Das 210 mil vagas reservadas este ano para as modalidades do Financiamento Estudantil (Fies) que não são custeadas diretamente pelo governo e oferecem juros baixos, chamadas de P-Fies, 800 teriam sido preenchidas no primeiro semestre de 2018. A informação é de Sólon Caldas, assessor técnico do Fórum (Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior) e diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES).
Ele participa do Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular (Cbesp), na Ilha de Comandatuba (BA), evento que começou na quinta-feira (7) e continua até sábado (9). Procurado pelo Eu, Estudante, o Ministério da Educação (MEC) não negou nem confirmou a informação (confira abaixo posicionamento completo do órgão, enviado por e-mail). A pasta informou que "segue em contato com outros bancos a fim de atraí-los para o novo programa, aumentando a concorrência e melhorando a atratividade".
O baixo número de contratos fechados no P-Fies é atribuído, por Sólon, ao fato de o Fies ter passado por uma reestruturação geral muito recente, transformando-se no Novo Fies. "O programa foi totalmente redesenhado, as regras mudaram todas." Sólon explica que o P-Fies funciona como um financiamento privado, já que a taxa de juros e o critério de aceitação de candidatos são definidos pelas instituições financeiras. "É importante salientar que tem uma base muito grande de alunos que não pode pagar nem a mensalidade nem o financiamento privado, porque não passa nos critérios do banco", alerta.
"O governo precisa entender o financiamento estudantil como uma política social para poder atender essa parcela também. Ele atende já uma parcela com o ProUni (Programa Universidade para Todos), mas o ProUni é limitado, porque é troca de tributos. E o tributo tem limite de percentual", acrescenta. "Em 2014, tivemos 732 mil contratos no Fies e, agora, 35.800... Tem um gap muito grande. Tem uma camada muito grande que, se não tiver investimento do governo na política de financiamento, não terá acesso", critica.
O que impactará a busca por alcançar a meta 12 do Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelece que a taxa líquida de matrículas no ensino superior seja de 33% na população de 18 a 24 anos e que a taxa de matrículas geral suba para 50% até 2024. Relatório do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgado na quinta-feira (7) mostra que ainda estamos longe de alcançar esses patamares. "O P-Fies precisa ser melhor comunicado para os agentes financeiros, as instituições e a sociedade. A gente ouve falar muito do Fies 1, do juro zero, mas o P-Fies é que tem mais vagas para oferecer", afirma Sólon.
As etapas necessárias para fechar um contrato nessa modalidade requerem certo esforço das entidades envolvidas. "O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) tem de passar para uma instituição financeira, que precisa fazer um convênio com a instituição de ensino, que tem de encaminhar os dados do aluno para serem analisados”, explica. Sólon demonstra preocupação com o futuro do Fies a partir de 2019, quando o cenário mudará completamente, com a chegada de um novo presidente.
Impacto
Dentro do Fies 1, que é o totalmente custeado pelo governo, das 100 mil vagas reservadas para todo o ano de 2018, 35 mil foram ocupadas no primeiro semestre. No entanto, segundo o MEC, 80 mil vagas foram abertas até agora. Apesar de elogiar as mudanças que o ministro da Educação, Rossieli Soares, anunciou para o Fies 1 (entenda abaixo), Sólon Caldas admite que, mesmo se todas as oportunidades de financiamento fossem preenchidas, o impacto do Fies na ociosidade das vagas nas faculdades particulares não seria tão alto.
"O número de vagas disponibilizadas é muito pouco para atender a demanda. Mas dentro desse muito pouco, o impacto não deixa de ser relevante", diz. Sólon pondera, no entanto, que a ociosidade tem outras causas além das mudanças no Fies, entre elas a crise econômica e o aumento do desemprego, o que diminui a quantidade de pessoas que podem arcar com as mensalidades de uma faculdade particular. Saiba mais sobre isso em reportagem publicada sobre o assunto.
Entenda o caso
O Novo Fies instituiu três modalidades de financiamento. A primeira, custeada diretamente pelo governo, oferece 100 mil vagas em 2018, das quais 35 mil foram preenchidas no primeiro semestre. Neste modelo, chamado de Fies 1, o programa funciona como fundo garantidor com recursos da União e oferece crédito com juro zero (mas com correção inflacionária) para estudantes com renda familiar de até três salários mínimos. O universitário começa a pagar as parcelas respeitando a própria renda, já que o valor pago mensalmente pode ser de no máximo 10% de seus rendimentos.
Para esse modelo financiado diretamente pelo governo, o Ministério da Educação anunciou mudanças importantes em coletiva de imprensa na quarta-feira (6). A primeira é que todo contrato do Fies 1 financiará pelo menos 50% do valor do curso (acabando com situações em que, por exemplo, o estudante tinha apenas 8% do preço da mensalidade arcado pelo programa, que, assim, não se mostrava atrativo para o público que mais precisa). Outra novidade é que o teto semestral de financiamento voltou a ser de R$ 42 mil, como era até o segundo semestre de 2016, substituindo o teto de R$ 30 mil que vigorou desde o primeiro semestre de 2017.
As outras duas modalidades do Fies, o 2 e o 3, têm como fontes de recursos, respectivamente, fundos constitucionais regionais (Fies 2) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) junto à fundos regionais de desenvolvimento das regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste (Fies 3). Ou seja, a verba vem de instituições financeiras, mas com recursos públicos. Ambas oferecem crédito com juros baixos para estudantes com renda familiar per capita de até cinco salários mínimos. O Fies 2 e o Fies 3 juntos são chamados de P-Fies. Foram reservadas para esses sistemas 210 mil vagas este ano, das quais apenas 800 teriam sido preenchidas no primeiro semestre.
Confira posicionamento enviado pelo MEC por e-mail:
"Após uma avaliação conjunta entre instituições de ensino, alunos, instituições financeiras e gestores do programa, foram apontados pontos que precisariam de melhorias para o Novo Fies das próximas edições. Entre os aspectos apontados estão ajustes no modelo, garantia de melhor experiência para os alunos dentro do sistema de inscrição e aprimoramento da comunicação com o estudante.
Nesta semana, o Comitê Gestor do Fies aprovou proposta do Ministério da Educação para estabelecer um percentual mínimo de financiamento, de 50%. Tal medida deve beneficiar cerca de 25% dos estudantes inscritos que, em muitos casos, desistiam de firmar contrato após conseguirem um percentual abaixo disso. Outra medida aprovada pelo Comitê foi o aumento do teto de financiamento, de R$ 30 mil para R$ 42.983 por semestre. Com essas melhorias, o MEC entende que mais candidatos irão se beneficiar sem que afete a sustentabilidade do programa, pilar fundamental para sua continuidade.
Das 80 mil vagas ofertadas pelo Fies 1 no primeiro semestre, mais de 35 mil já foram preenchidas, sendo que ainda há mais de 16 mil estudantes que estão em processo de contratação. As vagas remanescentes seguem até 25 de junho. Destaca-se que as vagas que não forem preenchidas neste primeiro semestre serão novamente ofertadas para o segundo, já com as mudanças aprovadas pelo Comitê.
Sobre as modalidades 2 e 3, o papel do Ministério da Educação é o de verificar se as normas do programa estão sendo cumpridas, como a pontuação exigida no Enem e o limite de renda familiar per capita de até cinco salários mínimos. Cabe salientar que essas modalidades dependem de análise de crédito por parte dos agentes financeiros. O MEC segue em contato com outros bancos a fim de atraí-los para o novo programa, aumentando a concorrência e melhorando a atratividade.
O novo Fies é um modelo de financiamento estudantil moderno, que divide o programa em diferentes modalidades, possibilitando juros zero a quem mais precisa e uma escala de financiamentos que varia conforme a renda familiar do candidato. Além disso, traz melhorias significativas na gestão do novo Fundo Garantidor, dando sustentabilidade financeira ao programa a fim de viabilizar um acesso mais amplo ao ensino superior.
Caso o Fies se mantivesse como concebido e projetado, se tornaria insustentável, com o Tesouro Nacional e o governo federal sem condição de mantê-lo, o que provocaria o fim da política. Em auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), ficou claro o rombo fiscal no programa, “descalabro” na gestão do Fundo e dificuldades para que o programa banque os estudos de gerações futuras em instituições privadas de ensino superior."
Vagas remanescentes
Estão abertas até 26 de junho (em diferentes prazos dependendo do perfil do aluno) as inscrições para vagas remanescentes do Novo Fies. Inscreva-se no link.