oferta de mais cursos de medicina no país. Quem sabe se está faltando médico para atender a sociedade carente é a população e não o Conselho de Medicina”.

Próximos passos

A portaria do governo impede a abertura de editais para criação de novos cursos pelos próximos cinco anos, mas não interrompe o estabelecimento daqueles que já estavam em processo de instalação: os editais 06/2014, que previa a abertura de 2.305 vagas, e o edital 01/2017, com a autorização de pelo menos 155 vagas. A moratória também deixa aberta a possibilidade de abertura de novas vagas no período de cinco anos, desde que isso ocorra nos cursos já existentes.

“A premissa pétrea é a garantia de qualidade do médico formado nos cursos existentes no país”, interpreta José Pio Martins, reitor da Universidade Positivo, que já oferece a formação em medicina e vê com bons olhos a decisão do governo. “O MEC viu que esse aumento (causado pelo Mais Médicos) ajudou a amenizar a falta de médicos, mas também acendeu uma luz amarela na questão da qualidade. Logo, a proibição de aumentar cursos e vagas por cinco anos é uma espécie de ‘freio de arrumação’. Se daqui a três anos tudo estiver bem, nada impede que o governo revogue a proibição e autorize novos cursos”.

Para a ABMES, a portaria do MEC, como está, pode levar a uma defasagem de até duas décadas para que novas instituições se vejam habilitadas a colocar profissionais no mercado. “O último edital grande já foi há cinco anos. Vamos supor que o governo libere um novo daqui a cinco: já terão sido dez anos, e ainda tem que esperar outros quatro até concluir o processo de um novo edital e mais seis para um aluno de medicina se formar. Nós estamos falando de 20 anos sem ter novos médicos oriundos de novos cursos”, alerta Sólon Caldas.

“Isso é um retrocesso, está totalmente na contramão das necessidades do país. O governo atual optou por atender a classe média em detrimento da população brasileira, mas pode ser que após as eleições a situação seja revertida. A portaria pode ser revogada, e é isso que vamos pleitear”, promete Caldas.

O entendimento de Diogo Leite Sampaio, da Associação Médica Brasileira, é de que a suspensão de novos cursos e o grupo de trabalho criado pela portaria ajudarão a estabelecer padrões que garantam a qualidade dos cursos. Segundo ele, o objetivo no longo prazo é estabelecer critérios de avaliação não apenas das escolas médicas, mas também de seus egressos. “O aluno pode ter se formado em uma universidade muito boa e ser um péssimo médico. Há exames como o do Conselho Regional de Medicina de São Paulo, por exemplo, que mostram que a grande maioria dos médicos recém-formados não sabe identificar uma apendicite, não sabe ler uma mamografia, não sabem observar um diagnóstico no ultrassom. A população precisa ser protegida dos médicos que se formam mal”, defende o vice-presidente da AMB.

“O médico mal formado é muito pior para a saúde da população do que não ter médico em uma região. É melhor a pessoa ser encaminhada a outro posto de saúde do que receber um diagnóstico errado, um tratamento errado, que pode levar até mesmo a óbito daquele paciente”, afirma Sampaio.


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Legislação

PORTARIA MEC Nº 523, DE 01 DE JUNHO DE 2018

 Dispõe sobre as Instituições de Ensino Superior que ofertem cursos de Medicina autorizados no âmbito dos editais de chamamento público em tramitação ou concluídos, segundo o rito estabelecido no art. 3º da Lei nº 12.871, de 2013, ou ofertem cursos de Medicina pactuados no âmbito da política de expansão das universidades federais, poderão protocolizar pedidos de aumento de vagas destes cursos, uma única vez, por meio de ofício formal à Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior, que serão analisados de acordo com as regras estabelecidas nesta Portaria.


EDITAL MEC Nº 2, DE 15 DE MAIO DE 2018

Convalida os atos do Secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação, praticados no âmbito do Edital nº1, de 28 de março de 2018, que tornou pública a realização de chamamento público de mantenedoras de Instituições de Educação Superior - IES do Sistema Federal de Ensino, para seleção de propostas para autorização de funcionamento de curso de Medicina por IES privadas em municípios selecionados no âmbito do Edital nº2, de 7 de dezembro de 2017.


PORTARIA SERES Nº 328, DE 10 DE MAIO DE 2018

Suspender o prosseguimento da chamada pública regida pelo Edital Seres/MEC nº 1, de 5 de julho de 2017, no que tange a seleção de propostas para autorização de funcionamento de cursos de medicina nos municípios de Ijuí-RS, Tucuruí-PA e Limeira-SP.


PORTARIA MEC Nº 329, DE 05 DE ABRIL DE 2018

Dispõe sobre a autorização e o funcionamento de cursos de graduação em Medicina nos sistemas de ensino dos estados e do Distrito Federal.


EDITAL SERES Nº 1, DE 29 DE MARÇO DE 2018

Chamamento público de mantenedoras de Instituições de Educação Superior - IES do Sistema Federal de Ensino, para seleção de propostas para autorização de funcionamento de curso de Medicina por IES privadas em municípios selecionados no âmbito do Edital nº 2, de 7 de dezembro de 2017.


PORTARIA SERES Nº 152, DE 08 DE MARÇO DE 2018

Fica divulgada a relação de municípios selecionados no âmbito do Edital nº 2, de 7 de dezembro de 2017, de chamamento público para implantação e funcionamento de curso de graduação em Medicina por instituição de educação superior privada. 


EDITAL SERES Nº 2, DE 07 DE DEZEMBRO DE 2017

Torna pública a realização de chamamento público de municípios para autorização de funcionamento de cursos de graduação em medicina, conforme estabelecido neste Edital.


PORTARIA NORMATIVA Nº 14, DE 27 DE JULHO DE 2017

Altera o § 2º do art. 5º da Portaria Normativa MEC nº 12, de 6 de julho de 2017, que regulamenta o processo seletivo do Fundo de Financiamento Estudantil – Fies referente ao segundo semestre de 2017.


PORTARIA NORMATIVA Nº 7, DE 24 DE MARÇO DE 2017

Dispõe sobre os procedimentos de monitoramento para o funcionamento dos cursos de graduação em Medicina em instituições de educação superior privadas, no âmbito do Programa Mais Médicos.


PARECER Nº 787, DE 10 DE NOVEMBRO DE 2016

Consulta sobre transferência de alunos de cursos de Medicina de Instituições de Educação Superior estrangeiras para Instituições de Educação Superior brasileiras.


LEI Nº 12.871, DE 22 DE OUTUBRO DE 2013

Institui o Programa Mais Médicos, altera as Leis nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993, e nº 6.932, de 7 de julho de 1981, e dá outras providências. 
 


PORTARIA Nº 1.752, DE 26 DE OUTUBRO DE 2006

Institui Grupo de Trabalho para subsidiar as decisões nos processos de autorização de cursos de Direito.
DOU nº 207, Seção 2, 27/10/2006, p. 20/21


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