O pai passa a semana trabalhando na China continental. A mãe e a avó se mudaram para Hong Kong. O apartamento foi escolhido a dedo, ao lado da escola internacional onde foi matriculado o filho único do casal. Ele tem apenas cinco anos, mas a vida desses três adultos gira em torno da educação da criança.
Esse esquema familiar é comum e começa cedo. Educação é investimento em vida próspera e status na sociedade chinesa. Além disso, filhos têm papel importante no nível de conforto da aposentadoria dos pais. Estudando no território autônomo chinês, além de se tornar bilíngue em inglês, ele terá mais chances de cursar as melhores universidades na China ou no exterior.
Alunos de Hong Kong, Macau e Taiwan não precisam passar pelo "gaokao", literalmente o "alto teste" em mandarim, o equivalente ao Enem na China. Desde 2012, mais de cem instituições chinesas de ensino superior aceitam candidatos de Hong Kong com base no desempenho no vestibular da ex-colônia britânica.
A tradição confucionista faz com que a educação continue sendo vista como um valor fundamental. O investimento em educação é amplamente percebido como um mecanismo eficaz de mobilidade social. Na China, quase todo mundo está tendo uma vida mais confortável que a geração passada. Os números da redução da pobreza nas últimas décadas são impressionantes. O "gaokao" é tido como um trampolim, uma chance de chegar ao topo, não importando de onde se veio.
A competição é brutal para entrar nas cerca de duas mil universidades públicas do país, e a pressão das famílias também. O "gaokao" de 2019 acontece nesta semana e tem dez milhões de inscritos, maior número da década. Pequim fez reformas esse ano, oficialmente, para melhorar a inclusão no sistema de exames universitários, considerado elitista, embora aberto para qualquer pessoa que tenha segundo grau completo.
O governo quer reduzir a quantidade de “imigrantes do gaokao”, alunos que tentam a prova em uma província diferente da que moram para terem mais chances. Estudantes das regiões mais pobres do país receberam uma cota para tentar equilibrar o acesso em uma nação de proporções continentais e com forte desigualdade social. Há um milhão a mais de inscritos que no ano passado. O motivo é a expansão de vagas em instituições de ensino superior.
A prova acontece sempre no início de junho, e cenas de alunos estudando e pais desesperados são comuns. Anedotas povoam a mídia estatal. O exame acontece desde 1952, mas ficou suspenso por 14 anos, durante a Revolução Cultural, quando muitos dos líderes chineses que governam hoje foram enviados para campos de trabalho, incluindo o presidente chinês, Xi Jinping.
Três matérias são obrigatórias: chinês, matemática e inglês. Os exames duram três dias, e os alunos também são avaliados em disciplinas opcionais, como história, geografia, biologia, física, química e ciências políticas. Sacrifício e disciplina são cultuados, mas lentamente a prova vem se adaptando para permitir diferentes combinações de disciplinas, além da divisão entre ciências e artes, e para pontuar a performance do aluno ao longo de todo o segundo grau.
No ano passado, uma notícia sobre uma “avaliação política”, que impediria o estudante que não estivesse de acordo com a visão do partido que controla o país de fazer o "gaokao", foi rapidamente desmentida pelo governo.