Educação Superior Comentada | A Necessidade de Uma Gestão Pública Federal Efetivamente Republicana

Ano 3 • Nº 31 • 9 de setembro de 2015

A Coluna Educação Superior Comentada desta semana analisa a necessidade de uma gestão pública federal efetivamente republicana

09/09/2015 | Por: Gustavo Fagundes | 2591

A NECESSIDADE DE UMA GESTÃO PÚBLICA FEDERAL EFETIVAMENTE REPUBLICANA

Há algum tempo, os gestores públicos, principalmente na esfera federal, afirmam, como repetindo um mantra, que adotam uma “postura republicana” no desempenho de suas atribuições e em suas relações com os administrados.

Tendo ouvido à exaustão a repetição dessa expressão, confesso que ela passou a soar como um discurso ensaiado, destinado a convencer o administrado de seu conteúdo, mas sem explicitar, claramente, o que significaria adotar uma “postura republicana”, o que seria “ser republicano”.

Em virtude disso, decidi descobrir, de fato, o que é “ser republicano”, até que encontrei um texto simples, claro e conciso, de autoria do Dr. Luiz Flávio Gomes, no qual consta a definição traçada pelo historiador José Murilo de Carvalho, que me permito transcrever abaixo:

 

“Ser republicano é crer na igualdade civil de todos, sem distinção de qualquer natureza.

É rejeitar hierarquias e privilégios.

É não perguntar: ‘Você sabe com quem está falando?’

É responder: ‘Quem você pensa que é?’

É crer na lei como garantia da liberdade.

É saber que o Estado não é uma extensão da família, um clube de amigos, um grupo de companheiros.

É repudiar práticas patrimonialistas, clientelistas, familistas, paternalistas, nepotistas, corporativistas.

É acreditar que o Estado não tem dinheiro, que ele apenas administra o dinheiro pago pelo contribuinte.

É saber que quem rouba dinheiro público é ladrão do dinheiro de todos.

É considerar que a administração eficiente e transparente do dinheiro público é dever do Estado e direito seu.

É não praticar nem solicitar jeitinhos, empenhos, pistolões, favores, proteções.”

Confesso que esta definição, apesar de simples e direta, nos permite entender, com precisão, o que significa “ser republicano”, a tal ponto que me estimula a dizer que é, ainda, compreender, respeitar e fazer valer os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, como lançados de forma absolutamente clara na Constituição Federal de 1988.

Buscando trazer a definição encontrada e seus aspectos essenciais para nosso campo de atuação, podemos, sem maiores esforços, perceber que uma condução republicana das atividades no campo da regulação, supervisão e avaliação da educação superior, deveria primar pelo respeito aos direitos e garantias fundamentais estabelecidos pelo artigo 5º da Constituição Federal, entre os quais podemos, em síntese muito apertada, destacar os seguintes:

- Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; e

- A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Além disso, o gestor público não pode deixar de pautar sua conduta pelos princípios essenciais lançados no artigo 37 da Carta Magna de 1988, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Inequivocamente, o atendimento a esses princípios passa, necessariamente, pela estrita observância, por exemplo, dos prazos estabelecidos pela Lei n° 9.784/1999, para a prática dos atos no âmbito dos processos administrativos, quais sejam:

- Prazo de cinco dias, prorrogável até o dobro, mediante comprovada justificação, para a prática dos atos ordinatórios, assim considerados aqueles destinados a promover o andamento do processo, sem implicar em sua decisão de mérito; e

- Prazo de trinta dias, prorrogável por igual período, mediante expressa motivação, para a prática de atos decisórios, assim entendidos aqueles que tenham como escopo a decisão de mérito do processo administrativo.

O efetivo cumprimento desses prazos, portanto, representa a adoção da “conduta republicana” que nossos gestores públicos tanto fazem questão de alardear, mas, infelizmente, não é isso que o administrado vê acontecer na realidade cotidiana.

Aliás, é exatamente o contrário!

A realidade dos processos regulatórios, por exemplo, nos mostra realidade diametralmente oposta ao que seria razoável e justo exigir, com a demora excessiva do andamento dos processos, com o retardamento injustificável da prática dos atos processuais e com o descaso aos mais basilares direitos do administrado.

É certo, contudo, que essa realidade tem, em grande parte, a colaboração do administrado para a sua concretização, à medida em que assiste, passivamente, ao descumprimento dos mais básicos princípios da atuação do gestor público, como acima apresentados, ainda que de forma sintética.

O administrado, portanto, também não vem adotando uma “conduta republicana”, pois é certo que esta passividade na imposição do respeito aos seus direitos e aos princípios constitucionais, o cidadão não está sendo republicano!

Sempre que trato deste tipo de assunto, recordo de duas frases que sempre encontro em obras que versam sobre a questão da cidadania efetiva e do tema constitucional, embora precise apresentar minhas escusas por não recordar seu exato teor ou sua autoria.

De qualquer forma, vou me permitir encerrar esta coluna apresentando aos leitores a minha versão das duas frases, sem garantir a literalidade do texto, mas certamente mantendo-me fiel à intenção dos autores.

São elas:

- O direito do cidadão não é algo que o poder público dá a ele, mas sim algo que dele não pode retirar.

- O cidadão que não está disposto a lutar por seu direito, talvez dele não seja digno.

Encerro, com essas duas colocações, esta coluna, concluindo que a adoção de uma “conduta republicana” pelos gestores públicos é, antes de qualquer coisa, o resultado de uma postura de efetiva cidadania de cada um dos administrados, que devem conhecer profundamente seus direitos e obrigações, e reivindicar firmemente aqueles, sem deixar de cumprir fielmente seus deveres.

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