O Ministério da Educação (MEC) liberou a oferta de pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) a distância no país.
A regulamentação, editada em abril pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) por meio de portaria, vem num momento em que o ensino remoto na graduação e na pós lato sensu passa por um boom, após desburocratização do setor em 2017.
A área cresceu 17,6% naquele ano, quando atingia 1,8 milhão de estudantes (último dado disponível).
Para João Mattar, diretor da Abed (Associação Brasileira de Ensino a Distância), um dos benefícios da regulamentação será a descentralização da oferta, hoje concentrada nos grandes centros urbanos.
“Os melhores cursos de mestrado e doutorado presenciais são no Sul e no Sudeste. Um aluno de outra região tem de se deslocar para morar nesses locais, às vezes deixando de trabalhar”, afirma.
Ainda segundo Mattar, ter mestres e doutores em lugares mais afastados dos grandes centros também deve contribuir com essas regiões e desenvolver a pesquisa local.
Para oferecer mestrados e doutorados na modalidade, as instituições interessadas deverão seguir alguns requisitos específicos.
Atividades relacionadas a laboratórios, por exemplo, devem ser realizadas de forma presencial, assim como seminários integrativos. Isso pode acontecer tanto na sede da instituição quanto em polos de ensino a distância espalhados pelo país.
Além disso, só poderão oferecer pós stricto sensu EaD instituições cuja nota no IGC (Índice Geral de Cursos) do MEC seja no mínimo 4. O IGC vai de 0 a 5.
Segundo Valder Steffen Júnior, reitor da UFU (Universidade Federal de Uberlândia) e membro da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil), os pré-requisitos da regulamentação devem ser suficientes para garantir o bom nível dos programas.
Ele fez parte da comissão da Capes que elaborou a regulamentação e diz que alguns colegas o questionavam, preocupados quanto à qualidade dos cursos que existirão, mas que os critérios da portaria aplacaram as dúvidas.
“Ainda assim é muito importante que os primeiros programas demonstrem capacidade real de formar recursos humanos de alto nível. Não pode ser uma formação de segunda linha”, afirma.
Para Celso Niskier, diretor-presidente da ABMES (Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior), uma das áreas que deve ter maior demanda por mestrados e doutorados a distância é a da pópria educação.
“Os professores da rede pública do país querem se qualificar em nível de mestrado, mas muitos, até por causa do trabalho, não podem se deslocar de suas cidades. Há uma demanda reprimida”, diz.
Ele afirma que hoje o setor privado responde por 18% dos mestrados e doutorados no Brasil, e calcula que esse número deve dobrar nos próximos dez anos.
Mas nem todo mundo enxerga como positiva a possibilidade de oferecer mestrados e doutorados a distância. Rodrigo Ricupero, presidente da Adusp (Associação dos docentes da USP), vê a medida com desconfiança.
Segundo ele, os cursos EaD se tornam de baixa qualidade porque não são dadas aos alunos as condições necessárias para compensar a falta de contato.
“A pessoa mora no interior e assiste a um curso pela internet. Isso é democratizar? Ela não vai ter nenhum elemento da vida em uma universidade. Aí, ela precisa de um livro, e não tem na biblioteca da cidade. Nem tudo está online”, afirma.
Ele também considera importantes para a formação do aluno as conversas olho no olho com o orientador e com colegas de classe, os grupos de estudo etc., coisas que apenas a presença física numa universidade permite.
“Há um conjunto de elementos que se perdem e teriam de ser compensados de alguma forma, o que exigiria um custo até maior que o dos programas presenciais”, afirma.
As instituições interessadas em oferecer pós-graduação stricto sensu remotas têm submetido suas propostas desde 1º de julho. Neste ano, as aplicações, que se encerram em 9 de agosto, são só para mestrado. Só poderão solicitar a oferta de doutorado os programas que, após a primeira avaliação do mestrado, obtenham ao menos 4 no IGC.
Segundo a Abed, a expectativa do mercado é que esses programas comecem a ser oferecidos no primeiro semestre de 2020.